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informação

por Sérgio de Almeida Correia, em 21.07.17

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Depois do que noutro post escrevi sobre a anunciada suspensão do funcionamento da ETAR de Macau, o Secretário para os Transportes e Obras Públicas foi à televisão esclarecer que afinal a obra de substituição de uma conduta até poderá ser feita em menos de três dias, uma vez que pediu autorização ao Chefe do Executivo para que pudesse ser violada a lei do ruído e fosse possível trabalhar durante a noite, enquanto as descargas fossem feitas em vários locais da península. Violar a lei para se poder fazer o necessário já é um mau princípio, mas ainda assim... fosse esse o mal.

Eu conheço o Secretário para os Transportes e Obras Públicas há muitos anos, e tenho-o na conta de uma excelente pessoa, de um homem bom e bem preparado para o lugar. Admiro a sua sinceridade, que poderá por vezes soar a ingenuidade numa terra como esta e face à magnitude das tarefas que lhe foram cometidas, mas ao mesmo tempo vejo ali falta de calo político e ausência de informação, ou de informação credível.

Para se ter informação, e informação credível, também é preciso ir à procura dela. Não se pode confiar no preguiçoso que não está para se incomodar, nem no aldrabão que só se quer encher à custa dos contratos que obtém com os departamentos oficiais.

Os esclarecimentos que tenho recebido de quem sabe da poda dizem-me que a ETAR polui diariamente e há muito anos. Daí a qualidade das águas circundantes ser tão má. Porquê? Porque a ETAR tem uma capacidade, desde sempre, e este é que é o problema, muito inferior àquela que o Governo e os seus fornecedores e operadores anunciaram que tinha.

Como me foi explicado, desde o tempo da anterior administração portuguesa – o mal já vem detrás, como eu sempre disse, do tempo daquele general que por aí andou a fazer turismo – que  a capacidade de tratamento da ETAR foi divulgada como sendo de 144.000 toneladas/dia, valor que está muito aquém da verdadeira capacidade de processamento da ETAR. Este facto descobriu-se há alguns anos e ainda no tempo daqueles antecessores do engenheiro Raimundo Rosário que só deixaram más recordações e uma herança invejável ao erário público e ao ambiente da RAEM. 

Quer isto dizer, de acordo com os dados que me foram fornecidos e que constam de estudos técnicos, que a população de Macau é enganada há mais de 20 anos. Parto do princípio de que isto é verdade, tanto mais que consta de estudos que são do conhecimento do Governo da RAEM e que não foram publicamente postos em causa. 

É claro que quando estas coisas se passam à porta fechada, sem transparência, com a informação controlada e a máquina da propaganda bem oleada, é tudo muito mais complicado para a população saber o que se está a passar.

Agora devemos estar numa situação parecida. Quem disse ao Secretário que fazia as obras em três dias é fiscalizado por quem? E ele acredita depois de tudo o que já aconteceu?

Seria interessante saber por que razão entre 2000 e 2015 as descargas poluentes, feitas as contas tendo em atenção a capacidade da ETAR de Macau, davam para encher cerca de 35.000 camiões. Isto é, foram mais de 157.000 toneladas de esterco "altamente poluente e não bio-degradável" que não foram devidamente tratadas e ficaram depois depositadas, como se fossem lama, no fundo do rio. Por isso, penso eu, vão aparecendo tantos peixes mortos e muitos dos banhistas que se atrevem a tomar banho nas praias da RAEM acabem no médico. Os dermatologistas não têm mãos a medir.

Em vez de se fazerem obras de raiz, decentes e por gente competente, vai-se deixando andar, remediando, poupando onde não se pode nem se deve poupar, que é naquilo que tem que ver com a qualidade de vida dos residentes, com o meio ambiente, com o mundo onde temos de viver. Em vez de se lançarem concursos públicos fazem-se ajustamentos pontuais.

Ver uma foto das águas que saem da ETAR de Macau e as águas que saem de uma ETAR na China é como comparar a noite e o dia.

A imprensa devia investigar o que se está a passar. Porque há danos que os homens provocam no ambiente que são crime. E o crime ambiental, havendo responsáveis, deve ser severamente punido. Os responsáveis políticos deviam ser os primeiros a desejá-lo. E darem o exemplo. Para o bem da população de Macau, do meio ambiente e das gerações futuras.  

É importante que os Secretários e o Chefe do Executivo se preocupem com as bandeiras que estão viradas ao contrário nos departamentos oficiais, mas não é por esse facto que se morre. Já de legionella, de cólera, de gripe aviária e de outras doenças que medram em locais pouco saudáveis morre-se.

Seria bom que tivessem isso presente na hora de tomarem decisões. Seja sobre o comércio de galináceos vivos nos mercados, seja sobre a reparação de uma conduta da ETAR de Macau. E que cortassem a direito.

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etar

por Sérgio de Almeida Correia, em 19.07.17

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(Foto daqui)

A Estação de Tratamento de Águas Residuais (ETAR) de Macau é um case study.

O ano passado, em Março, ficámos a saber que a capacidade da ETAR tinha excedido o seu limite já há seis anos, mas que, entretanto, iria ser lançado um concurso público. E tudo voltaria a ser um mar de pérolas. Na ocasião, o Secretário para as Obras Públicas garantiu que houve águas residuais que foram retidas, não tendo sido tratadas de imediato, o que não significava que fossem lançadas sem tratamento. O povo acreditou.

E isto foi dito apesar de, também, aquele que foi o director dos Serviços de Protecção Ambiental (DSPA), Vai Hoi Ieong, ter referido que "o governo está a negociar com a empresa que tem a gestão da ETAR para, "com a maior brevidade possível, elevar a capacidade de carga". Tomei nota da maior brevidade.

Depois, em Junho, Chan Shek Kiu, do Instituto de Ciência e Ambiente da Universidade de São José, divulgou que a ETAR não conseguia tratar toda a água residual que recebia e, acrescentou, "diz-se que, às vezes, metade da água não é tratada e acaba por ser descarregada para o mar". A CESL-Ásia, que sabe "como fazer crescer uma cidade" e tem dado cartas nesta área, levou por tabela.

Esta noite, o Telejornal da TDM deu-nos a boa nova: as coisas estão a correr tão bem, foi tudo tão bem feito nos últimos 18 meses, que agora as águas residuais vão ser lançadas ao rio durante três dias, pelo menos três dias, sublinho eu, que se saiba, sem qualquer tratamento.

Na dúvida fui confirmar o que ouvi fazendo uma visita à página na Internet da Direcção dos Serviços de Protecção Ambiental. E lá estava escarrapachado o que acabara de saber. Aquilo que antes era um "simples" problema de elevação da carga da ETAR transformou-se num pesadelo.

Devo dizer, com toda a franqueza, que não só não acredito que as obras sejam realizadas, muito menos bem feitas, em apenas três dias, tomando por referência o que acontece com qualquer obra pública na RAEM — onde só não há obras a estorvar a vida dos cidadãos e a "terminarem" a horas quando se pretende esconder aos dignitários de Beijing que nos visitam o estado calamitoso que atingiu a gestão da coisa pública —, como desconfio que uma vez mais nos estão a enganar. Como nos enganaram com o metro ou com o novo hospital.

A  R. P. da China anda preocupada com os Acordos de Paris, construiu a maior central solar flutuante do mundo, toma medidas para proteger e melhorar o ambiente, faz investimentos vultuosos na área da protecção ambiental, do tratamento de lixo e de resíduos e persegue os corruptos por mais poderosos que sejam (nos últimos anos, dos graúdos do Politburo, recordo Chen Liangyu, Bo Xilai e agora Sun Zhengcai). E em Macau, com casinos que rendem milhares de milhões ao erário público, sem qualquer esforço do poder político, a situação atingiu este nível? Como alguém me dizia há dias, não tivessem sido os novos hotéis e os investimentos da área do jogo e na RAEM estaria em 2017 tudo como estava em 1999. Apenas com mais pobres e mais lixo. Ou seja, sem esses investimentos vindos de fora a RAEM assemelhar-se-ia hoje a uma favela. Lunar é certo, com astronautas e patos de borracha descomunais, mas ainda assim uma favela. 

Seria fácil e abundante a adjectivação para caracterizar o que se está a passar, há vários anos, com a ETAR de Macau, com a protecção ambiental (ou com a falta dela) e com estado de degradação do ambiente e da qualidade do ar na RAEM. Não vale por isso a pena, até porque os tempos não estão para brincadeiras e a paciência me falta, ir por aí.

Mas faz-me espécie que, em vez de se preocuparem em barrar a entrada de deputados de Hong Kong que querem vir a Macau gastar uns dólares e divertir-se, em vez de perderem tempo a multar motociclos e a verificar parquímetros nos parques de acesso aos trilhos de Coloane, ou a andarem atrás de quem anda a fumar nos jardins, não se preocupem em resolver os grandes e graves problemas que verdadeiramente afectam os cidadãos e a sua vida na RAEM (aqui ao lado, em Hong Kong, Carrie Lam já percebeu por onde terá que seguir).

Impõe-se, por isso mesmo, perguntar ao vento, ao mar, ao oráculo do Largo do Senado, que esses ainda nos ouvem, se, depois de Ao Man Long e de Ho Chio Meng terem sido acusados, julgados e condenados — aliás em processos judiciais que colocam em causa não apenas o segundo sistema mas muitas decisões e procedimentos seguidos ao longo de mais de uma década, bem como a própria existência de um sistema judicial independente, moderno, decente e civilizado, que garanta uma investigação isenta, os direitos de defesa dos arguidos e o seu legítimo e inquestionável direito a verem reapreciadas as decisões que os afectam por uma instância de recurso —, vai ficar tudo como está em relação a este problema da ETAR de Macau?

Basta ir fazendo análises às águas? Ou será que o facto de haver quem defenda que os direitos ambientais são também direitos humanos vai fazer com que na RAEM sejamos todos obrigados a viver rodeados de trampa por todos os lados, no mar, no ar e em terra? Quando é que o novo estabelecimento prisional fica pronto para se poder começar a rentabilizar o investimento? Não estará na hora da RAEM deixar de continuar a alegremente regredir? Até quando, numa terra onde os pandas gozam do direito de viver numa redoma com ar-condicionado, os humanos têm de continuar a pôr uma máscara quando saem à rua ou a taparem o nariz e os olhos à passagem dos autocarros, táxis e camiões? Quando voltaremos a ter uma cidade e um ambiente onde dê gosto viver?

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