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Linhas em jeito de diário. Inspiração. Homenagem a espíritos livres. Lugar de evocação. Registo do quotidiano, espaço de encontros. Refúgio de olhares. Espécie de tributo à escrita límpida, serena e franca de Marcello Duarte Mathias.
Uma pessoa abre os jornais, ouve os noticiários da rádio e da televisão e não há dia que não seja bombardeada com estatística sobre os números de pessoas que entram e saem de Macau. Dir-se-ia que há uma contínua insistência na mesma tecla.
Há duas maneiras de olhar para a insistência; que por vezes também é resistência.
Se, por um lado, a insistência pode ser uma virtude, por outro também admite ser vista como um erro.
Ali, tem-se a tentativa de correcção, de aperfeiçoamento, de ultrapassem de obstáculos, criando soluções para os problemas, acrescentando valor ao esforço, procurando melhorar os resultados. No segundo caso, a insistência é a aposta permanente nas mesmas receitas que já se mostraram discutíveis, inadequadas, erradas, ultrapassadas e que em nada contribuem para uma melhoria dos padrões, um aumento de qualidade, uma progressão positiva.
A aposta no turismo de massas por parte das autoridades de Macau é cada vez mais um mau exemplo de gestão, de insistência no erro, de persistência no empobrecimento do sector, de aposta na mediocridade. Não é qualidade, é defeito.
Mas vamos aos exemplos para que melhor se perceba.
Em 19 de Maio pp., uma noticia do Ponto Final, com base num despacho da Agência LUSA, referia "o consumo médio de cada visitante caiu 13,2% no primeiro trimestre do ano, em comparação com o mesmo período do ano passado". A explicação, diz-se, estará no aumento do número de excursionistas que passaram de 54% para 59%.
O Chefe do Executivo, Sam Hou Fai, lê-se na mesma notícia, alertou para a circunstância de Macau ter cada mais "turistas", sublinhando que "o nível de consumo está a baixar". Já todos os residentes se aperceberam há muito tempo. Será isto normal numa cidade que reclama ser um "Centro Mundial de Turismo e Lazer", pergunta-se?
Este mês, a Direcção dos Serviços de Estatísticas e Censos assinalou uma descida do padrão de consumo dos visitantes. O PIB pela primeira vez diminuiu desde o final da pandemia, em 2022, e os benefícios do sector turístico caíram 3,8% neste mesmo primeiro trimestre de 2025. Repito a pergunta: Será isto normal?
Hoje, 22 de Maio, o Ponto Final e o Macau Daily Times assinalam que só em Abril houve um aumento do número de visitantes de 18,9%. Nos primeiros quatro meses significaram mais 12,9% do que no ano anterior.
A estes dados acrescentem-se mais dois.
As vendas a retalho caíram 15% nos primeiros quatro meses, com os gastos em actividades não-jogo a descerem 3,6%, prevendo os economistas um aumento das rendas habitacionais.
A satisfação estatística da DST e da TDM decorrente do contínuo fluxo de "turistas" não traz nada de positivo a Macau. São cada vez mais, gastam cada vez menos, e não é por serem mais que o volume final de receita cresce. Bem pelo contrário.
A segunda nota de registo vem, invariavelmente, da cambada dos táxis: "as irregularidades praticadas por taxistas registaram, nos primeiros quatro meses deste ano, uma subida a pique", o que corresponde a um aumento de 187% no número de infracções.
O aumento de infracções dos taxistas é pornográfica. E isto numa terra onde esse cancro da actividade económica e dos transportes está identificado. A carência de táxis, a má condução, a falta de oferta de veículos, ausência de educação e impreparação dos motoristas começa a ser lendária e internacionalmente conhecida.
Ainda há dias em Jacarta, por comparação, numa cidade cuja área metropolitana é de mais de 30 milhões de pessoas, pude utilizar os seus serviços de transportes urbanos, autocarros e táxis, de diversos operadores, incluindo Grab, Blue Bird, Silver Bird, sem qualquer problema ou o mais leve incidente, em percurso curtos e longos, de e para a cidade e dentro dela, sempre com taxímetro, sem dificuldades de chamada, com motoristas educados, simpáticos, prestáveis, falando inglês e sem tentativas de extorsão.
Aquilo que é cada vez mais uma evidência é que as políticas que há anos vêm sendo seguidas pelo Governo de Macau e o seus departamentos de turismo e transportes são um desastre. Não acrescentam valor, inflacionam os preços, congestionam as ruas e as estradas, aumentam o grau de poluição urbana e contribuem para a degradação da qualidade do ambiente para os residentes. Aos anteriores Chefes do Executivo muito se deve da lástima de serviços e miríade de problemas que o actual CE herdou.
Importaria por isso que a aposta hoje fosse não num aumento puro e simples, contínuo, desregrado e idiota do número de pessoas que entram e saem, sozinhas ou em excursão. É preciso fazer uma volta de 180 graus nas políticas até aqui vigentes nestas áreas. E apostar numa substancial melhoria dos padrões sociais, culturais, de riqueza e de consumo de quem nos visita.
E ao mesmo tempo acabar com os bandos que operam no sector dos transportes, impondo-lhes, se necessário com medidas de polícia, a obrigação de um serviço de táxis decente e competitivo. Aqui seria ainda preciso acabar com o preconceito e os oligopólios. Permitir a concorrência de empresas estrangeiras do sector, como se faz com os casinos, e acabarmos com o proteccionismo interno de cariz trumpista em que há décadas vivemos e que só serve aos mandarins locais. Se não for assim ainda voltaremos ao tempo dos riquexós.
(créditos: South China Morning Post/Getty Images)
Há pouco mais de dois meses, o deputado Ron Lam questionou o Governo na Assembleia Legislativa, através de uma interpelação escrita, sobre o verdadeiro custo do transporte de cadáveres em Macau, queixando-se do preço. O assunto foi abordado numa interpelação escrita e resultou de, nas últimas semanas, a empresa com o monopólio do transporte de cadáveres ter aumentado o preço do serviço de 1.500 patacas para 2.200 patacas.
Há muito que a população se queixa, também, do custo dos serviços de cremação. Não havendo um crematório em Macau, esse serviço só pode ser prestado em Zhuhai.
Todos sabemos que a existência de monopólios favorece as más práticas, pelo que se é absolutamente incompreensível que os residentes de Macau estejam sujeitos aos preços que são praticados pela única entidade que presta esse serviço.
No início deste mês de Agosto, o referido deputado quis agendar um debate na Assembleia Legislativa sobre a criação de um crematório permanente em Macau e a situação dos táxis. Ambos os debates foram rejeitados, escreveu o atento jornalista João Santos Filipe, em razão, explica-se, "da conjugação dos votos entre as associações tradicionais, deputados eleitos indirectamente e deputados nomeados". Isto é, os que não respondem democraticamente aos eleitores no sufrágio directo.
Em relação ao crematório por haver, disseram alguns, falta de soluções locais e devido ao aumento do número de mortos cujos familiares recorrem aos serviços de cremação.
Quer dizer, como há uns indígenas que entendem que não há solução, nem sequer se discute o problema e as possíveis alternativas que sejam mais benéficas para a população.
No que aos táxis diz respeito houve quem dissesse que a população não quer saber dos táxis e está preocupada é com a existência de mais passeios públicos, embora, como quem não quer a coisa, reconhecesse que a situação dos transportes não é boa.
Curiosamente, por estes dias tivemos conhecimento de que o Presidente Xi Jinping lançou uma campanha de limpeza da indústria funerária chinesa depois de serem conhecidos casos em todo o país implicando "graves violações da displina do Partido e da lei". Traduzido por miúdos isto significa a existência de um problema generalizado de corrupção.
Pois a mim quer-me parecer que tal como em relação aos junkets e aos negócios de alguns empresários bem relacionados com a classe política, e ultimamente também "educativa", de Macau, será necessário que Pequim dê ordens expressas ao futuro Chefe do Executivo para acelerar a integração e coordenação das políticas da RAEM em matéria de cremações, transporte de cadáveres e serviço de táxis com as seguidas no Interior do país.
Quanto aos táxis, ainda hoje, querendo proceder à reserva de um táxi para um transporte na próxima quinta-feira, fiquei a saber que está tudo "fully booked". Tanto faz ser à meia-noite, às duas ou às seis da manhã. Alguém acredita que isto não seja de propósito e que não haja falta de vontade política das elites locais para resolverem este problema? Ou o das cremações? Ou o das obras públicas de má qualidade?
O combate à corrupção e aos monopólios tem de ser levado a todos os cantos do país. Macau não é excepção. O Governo Central tem de ser capaz de mostrar à população de Macau que os seus representantes conseguem fazer mais e melhor do que o que se fez no passado sobre essa matéria.
É que, entretanto, já passaram quase 25 anos desde a transferência de Macau para a China e a única preocupação visível de integração é ao nível da segurança e dos negócios – como se fosse só isso que tornasse possível diversificar e "salvar" Macau. Importa que essa integração chegue ao quotidiano dos residentes de Macau e se traduza numa efectiva melhoria da sua qualidade de vida. O combate à corrupção tem de ser a todos os níveis, em especial nestas áreas em que a população mais sofre, não podendo poupar as elites locais.
Os residentes de Macau estão fartos de serem explorados pelos monopólios e pelas negociatas das suas elites políticas e empresariais, exploração que nada tem de patriótica.
E também estão fartos de nada verem acontecer por estas bandas de relevante para que se assista a uma política de melhoria substancial dos transportes – mais da oferta e qualidade do serviço de táxis –, com uma oferta plural de serviços, o mesmo sucedendo em relação ao custo do transporte de cadáveres e das cremações.
O que se passou na Assembleia Legislativa, e muitas vezes acontece sempre que estão em causa os monopólios e oligopólios das elites da terra, foi uma vergonha.
É preciso saber quem ganha com esses negócios, e que tem capitalizado à sua sombra com a inércia da Assembleia Legislativa e do Governo. Assim como com as agências de emprego e outras aberrações similares que por aí há e se continua a proteger.
As operações de limpeza interna contra a corrupção têm de chegar mais depressa a Macau. Não são para se ir fazendo aos bochechos para não se incomodar o vizinho, a empresa do primo ou o casineiro. Têm de acompanhar o ritmo imposto internamente. No respeito pelo Estado de direito e pelos legítimos interesses da população.
Isto está a precisar de alguém que não se acanhe, que não seja, ou esteja capturado pelas elites locais, ou próximo de situações de conflitos de interesses, e que dê uma varridela a sério. De alto a baixo. Incluindo na Assembleia Legislativa.
(créditos: Macau Business)
A muito custo, depois de múltiplas e permanentes críticas da população, com os taxistas a dizerem que era um exagero a atribuição de mais 500 licenças, apesar do número total de táxis ter sido reduzido nos últimos anos em cerca de 300 viaturas, e da Direcção dos Serviços para os Assuntos de Tráfego (DSAT) inicialmente anunciar apenas concurso para atribuição de 300 licenças, lá se abriu, finalmente, concurso para colocar na estrada mais 500 táxis.
Os primeiros dados revelados pela apresentação das propostas indicam que se apresentaram cerca de 40 (quarenta) candidatos desejosos de largarem, cada um deles, MOP$2.500.000 (dois milhões e quinhentas mil patacas) e entrarem num mercado que em breve será "caótico", de acordo com as previsões de um dirigente associativo.
Com o tempo que levou a abertura deste concurso, mais a miserável argumentação qe venderam aos residentes para o protelarem ao longo dos anos e a dificuldade que foi elevar o número de 300 para 500, a primeira conclusão que podemos tirar é que na DSAT, como em muitos outros serviços públicos da RAEM, não se tem um conhecimento mínimo da realidade. Ou tem-se e faz-se de conta que a realidade é outra para não se estragar o negócio aos que estão no mercado.
O número de concorrentes indicia, pelo menos, que o concurso deveria ter sido aberto para ser outorgado o dobro das licenças e que a DSAT não tem dados credíveis sobre o que se passa na sua área de actuação. Nada que fuja ao habitual.
Este elevado número de candidatos constitui mais uma prova de que o mercado dos táxis não estava saturado, ao invés do que apregoaram durante anos, e que há gente disposta a investir no negócio dos táxis, se os deixarem e não inventarem obstáculos, apesar do cenário calamitoso oferecido pelas associações e dos receios dos responsáveis.
Claro que na RAEM, tal como com o Ministério Público em Portugal, ninguém se sente responsável por coisa alguma, seja pela má gestão dos processos, seja pelos danos causados à comunidade em razão do irrealismo, da negligência grosseira, da protecção dada aos lobbies e clientelas ou do simples desinteresse pela salvaguarda do interesse público.
É a estas coisas, mas também aos preços nos mercados e supermercados, à qualidade dos transportes públicos, do ar e das águas – cada vez mais sofríveis –, e atentos ao que se faz em matéria de obras públicas, e não ao espiolhanço do se publica ou não se publica nos jornais, à crítica do que surge desalinhado ou aos disparates que saem nas redes sociais, que os representantes de Pequim deviam prestar atenção e dar o seu recado atempado às autoridades locais, censurando-os publicamente quando têm de ser censurados para que a população perceba que não estão cá só para cortar fitas ou frequentar vernissages.
Porque só assim poderão ajudar a corrigir os desequilíbrios da terra e a melhorar a qualidade de vida dos residentes, aproximando o serviço de táxis de Macau, e todos os outros que precisam de reforma, daqueles que são oferecidos em muitas metrópoles do interior do país.
Os táxis voltaram à ordem do dia. Não quer isto dizer que alguma vez tivessem deixado de ser tema de conversa, crítica, indignação por parte de residentes e visitantes. Mas desta vez trata-se da ordem do dia do plenário da Assembleia Legislativa. E não foi essa a primeira vez que o assunto foi levado ao hemiciclo.
Dos deputados à população não há quem há anos não se queixe quer da pura e simples ausência de veículos, quer da péssima qualidade do serviço prestado.
Tratando-se de um problema recorrente, que aliás tem motivado muitas e fundadas queixas por parte de nacionais que vêm do interior da China até Macau, é difícil compreender a inércia, falta de vontade, resistência ou simples incapacidade do Chefe do Executivo e do seu Governo para resolverem este problema.
O serviço de marcações não funciona. Acontece muitas vezes ser feito um agendamento, dizerem que será confirmado e que no próprio dia, cerca de dez minutos antes da hora marcada, entrarão em contacto com o utente, quando na realidade sucede que nesse dia e à hora prevista ninguém diz nada, ninguém telefona ou atende os telefones e não é dada qualquer justificação para a ausência da viatura. Um drama para quem tem de viajar para o exterior e se arrisca a ficar pendurado em Macau por falta de táxis e de transportes públicos capazes.
Depois, nas ruas, muitas vezes é o salve-se quem puder. Veja-se o que se passa, por exemplo, na Taipa, com dezenas e centenas de pessoas a aguardarem a sua vez por um táxi e com os motoristas a largarem os passageiros antes ou depois do local destinado para esse efeito, de maneira a que não tenham de esperar e possam negociar directamente preços com quem está fora das filas, muitas vezes nas barbas dos polícias que nada fazem, fechando os olhos e ignorando a confusão gerada.
A indignação de muitos viajantes que chegam de Hong Kong e do interior do país é notória. Alguns manifestam, como sucedeu recentemente numa reportagem da TDM, a sua insatisfação e incompreensão perante uma situação que não se verifica do outro lado da fronteira.
Como se tal não bastasse, sabe-se que há períodos do dia em que é quase impossível apanhar um táxi, pois parece que vão todos tomar as refeições e render à mesma hora. É o que acontece entre as 18 e as 20 horas, e nos dias de chuva então é melhor nem dizer nada.
E o problema da falta de táxis em Macau não se resolverá com um aumento de tarifas, com a "legalização" das irregularidades ou a atribuição de "prémios de desempenho", como peregrinamente sugeriu o deputado Ma Io Fong.
A única solução viável para o problema da falta de táxis e a recorrente má qualidade do serviço é o desmantelamento do lobby que manda nos táxis e a liberalização dos serviços com a introdução de mais concorrentes, já que também continua a ser incompreensível a ausência de outros serviços do tipo UBER à semelhança do que existe em Hong Kong, em muitas cidades chinesas e em quase toda a Ásia.
Quando há dias ouvi o dirigente de uma associação de táxis local considerar que a atribuição de mais 500 licenças seria um exagero, aconselhando-se prudência na sua atribuição, lembrei-me dos dados publicados pela revista Macau Business que salientavam ser o número de residentes e turistas por táxi de 19086 em Macau, de 3491 em Hong Kong, de 388 em Taiwan e de 1814 em Singapura, números que dizem tudo sobre a irracionalidade do serviço de táxis que temos e a condescendência dos responsáveis governamentais, há um ror de anos, perante esta inqualificável bagunça que não tendo sido, seguramente, herdada do tempo colonial, nada abona a favor do patriotismo e talento dos dirigentes locais.
A incompetência, a incapacidade governativa para a resolução do problema dos táxis e o seu arrastamento ao longo de anos com conversa fiada não têm nada de patriótico. Pelo contrário, dão cabo da imagem da pátria perante quem nos visita, prejudicam e exasperam a população, colocam a reputação da cidade nas ruas da amargura, causam múltiplos transtornos aos residentes, mancham a imagem do turismo, são fonte de conflitos nas ruas e colocam Macau ao nível do caos.