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Linhas em jeito de diário. Inspiração. Homenagem a espíritos livres. Lugar de evocação. Registo do quotidiano, espaço de encontros. Refúgio de olhares. Espécie de tributo à escrita límpida, serena e franca de Marcello Duarte Mathias.
Esta também é para tomar nota. São tantas as situações que se a gente não escrever acaba por se esquecer.
Eu vou tomando nota. Dos de casa espero sempre mais. Não é só o The Times of India.
(Steven Governo/Global Imagens)
Meu caro António,
O essencial sobre aquilo que penso e o que aconteceu na Assembleia e em Belém depois de 4 de Outubro pp. resume-se a três textos publicados no Delito de Opinião, cujos conexões deixo para o caso de quereres ler (Talvez com mais umas 50 propostas, uns robalos e umas notas de rodapé, Não se aproveita nada e Omeletas).
Sei de onde vens, conheço o teu percurso, ainda não sei para onde irás. Não será por isso, evidentemente, que deixarás de ter o mesmo benefício que dei ao XIX Governo Constitucional. Mas, tirando isso, poderás contar com a franqueza de sempre na apreciação do muito bom, do bom, do assim-assim e do péssimo. Seja do que tu fizeres ou de que outros fizerem à tua sombra ou que queiram fazer à sombra do PS.
Tenho por natureza ser mais exigente com os meus do que com os outros, com os de casa do que com os de fora, com os da minha equipa do que com os das equipas dos outros, sendo por isso natural que de mim não virá solidariedade na asneira. Já o disse antes, reafirmo-o desde já. A apreciação será por isso mesmo implacável, com a lealdade e a distância de sempre, que a mim "o aparelho" nunca me toldou as ideias nem me limitou o discurso, tirando daquela vez em Braga quando a Maria de Belém me disse que estava a esgotar os meus três minutos.
Posso não concordar, e não concordo, desde já te digo, com uma ou outra escolha, mas são escolhas tuas e vejo em todos a vontade para fazer melhor e diferente. Que o façam com transparência (esta não é uma palavra vã, como sabes) e seriedade (os últimos seis anos deverão servir de exemplo e de medida para se avaliar a falta dela). Oxalá que também não lhes falte a competência, o arrojo, a visão, e a sorte, que nestas coisas também dá jeito, só que estando o mundo cheio de boas intenções e a situação do país tão difícil terei tantas expectativas, por outras razões, quanto ao vosso desempenho quanto a tua oposição parlamentar.
Sobre as condições que tens só tu te podes pronunciar, mas se disseste ao PR que estavas em posição de apresentar um governo forte, estável e com apoio parlamentar para te fazer, e a nós, portugueses, navegar durante toda a legislatura, só temos que confiar e estar atentos. Sabes bem que não te serão perdoadas quaisquer falhas, por mais insignificantes que sejam. A artilharia dos apeados e ressabiados, que não há só nos outros partidos, está toda a postos para desferir os primeiros golpes.
Ainda que estando longe não deixarei de estar atento. Tenho bem presente o que critiquei aos anteriores governos, que nestas coisas, felizmente, tenho boa memória. Não esperes, por isso mesmo, condescendência, tolerância ou silêncio quando tiver de colocar o dedo na ferida.
Posto isto, sabendo que serás, seremos, todos julgados pelo que for feito, pelo que ficar por fazer e pela forma como for feito, digo-te aquilo que o Professor Marcelo já disse: "é bom que corra bem este Governo, para que corra bem a Portugal". Bom trabalho.
(créditos: J.S. Goulão/LUSA)
Toda a gente compreende que nem todos me mereçam a mesma confiança e que me seja mais fácil simpatizar com A do que com B. Nada me obriga, por outro lado, a ser simpático com C. Não conheço o C de nenhum lado, o tipo é de uma região que eu não aprecio particularmente, tem um riso gozão, pertence a uma família política que não é a minha, conhece e dá-se com gente de quem eu não gosto, gente que não me faz salamaleques e que quando me fala parece que o faz por favor.
O problema é que o C é agora o meu interlocutor. Eu queria que o A fosse o escolhido, convidei-o a tomar o lugar, mas os outros tipos não o quiseram. Rejeitaram-no liminarmente e depois de me fazerem a folha querem que eu designe o C para o lugar, solução com a qual não concordo. Nunca concordarei.
Agora, das duas uma: ou eu faço de conta que sou eu quem manda nisto tudo, coisa que de facto não poderei fazer porque iria parecer mal e me iriam acusar de ter mau perder, ou, sem querer dar o braço a torcer, para depois não me fazerem acusações, faço de conta que estou a fazer tudo para o designar criando mil e um incidentes para evitar a solução que já dizem ser inevitável.
É certo que terei sempre uma parte da audiência comigo, e com os gritos da outra gentalha não me preocupo, aliás nunca me preocupei. O problema é com aqueles que eu pensava que estavam comigo e que já me começam a olhar de soslaio. O Marcelo, a Manuela e o Mendes até parece que alinham com eles, em vez de ficarem calados. Também nunca gostei deles.
A solução cínica pode ser a que me protege mais e me deixa ficar mais bem visto junto dos meus. No fim até poderei não ter alternativa. Daqui a uns dias ninguém na Europa irá perceber o atraso, nem as minhas dúvidas, e ficarão admirados com algumas das exigências que eu tenho vindo a formular. Mas estando de partida, com a reforma garantida, não tenho com que me preocupar. E até pode ser que depois me nomeiem para qualquer coisa internacional, com algum prestígio, para calar a boca dos que cá dentro falam contra mim.
Confesso que neste momento estou na dúvida sobre o que irei fazer. Os tipos estão a ficar exasperados, mas já que estou a ser sacaninha também já não tenho nada a perder.
Acho que vou fazer ao C mais meia dúzia de exigências. O tipo não vai poder dar resposta nos termos que eu quero e dessa forma continuo a deixá-los entalados. E sendo cínico nunca serei tão ostensivo que me acusem directamente do que ando a fazer. Bastar-me-á ir invocando o interesse nacional, os mercados, a estabilidade, ir falando de bananas, e a coisa ficará sempre na dúvida. Não me custa nada fazer de chaparro. Queimado já eu estou. Sempre podem vir dizer que ao A não exigi coisa alguma, mas a esses responderei que ele venceu as eleições. Não teve maioria, concedo, mas não foi por minha culpa. E os safados do C também podiam ter dado uma ajuda e teriam ficado asseguradas as condições que eu queria.
Aqueles tipos foram fazer exactamente o que eu não desejava e lhes disse para não fazerem. Foi de propósito. Mancomunaram-se com os comunistas, com os hippies e com aquela malta dos charros e do amor livre só para dizerem que tinham uma maioria na assembleia e me entalarem. Lixaram-me mas eu agora também vou lixá-los. Até posso vir a indigitá-lo, mas depois vou vetar-lhe os nomes e entalo-o de novo. O orçamento que se dane. A Constituição já era. Agora é que os gajos vão ver que quem manda sou eu. Vão ficar a conhecer-me. Faço-lhes a vida negra e se for preciso novo resgate poderei depois dizer ao povão que os tinha avisado e que a culpa foi deles. Estafermos. Nunca lhes perdoarei.