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Linhas em jeito de diário. Inspiração. Homenagem a espíritos livres. Lugar de evocação. Registo do quotidiano, espaço de encontros. Refúgio de olhares. Espécie de tributo à escrita límpida, serena e franca de Marcello Duarte Mathias.
Engrácia é nome da santa, tanto para católicos como ortodoxos, que terá sido martirizada por volta do século IV. Mas foi por causa das obras de uma igreja de Lisboa que o nome ficou mais conhecido e entrou na lenda. A expressão popularizou-se, e mesmo em Macau é possível falar em obras de Santa Engrácia, querendo-se com isso referir o tempo infindável que a realização de uma empreitada comporta.
Quem quiser conhecer a lenda e a origem da expressão terá certamente tempo para o fazer, como será o caso do empreiteiro a quem foi confiada uma certa obra num local que a toponímia designa como Escadaria da Praia de Choc Van, a qual fazia a ligação entre a Estrada de Choc Van, a praia e as estruturas balneares e recreativas existentes ao fundo das escadas.
Digo fazia porque sucede, pelo menos desde a terceira semana do Outono passado, que esse acesso à praia e à piscina pública foi encerrado para a realização de obras de melhoria dos acessos pedonais.
O prazo de realização da obra que consta da tabuleta afixada no local era de 110 dias, estando fixado como momento do seu início 8 de Outubro de 2022.
Os 110 dias terminaram há muito e não há vislumbre da data em que a escadaria voltará a ser aberta ao público, com todos os transtornos inerentes a quem habitualmente a utilizava, fosse por razões lúdicas ou de trabalho.
É verdade que actualmente na RAEM ninguém estranha atrasos em obras públicas e municipais, tão corriqueiros e habituais se tornaram, bastando ouvir as respostas do Secretário para as Obras Públicas na Assembleia Legislativa, ou o à-vontade com que fala aos jornalistas sobre o assunto, para se perceberem as virtudes do sistema.
Das obras do novo Hospital do Cotai, que só arrancaram de "empurrão", depois de muitos milhões, ao fim de anos de incúria e desleixo, às da prisão, sem esquecer as que em permanência atormentam diariamente os condutores de qualquer veículo que demande as ruas e estradas da RAEM, é um interminável martírio que se junta à má qualidade do ar, quase sempre insalubre, e aos transportes públicos onde se anda sempre "à cunha" e aos encontrões. Imaginem o que seria sem os autocarros das concessionárias de jogo em circulação a transportarem à borla os "turistas".
Enfim, talvez alguém nos possa elucidar sobre o que se está a passar na escadaria de Choc Van e qual a razão para tão grande atraso nas obras que ali decorrem. E também sobre se foram, ou vão ser, aplicadas sanções ao empreiteiro pelos atrasos. Ou se isso ainda nem sequer foi equacionado, o que também teremos de admitir.
Pergunto isto porque sei que aos dirigentes do IAM, como é normal desde que foi mudado o regime dos órgãos municipais, os cidadãos deixaram de poder penalizá-los pelo mau desempenho. Não respondem perante os cidadãos. Só quem os escolheu saberá a razão para os atrasos nas obras e o que fazem quando não estão a cortar fitas ou a apreciar o perfil dos candidatos à Assembleia Legislativa.
O JTM dá conta, em primeira página, pelo que se depreende ser uma notícia importante, que "Ho Iat Seng adia formalização por causa de obras".
Lendo a notícia fico a saber que se trata da formalização da candidatura do pré-candidato (futuro?) a Chefe do Executivo da RAEM, e que aquela está atrasada por causa das obras. Nem mais. Inicialmente prevista para 20 de Maio, a data da formalização teve de ser alterada para final de Maio ou início de Junho por atrasos das obras do escritório.
Depois de ter feito o anúncio da sua pré-candidatura em plena Assembleia Legislativa, candidadamente confessando não ter ainda qualquer programa para o cargo que pretende exercer, pode-se dizer que o candidato continua no rumo certo.
Atrasos por razão de obras é o pão nosso de cada dia na RAEM e têm custado muitos milhões ao seu erário. Das obras do Metro Ligeiro à de qualquer beco, sem esquecer o novo Hospital das Ilhas, a Cadeia ou o Terminal Marítimo da Taipa tem sido todo um rol de incumprimentos sem responsáveis conhecidos.
Não é por isso de estranhar que também as obras da sede de candidatura do pré-candidato a Chefe do Executivo estejam atrasadas. Corresponde ao padrão.
Como residente só lamento que o Dr. Ho Iat Seng comece já por não ser capaz de cumprir os calendários que ele próprio para si definiu e deixe transparecer para os cidadãos esta imagem.
E humildemente concluo que, se com o que já vem de trás da condução do processo de suspensão do deputado Sulu Sou e da não renovação dos contratos a dois assessores portugueses da AL, começa assim, com atrasos e adiamentos, numa empreitada tão básica (por ajuste directo, presumo) e com a dimensão do seu próprio escritório (sede) de candidatura; e em relação a uma decisão que deverá ser a mais importante e honrosa da sua vida, a de ser candidato a Chefe do Executivo da RAEM, temo que não fosse por esta amostra que alguém dizia há dias ser ele uma pessoa "altamente competente".
Em todo o caso, uma coisa é certa: se chegando a Chefe do Executivo a sina da RAEM continuar a ser a dos processos mal conduzidos, das desculpas esfarrapadas, das obras e dos atrasos, pelo menos não haverá ninguém a estranhar. Nem aqui nem em Pequim.
O ruído, seja ele qual for, é sempre um problema para quem tem de escutá-lo durante horas a fio. E por aqui, quer-me parecer que só estão preocupados com aquele que é produzido durante as horas de descanso, que para a maioria das pessoas são as do período nocturno.
É pena que não se preocupem também com o ruído durante as horas de trabalho, nos edifícios onde funcionam serviços públicos, escritórios, clínicas, consultórios, creches, salas de estudo; isto é, locais de trabalho onde a realização de obras segue os mesmos horários dos edifícios residenciais, o que me parece não fazer qualquer sentido.
Se há direito ao descanso, e há, também há um direito ao trabalho e ao estudo com condições ideais de concentração e sossego. E com berbequins a toda a hora, com o chão a tremer, e o pó a entrar pelos gabinetes, vindo pelas condutas e de mais sei lá onde, ninguém faz nada de jeito. Um tipo só ganha em irritação e dores de cabeça.
Digo isto porque me parece que seria do mais elementar bom senso que em edifícios de escritórios, como aquele onde trabalho, cujo ar condicionado é central e só funciona das 8:00 às 18:00, exactamente porque a partir desta última hora a maioria sai, fosse adoptado um regime horário para execução de obras nas fracções que não perturbasse quem está, quer e precisa de trabalhar ou estudar.
Seria por isso ajuizado que em edifícios exclusivamente de serviços e escritórios se impusesse a regra de que obras ruidosas só poderiam realizar-se, por exemplo, entre as 18:30 e as 08:00, durante os dias úteis, aos sábados a partir das 13:00, e aos domingos e feriados a qualquer hora do dia. Podem ter a certeza de que toda a gente agradeceria, incluindo aqueles que querendo dar conta das encomendas e dos prazos ficam impedidos de dar continuidade às obras ao domingo.
(créditos: AFP)
Passaram menos de vinte e quatro horas sobre o final da visita a Macau do Presidente do Comité Pernanente da Assembleia Nacional Popular, isto é, do número três do regime chinês. Terminada a lição de patriotismo, a distribuição de louvores e de puxões de orelhas, e dadas as instruções sobre o futuro, regressa tudo ao mesmo, ao ramerrão habitual.
Os polícias fardados e à paisana, que acompanhavam o desfilar de postes de iluminação e ornamentavam as rotundas e cruzamentos, quase que por milagre desaparecem. Os estacionamentos públicos são reabertos, os namorados voltam a poder passear e namorar tranquilamente junto ao rio, num banco de jardim, sem serem importunados pela segurança, os motociclos da PSP que estavam parados ao longo dos traços contínuos, em esquinas e locais de estacionamento proibido recolhem, volta-se a poder circular no túnel de acesso à Universidade de Macau. Os buracos que haviam sido tapados e disfarçados com alcatrão para esconder o estaleiro e o mau estado das vias públicas da RAEM já estão de novo a ser destapados. Esta manhã, bem cedo, na Avenida dos Jogos da Ásia Oriental e nos acessos à Ponte de Sai Van lá estavam de novo as máquinas alinhadas, os homens prontos a esburacarem tudo outra vez, a recomeçarem tudo de novo, e os pinos que assinalavam os desvios e os perigos na estrada a postos para a confusão do fim de tarde.
E tudo ficará assim, como é normal, até que nova visita ocorra. E se volte a tapar tudo à pressa para se disfarçar a má gestão enquanto se agitarem as bandeirinhas de plástico. Não há nada como um maioral na aldeia para se tirar o pó dos fatos e se engraxarem as polainas. Não há nada como colocar os régulos no seu lugar.
Não sei se todos já se aperceberam, mas num curto espaço de tempo desapareceu das vias públicas da cidade uma montanha de lugares de estacionamento automóvel de superfície, sem que tenham sido substituídos por novos espaços para a mesma finalidade. Eliminaram-se os parques e fizeram-se crescer os passeios, ainda que isso ocorra em zonas sem ou praticamente nenhum movimento de peões que justifique as obras e o alargamento. O que acontece em prejuízo dos cidadãos automobilistas e em zonas comerciais. Ao mesmo tempo dá-se dinheiro a ganhar aos senhores que produzem os horríveis aros metálicos verdes que passaram a "enfeitar" todas as artérias, mesmo em zonas onde existem nas bermas linhas contínuas amarelas indicativas da proibição de estacionamento.
Eu não acredito que sejam só coincidências porque os que beneficiam com o que se está a passar são os que sempre beneficiaram: os empreiteiros que fazem as obras, os concessionários dos silos automóveis, a PSP, e às vezes, também, os vendedores das câmaras de filmar que contribuem para ir transformando Macau no sucedâneo de um estado policial. A gente de sempre.
Por outro lado, são instalados novos parquímetros, sem que perceba muito bem a razão para a substituição dos anteriores, que funcionavam razoavelmente bem e cumpriam a sua função. Ainda pensei que como os antigos não davam recibo estes agora passassem a emiti-lo. Pura ilusão. Um tipo paga, alguém mete ao bolso, e quem paga fica sem recibo e não tem maneira de provar que pagou.
Este problema dos recibos, infelizmente, parece estar generalizado e afecta, inclusive, os próprios serviços públicos. Ainda há dias fui ao Centro Ecuménico "Kun Iam", na Av. Dr. Sun Yat-Sen, no NAPE, e aproveitei para comprar um dos livros que se vende na pequena loja aí existente, explorada pelo Instituto Cultural de Macau (ICM). Pagar paguei, recibo é que nem vê-lo. Ainda perguntei pelo dito, mas a funcionária, à laia de uma qualquer mercearia, limitou-se a encolher os ombros e a lançar numa folha de papel a venda que acabara de efectuar.
O mal é geral, está a espalhar-se e nem as gasolineiras escapam a esta nova moda da eliminação dos recibos. Quanto aquelas, que até há pouco tempo emitiam recibos manuscritos onde era aposta a matrícula dos veículos que abasteciam, agora recusam-se a emiti-los e impingem ao cidadão os duplicados dos talões (nem sequer são os originais) que retiram das máquinas. E que, além do mais, sendo impressos em papel térmico, com a humidade, estão destinados a desaparecer em pouco tempo.
Nada disto é inocente e o problema não é só de (in)competência de quem manda. E não me venham dizer que os contribuintes terão de passar a fotocopiar todos os seus recibos, com os inerentes gastos em papel, tinta e electricidade para se poderem proteger perante o fisco porque dá-me logo vontade de dizer um palavrão.
Ao contrário do que se passava no Ministério Público, onde os recibos das obras e viagens se multiplicaram alegremente durante uma década, e com a PSP, que se farta de emitir "facturas e recibos" aos cidadãos, parece que em Macau mais ninguém se importa com este assunto. Fiscalização, nesta como noutras situações em que o contribuinte necessita de ser urgentemente protegido, parece ser coisa inexistente e com a qual também não se preocupa a maioria dos deputados da Assembleia Legislativa. Para os cidadãos é uma espécie de salve-se quem puder. Para outros, como ainda agora também se viu com alguns generosos subsídios da Fundação Macau, é um "venham a nós os vossos milhões". Um dia a gente chateia-se e a casa vem abaixo.
(foto JTM)