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ciência

por Sérgio de Almeida Correia, em 25.08.23

 

A água é um bem escasso e precioso. A água dos oceanos é património de todos e a todos tem de servir, mesmo àqueles que não têm acesso ao mar ou a água potável e precisam dos recursos daquele e desta para sobreviver.

A libertação das águas retidas pelo acidente nuclear de Fukushima começou a ser realizada sob a supervisão e controlo da Agência Internacional de Energia Atómica (AIEA). Este processo prolongar-se-á por trinta anos e está sujeito a constante monitorização.

A AIEA é um organismo internacional estabelecido sob a égide da Organização das Nações Unidas, que conduz as suas actividades de acordo com a carta e os princípios da ONU, e de que a Coreia do Sul e a China fazem parte, esta última desde 1984.

Nos últimos dias, e aliás na sequência do que aconteceu nos últimos meses, têm-se multiplicado as declarações e comunicados de representantes desses dois países sobre a inconveniência da libertação das águas em questão, ainda que tenham sido objecto de tratamento.

Não tenho dúvida de que este é um problema que merece a atenção e a reflexão de todos.

O que de todo não compreendo é a histeria colectiva que por aí vai com a proibição de importação de produtos japoneses ou a sujeição de alguns deles a fiscalizações mais rigorosas. 

Se quanto a estas parece-me que isso pode fazer sentido, pois que cautela e caldos de galinha nunca fizeram mal a ninguém, já quanto à proibição pura e simples de importação de produtos parece-me mais um pretexto político, tal como afirmou um empresário local, na minha perspectiva destinado a exacerbar ódios, inimizades antigas e a desviar a atenção das pessoas do essencial. 

Se quando a AIEA chama a atenção para a gravidade das situações e impõe limitações estão todos de acordo e se corre a citar os seus relatórios e as afirmações dos seus responsáveis, não se percebe agora qual o motivo para se atacar os relatórios, sem qualquer evidência científica alternativa, o acompanhamento da situação e a monitorização que está a ser feita das águas tratadas e descarregadas. 

Li o que foi escrito, também vi e ouvi o que foi dito pela AIEA, e retive as declarações de um dos mais conceituados especialistas portugueses sobre a matéria, Pedro Sampaio Nunes, que afirmou ser o nível de radioactividade não só muito inferior ao esperado como negligenciável, perfeitamente seguro para humanos e animais, como muito mais baixo, por exemplo, do que os níveis de radioactividade registados no rio [em] Manaus. Será preciso beber 3,5 litros da água de Fukushima para se ter o nível de radioactividade desta última (a partir do minuto 8:05). 

O presidente da AIEA referiu com toda a clareza que a monitorização e partilha da informação em tempo real é fundamental. E é isso que tem sido feito, não havendo razão para duvidar que as coisas se processassem de outra forma, de má fé ou destinadas a prejudicar os humanos, os animais e os oceanos em geral, numa palavra a própria Humanidade.

Compreendo que para países onde tudo é pouco transparente, secreto, confidencial, constantemente manipulado por motivos políticos e onde se está permanentemente a esconder a informação ao povo e aos parceiros internacionais, muitas vezes colocando em risco a saúde global, seja difícil perceber que os outros países e as agências internacionais não se comportam da mesma forma, não são organismos autocráticos e não funcionam no mesmo registo.

Não se pode invocar o que diz a AIEA e o seu presidente quando nos convém, quando apontam um risco, e desvalorizar o que essas mesmas entidades e os seus peritos dizem quando tal foi objecto de aturado estudo científico e não nos é politicamente conveniente.

Felizmente que em Macau há gente consciente e informada, como se viu numa reportagem da TDM, e que sabe que a desinformação só serve o obscurantismo.

As questões sérias devem ser tratadas com racionalidade, bom senso e boa fé. Não podem estar a ser distorcidas e manipuladas por circunstancialismos politicos.

E entre a propaganda estupidificante, a simples ignorância, o nacionalismo bacoco, o agitar pouco sério de fantasmas ou a ciência, feita por gente séria e qualificada, não tenho dúvida nenhuma de que opto pela última.

E confio tanto na ciência como acredito na independência de raciocínio, na transparência de processos, no acesso livre à informação, na seriedade de quem não teme o acesso a essa mesma informação por parte de terceiros, à sua divulgação atempada, à sua testagem e análise em tempo real, não colocando entraves à entrada e circulação de cientistas estrangeiros e aos seus equipamentos, nem condicionando a acção das agências e dos peritos internacionais por razões políticas.

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