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Linhas em jeito de diário. Inspiração. Homenagem a espíritos livres. Lugar de evocação. Registo do quotidiano, espaço de encontros. Refúgio de olhares. Espécie de tributo à escrita límpida, serena e franca de Marcello Duarte Mathias.
Há dias, o director dos Serviços de Saúde de Macau, Alvis Lo, que é também médico e presidente do Conselho dos Assuntos Médicos, e cujo esforço tem sido notável em relação ao combate à COVID-19, manifestava a sua preocupação, com toda a razão, relativamente à baixa taxa de vacinação da população.
Desde o dia 9 de Fevereiro pp., quando começaram a ser ministradas as vacinas, até agora, estando nós já em Maio, apenas cerca de 10% da população está vacinada. Alvis Lo referiu que a actual taxa de vacinação não é satisfatória apesar do muito trabalho já desenvolvido. Em contrapartida, aqui ao lado, em Zhuhai, a taxa de vacinação é já a mais alta da China e 80 % da população está vacinada.
Estes números, e esta diferença abissal entre Macau e Zhuhai, devia ser motivo de vergonha para todos nós, a começar pelo Chefe do Executivo de Macau, que podendo dar um exemplo de boa governança para toda a China deixa a RAEM sair humilhada deste confronto.
Já aqui chamei a atenção para este estranho, e a meu ver pouco inteligente, fenómeno. Com milhões em todo o mundo desesperadamente à procura e à espera de vacinas, aqui desperdiçam-se tempo e recursos, seja por medo ou simples ignorância, sem que se tire partido da ajuda dada no sentido de todos se poderem vacinar sem custos e em prazo curto para ficarmos todos mais protegidos.
Em contrapartida, bastou as autoridades anunciarem a segunda fase do programa de estímulos à economia e ao consumo, com o maná da distribuição de patacas e vales de desconto, para a população se predispor a massivamente inscrever-se logo no primeiro dia. Referia ontem o Telejornal da TDM que foram cinquenta mil os residentes, a esmagadora maioria sem estarem vacinados e que não precisaram de realizar qualquer teste de ácido nucleico, que em cinco horas se inscreveram para terem acesso aos benefícios.
Não deixa de ser estranho que esta distribuição de dinheiro ao povo não seja rodeada dos mesmos cuidados, critérios e grau de exigência que presidiram, por exemplo, ao impedimento de manifestações no Primeiro de Maio e durante todo o ano passado.
Ou que ainda impedem o empenho na abertura, com transparência, de um canal de viagem directo, por via marítima, entre Macau e Hong Kong, para quem esteja vacinado e apresente um teste negativo realizado nas 72 horas anteriores. Ou, nas mesmas circunstâncias, a redução dos períodos de quarentena para que muitas viagens de negócios, médicas, de intercâmbio académico ou simples visita a familiares se possam realizar com segurança. Até porque o critério referido dos 14 dias sem casos, que foi o indicado em relação a Hong Kong para se admitir o levantamento de restrições, não é igual ao seguido para as deslocações entre o interior da China e Macau.
Compreendo que seja mais do agrado da populaça, e mais fácil, dar dinheiro que não custou a ganhar para estimular o consumo do que oferecer estímulos à população para que se vacine ou para que exerça os seus próprios direitos consagrados na Lei Básica.
Mas enquanto for este o espírito que preside à governação, estimulando-se o consumo sem critérios adequados e tendo como único guião agradar a quem recebe, nos mesmos termos em que se restringem direitos para mostrar serviço a quem manda, em vez da criação de um espírito forte de entreajuda, solidariedade social, consumo responsável e exercício saudável da cidadania, será difícil conseguirmos algum dia construir uma sociedade equilibrada.
Por muitos talentos e dinheiro que se tenha disponível, enquanto faltar isso faltará sempre o básico.