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charco

por Sérgio de Almeida Correia, em 12.01.23

Lago Nam Van – Wikipédia, a enciclopédia livre

À medida que avança o julgamento do caso de corrupção que sentou no banco dos réus dois ex-directores dos Serviços dos Solos, Obras Públicas e Transportes, nota-se o incómodo das instituições e dos seus titulares. Dir-se-ia mesmo que nesta terra quando as coisas não encaixam no guião se torna mais difícil acomodar os factos à realidade que se quer ver vingar.

Se já em Dezembro passado o Chefe do Executivo não autorizou a prestação de depoimentos por parte do seu antecessor e do Secretário para as Obras Públicas, o que não deixa de ser lamentável quando em causa está apurar a verdade dos factos e perceber quem está a mentir e até onde vai o manto diáfano da alta corrupção, agora foi a Assembleia Legislativa a obstaculizar ao depoimento do deputado Vong Hin Fai, a que se seguirá previsivelmente igual decisão quanto aos deputados Chui Sai Cheong e Chui Sai Peng.

Não deixa de ser curioso que haja tanta gente da mesma família a ser referida por vários intervenientes num único processo, de arguidos a testemunhas, e não haja um esforço mínimo de se apurar a razão ou sem razão da invocação, tantas vezes, desses nomes – que não são pessoas quaisquer –, preferindo-se deixar tudo na opacidade.

Seria, aliás, necessário esclarecer, posto que isso foi também referido na sessão de ontem do julgamento, que história é essa das listas VIP para aquisição de fracções autónomas com 40% de desconto que eram aprovadas pelo arguido Ng lap Seng.

Recorde-se que este arguido, anteriormente ligado a diversos projectos imobiliários de grande envergadura, parceiro de negócios de alguns outros "tubarões" de Macau, financiador da Fundação Mário Soares, esteve preso durante largo tempo nos Estados Unidos da América exactamente por razões que se prendem com práticas corruptivas.

Saber até onde chegam as suas ramificações, até onde vão os tentáculos do polvo e dos seus parceiros de negócios, quais as razões para a existência dessa lista VIP, quem lá estava e porquê, é assunto de manifesto interesse público.

Qualquer residente de Macau gostaria de ter adquirido, de forma limpa, um apartamento, ou vários, no edifício Windsor Arch com um desconto de 40% e isenção do pagamento de condomínios. 

O escandaloso património imobiliário que algumas pessoas "amassaram" em Macau nas últimas décadas devia merecer outra atenção de quem tem por obrigação combater a corrupção, defender a legalidade, o bom nome das instituições e fazer justiça. Já bastou o que se passou no tempo da administração portuguesa com alguns "servidores" públicos.

O que se está a passar agora ultrapassa todos os limites, e é muito mau para quem vê o seu nome referido nos julgamentos em curso e não tem oportunidade de se defender. Mas é também mau para os arguidos e para as testemunhas, perante os quais parece que alguns partem do pressuposto de que nunca falam verdade; como ainda é mau para a justiça que se quer fazer e que se pretende que seja acima de tudo independente, transparente, imparcial e justa, mas é particularmente mau para a dignidade das instituições e o bom nome da RAEM, dos seus dirigentes e da República Popular da China que é quem tem, em última análise, a maior responsabilidade sobre os escândalos de Macau que envolvem dirigentes políticos e altos funcionários da Administração.

Não se percebem quais os receios do Chefe do Executivo e da Assembleia Legislativa para se impedirem os depoimentos dos visados.

Isto está tudo a cheirar demasiado mal há muito tempo e não é só por causa da ausência de uma política ambiental séria e da falta de tratamento adequado dos resíduos líquidos e sólidos.

De um charco saem todos enlameados. Os limpos, os sujos e as instituições.

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incompreensível

por Sérgio de Almeida Correia, em 12.12.22

A notícia de que o Chefe do Executivo da RAEM não autorizou a prestação de depoimentos em juízo do seu antecessor, bem como do actual e anterior secretário para as Obras Públicas e Transportes, é mais uma machadada na credibilidade do sistema de justiça da RAEM e um prego no caixão da transparência e da luta anti-corrupção do Presidente Xi Jinping.

Dois antigos altos dirigentes das Obras Públicas estão a ser julgados depois de terem sido pronunciados pela prática de crimes de branqueamento de capitais, corrupção e associação criminosa. A natureza dos crimes e das imputações é de uma tal gravidade que teria evidentemente de ser investigada e clarificada até ao osso. Se múltiplas vezes, no decurso do julgamento, são imputadas responsabilidades ao anterior Chefe do Executivo e a outros nas decisões tomadas pelos arguidos no exercício de funções públicas, não se percebe de todo qual a razão para que fique tudo no limbo.

A decisão tomada por Ho Iat Seng de impedir os depoimentos dos visados não protege a RAEM, não dá àqueles a oportunidade de se defenderem de acusações eventualmente injustas que contra eles estejam a ser feitas pelos arguidos, além de que não protege o próprio Chefe do Executivo em funções e vai contra o interesse público na realização da justiça.

A luta contra a corrupção, contra o tráfico de influências e por uma maior transparência na realização dos negócios públicos não pode bastar-se com uma investigação superficial dos factos, limitando-se a apanhar alguns "ratos" que tiraram partido do sistema vigente para enriquecer ilegalmente, iludindo-se a opinião pública, deixando-se escapar o "polvo", e colocando a salvo outros envolvidos que tivessem responsabilidades públicas. Afinal, todos aqueles de quem os governados esperam que tenham mais probidade e seja maior o grau de exigência e responsabilização no exercício dos cargos para que são escolhidos e em quem todos confiam.

Não se percebe qual o receio da verdade material. Nem o que se teme quando se decide proibir a prestação dos depoimentos de quem é acusado publicamente de estar no topo da cadeia de comando das decisões ilegais que foram tomadas.

A verdade acabará por ser conhecida de todos. E nessa altura ninguém será poupado.

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esclarecer

por Sérgio de Almeida Correia, em 28.11.22

1-RM_LiCanfeng_RaimundodoRosario3.jpg.webp(foto daqui, do Macau Daily Times)

Numa terra onde os arguidos em processos criminais normalmente escusam-se a falar e a esclarecer, preferindo a opção pelo direito ao silêncio, registam-se as declarações prestadas em juízo pelo anterior director dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes.   

Que tenha rejeitado as imputações de culpabilidade que lhe foram feitas pelo Ministério Público, e se tenha declarado inocente da prática dos crimes por que vem acusado, não é nada que se estranhe.

Importante é, todavia, o facto de se ter declarado inocente apontando responsabilidades, quanto às decisões tomadas e a todos os atropelos verificados no projecto de Alto de Coloane, a Chui Sai On e ao actual Secretário para as Obras Públicas, acusando o primeiro de ter dado as ordens para o reinício das obras e "coordenado pessoalmente" o processo, com  instruções específicas para que andasse depressa, logo no primeiro dia no cargo.

É público que a escolha do ex-director das Obras Públicas foi uma opção pessoal de Raimundo do Rosário, secundada pelo anterior Chefe do Executivo. Na altura em que essa decisão foi tomada, o próprio Chui Sai On justificou a escolha dizendo que Li Canfeng foi escolhido depois de avaliadas "a sua disciplina, as suas habilitações e a sua experiência", critérios que foram tidos em consideração. Chui Sai On ainda acrescentou que Li Canfeng foi nomeado pelo secretário em consideração a tais critérios, e que embora tivesse sido testemunha no processo de corrupção que envolveu o ex-secretário Ao Man Long "nunca foi arguido". Saiu, pois, em sua defesa.

Recorde-se que no processo de Ao Man Long, a então testemunha evidenciara preocupantes sinais de falta de memória. Agora vê-se que recuperou. Eu congratulo-me com isso. Ainda bem que assim foi. Urge tirar partido desse facto antes que o arguido volte a ter falhas de memória, apurando-se com urgência todas as responsabilidades.

A prudência, e tudo o que aconteceu naquele processo que ditou a prisão do antigo secretário, aconselharia a que quem directa ou indirectamente tivesse estado envolvido naquela pouca vergonha nunca mais pusesse os pés na Administração Pública e no Governo da RAEM, ou que para este trabalhasse, fosse como dirigente, a apresentar projectos ou a fiscalizar obras. Mas não foi isso que se viu. Fizeram-se ouvidos moucos a todas as suspeições e críticas. 

Para quem está de fora, olhando para os factos conhecidos, os "artistas" – alguns que antes eram amigos dos arguidos e disso se ufanavam continuam inexplicavelmente na sombra  – e as noticias publicadas ao longo dos anos, verifica-se que corresponde tudo ao mesmo padrão de actuação, aos mesmos esquemas, que acabavam sempre com o enriquecimento de uns quantos figurantes, respectivas famílias e amigos. Sempre os mesmos.

Seria por isso importante que perante a gravidade das acusações feitas – até porque poderá haver gente de boa fé envolvida na lama contra a sua vontade, por temer represálias, e que tem o direito de ver o seu bom nome protegido, seja o secretário ou o contínuo, o caso Sun City ainda não acabou e os negócios desta empresa cruzaram-se múltiplas vezes com a acção governativa e diversos departamentos, evidenciando-se ao longo dos anos ligações múltiplas e extensas ao poder político –, se investigasse tudo até ao fundo.

Isso também poderá ajudar a avivar a memória de mais algumas pessoas, evitando-se que pelo meio haja quem procure atalhar a que se saiba o que não é conveniente, para alguns, para assim se impedir que a verdade a que todos os residentes têm direito não seja integralmente conhecida. 

O Ministério Público tem a obrigação de investigar tudo, a começar pelas denúncias feitas em juízo, mandando extrair certidões e iniciando novos processos, mesmo que isso envolva anteriores administrações ou gente ainda em funções, apurando-se eventuais pressões ilegais ou enriquecimentos injustificados dos próprios, das respectivas famílias e dos seus amigos e parceiros de negócios.

O combate à corrupção tem de ser integral e não pode proteger ninguém. Muito menos quem no passado tiver praticado actos com contornos criminais que provocaram, a diversos níveis, o empobrecimento da RAEM.

Macau e as suas gentes já foram demasiadamente prejudicadas. É urgente esclarecer.

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justiça

por Sérgio de Almeida Correia, em 12.04.21

Em 2009 escrevi isto:

"Muitos juízes de instrução não passam de chancelas do MP limitando-se a colocar um "visto" nos processos que lhes surgem. Os despachos estão pré-formatados e não raro chega-se aos debates instrutórios com os despachos já elaborados. Daí para a frente já não é com eles. Depois, é claro, sucedem-se tanto as absolvições em julgamento como as iníquas e vergonhosas condenações, apenas porque o inquérito foi mal dirigido, demorou demasiado tempo e a prova pertinente evaporou-se ou não foi sequer recolhida devido à burocracia. Os prejuízos são evidentes para todos.

O Ministério Público pode ficar desconfortável com a proposta de Noronha Nascimento mas ela é séria, justa, frontal e tem de ser ponderada desde já. Aliás, há um argumento decisivo que vai muito para além da boa vontade dos magistrados do MP: é que os resultados conhecidos nos processos mais mediatizados deixam muito a desejar. E quando os resultados são maus para todas as partes, a começar para a própria Justiça, aquilo que há a fazer é mudar, corrigir, alterar. E depois é deixar as coisas estabilizarem, as investigações prosseguirem os seus rumos, evitando-se as constantes mexidas na legislação. Mas para isso acontecer seria bom que pudesse ser feito por quem sabe, por alguém que vivesse no mundo e que não tivesse de descer à terra. Poupava-se no vaivém e dava-se descanso aos deuses e aos curiosos que puseram esta gaita de pantanas."        

Em 2010 também escrevi isto:

"Dizer nesta altura que tem os poderes da Rainha de Inglaterra não abona nada a seu favor. Quando muito será mais uma evidência sobre a necessidade de extinção da corporação que dirige e da sua premente substituição por uma nova que exerça de facto e de direito os poderes que a dele se mostrou incapaz de cumprir nas últimas três décadas.

Um desastre que demonstra bem o distanciamento da realidade em que vivem os seus membros."

E em 2011, na sequência de um evento onde participei, ainda escrevi isto:

"Ontem, em Faro, ao final da tarde, houve um debate sobre corrupção promovido pelo Correio da Manhã. Os debates prosseguirão pelo País. A corrupção também."

Antes, isto é, nas décadas anteriores, escrevi coisas parecidas.

Passados todos estes anos, conhecida a decisão instrutória do "Processo Marquês" não preciso de acrescentar grande coisa. Nada do que está a acontecer me admira.

Se as pessoas andassem atentas e se tivessem então indignado, promovido abaixo-assinados e exigido mudanças teriam sido poupadas ao espectáculo Sócrates/Marquês/MP/Ivo Rosa.

Era natural que um dia todos os anos de incúria, deixa andar e irresponsabilidade, cavalgados pelo populismo meditático, dessem resultados. Um dia o monstro teria de aparecer.

O juiz de instrução que, por uma vez, cumpriu o seu papel é o bode expiatório da podridão que grassa no sistema de justiça. E já grassava muito antes do biltre aparecer.

Mas nessa altura os Abrunhosas desta vida andavam ocupados a cantar, a fazer negócios, a gozar a vida nas praias e esplanadas, a enriquecerem.

Agora sabem todos de Direito. E indignam-se.

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corruptos

por Sérgio de Almeida Correia, em 30.11.20

"We were planning to build an above-ground high-speed railway, connecting the one from Zhuhai on the northern border, across the Macau city proper, to Taipa, connected to the one on Hengqin Island further to the western part of the Pearl River Delta. This project was shelved by the Chui Sai On administration, as it involved a lot of corruption and needed to be refurbished and restarted, in close cooperation with the authorities of the Great Pearl River Basin Area. It is easier to construct it now, since the PRC is very advanced in constructing such projects nowadays.

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pestilências

por Sérgio de Almeida Correia, em 29.07.17

HM-28-7-17-1.jpg

 (Publicado em 28/07/2017)

 

Não é que não haja outros assuntos, menos desagradáveis e menos mal cheirosos, a merecerem atenção, mas, já agora, na sequência da intervenção que anteriormente fiz sobre este assunto, convém deixar algumas perguntas. Pode ser que os responsáveis do Executivo, a Direcção dos Serviços de Protecção Ambiental (DSPA) ou, quem sabe, talvez o Comissariado contra a Corrupção (CCAC) – no cumprimento da sua missão de combater “firme e persistentemente a corrupção e a fraude“, fiscalizando os actos administrativos, bem como “a legalidade e a razoabilidade dos procedimentos administrativos, assegurando o estrito cumprimento da lei na actuação administrativa e salvaguardando efectivamente os direitos e interesses legítimos dos cidadãos” –, queiram interessar-se pelo assunto e se predisponham a encontrar respostas às questões que aqui coloco.

Anteontem, a TDM deu conta da conclusão dos trabalhos de substituição de uma conduta (ou seriam várias?) da ETAR de Macau, o que fez com que “as águas residuais fossem descarregadas sem tratamento” durante 24 horas.

Olhando um pouco para trás, verifica-se que em 20 de Abril de 2016 foi publicado, no Boletim Oficial n.º 16, pela DSPA, o anúncio público para o concurso de prestação de serviços de “Operação e Manutenção da Estação de Tratamento de Águas Residuais da Península de Macau”. O prazo para o contrato relativo a essa prestação de serviços seria de dois anos, isto é, entre 1/10/2016 e 30/09/2018.

Quer isto dizer, conclusão minha, que a substituição da conduta que agora teve lugar, e que obrigou à realização de descargas de muitos metros cúbicos (m3) de águas residuais sem qualquer tratamento, devia estar incluída nessa prestação de serviços. E chego a esta conclusão simplesmente lendo o programa do concurso, onde se podia descortinar o seguinte (sublinhados do signatário):

“1. Executar a O & M [Operação e Manutenção, em português] da ETAR da Península de Macau (incluindo a estação elevatória de efluentes líquidos da ETAR da Península de Macau) e de todas as suas instalações, equipamentos, peças de reserva e ferramentas, etc.;

Realizar as obras de reparação adequada dos edifícios e das instalações edificadas da ETAR da Península de Macau, incluindo mas não se limitando a: bocas de descarga dos tanques, plataformas de trabalho, escadas, escadas laterais, portas e janelas, vedação da ETAR, etc.;
Tratar as águas residuais brutas que entram na ETAR da Península de Macau; o volume de águas residuais que se submetam a processo de tratamento biológico (tratamento secundário) não pode ser inferior a 70 mil m3 por dia;
Descarregar o efluente tratado para os locais identificados pela entidade fiscalizadora. Além disso, na condição de que a qualidade dos afluentes atinja os requisitos projectados, o efluente resultante do tratamento biológico (tratamento secundário) deve estar em conformidade com os requisitos de descarga do efluente da ETAR da Península de Macau (vide IV. Ficha Técnica do Processo do Concurso);
Tratar os odores e gases gerados durante a operação da ETAR da Península de Macau (incluindo a estação elevatória dos efluentes líquidos da ETAR da Península de Macau); depois do tratamento a emissão de odores e gases não deve causar qualquer incómodo no meio ambiente vizinho e deve cumprir os requisitos de emissão dos poluentes atmosféricos no âmbito da ETAR da Península de Macau (vide IV. Ficha Técnica do Processo do Concurso);
Realizar o empacotamento dos sólidos, óleos e gorduras, e areais obtidos nas diferentes fases do procedimento do tratamento da ETAR da Península de Macau e transportá-los para os locais identificados pela entidade fiscalizadora;
Transportar as lamas desidratadas produzidas na ETAR da Península de Macau para a CIRS de Macau ou para os locais identificados pela entidade fiscalizadora (deve ser pago à entidade adjudicante 400 patacas por cada tonelada de lamas transportadas para a CIRS de Macau (…)…), o teor de sólidos das lamas deve estar em conformidade com os requisitos de qualidade (…)“.
Quanto a esta parte, tirando os “etc.”, que num programa de um concurso público devem dar imenso jeito, convém ainda tomar nota de que em relação a um pedido de esclarecimento apresentado nesse concurso por um concorrente, foi referido o seguinte:

“De acordo com os dados relativos às águas residuais apresentados entre 2011 e 2015, o volume de águas residuais submetidas ao processo de tratamento biológico (tratamento secundário) foi de 70 mil m3 por dia, pelo que o efluente pode atingir o padrão. No entanto, conforme os dados de águas residuais apresentados pela operadora em 2015 [quem são eles?] foi detectada uma redução do volume de águas tratadas no segundo semestre [é lá, “uma redução de volume“, o que é isto?; de quanto foi essa redução de volume?] e foram ponderados os princípios da imparcialidade e da boa fé assim como a fiscalização de cumprimento de obrigações contratuais pela empresa adjudicatária, pelo que, na condição de que o volume de águas residuais submetidas ao processo de tratamento biológico (tratamento secundário) seja de 70 mil m3 por dia e o efluente resultante desse tratamento não atinja o padrão, a entidade fiscalizadora terá uma comunicação estreita com a empresa adjudicatária antes de aplicar as respectivas sanções. Estas sanções só serão aplicáveis, caso seja verificado que a falta de padrão do efluente seja causada pela empresa adjudicatária, sem razão justificada.”

Agora vamos às dúvidas:

Quais foram os trabalhos de renovação e substituição que, em concreto, foram indicados pela entidade adjudicatária para serem executados durante a prestação de serviços? A substituição da conduta ou tubagens danificadas estava ou não contemplada na prestação de serviços deste concurso? Deviam ou não ter sido programadas pelos concorrentes desse concurso? Eram necessárias? Se eram, ficaram previstas e foram contempladas? E eram nessa altura também urgentes?
O que se fez desde o início desta prestação de serviços para se evitar a situação de ruptura a que se chegou? Porque não foi construída ao lado da estrutura danificada uma outra nova que a substituísse, e para onde fossem depois desviadas as águas, até a velha ser desactivada, de maneira a evitarem-se as descargas sem qualquer tratamento durante o tempo de reparação?
Qual a razão para que no programa do concurso se diga que o tratamento não pode ser inferior a 70 mil m3/dia quando aquilo que nos foi vendido pelos outros senhores, no tempo daquele general de cujo nome só os por ele condecorados ainda se devem recordar, se é que se recordam, foi a de que estaríamos perante uma estação de tratamento projectada segundo as normas europeias para tratar 144.000 m3/dia?
No prefácio do programa de concurso de 2016 refere-se que a ETAR de Macau recebe diariamente 180.000 m3 de águas residuais. É mesmo? Se só se tratam adequadamente 70 mil m3/dia (tratamento biológico), o que acontece aos restantes 110.000 m3? Alguém garante algum tratamento a estes 110.000 m3? Quem fiscaliza? Como?
Durante quantos dias, se é que houve algum, é que quem ganhou esse concurso cumpriu com as especificações contratuais desde 1/10/2016, nos termos que foram exigidos aos concorrentes, isto é, quanto aos 70 mil dos 180 mil que lá chegaram diariamente?
Qual a quantidade de m3 que efectivamente recebe o tratamento devido? Qual a quantidade que só é “passada por água”? Qual a que é descarregada sem receber qualquer tratamento? Quem deve responder pelos milhares de m3 que são despejados anualmente sem tratamento biológico adequado?
Estas obras foram, ou são para ser, pagas por quem? Estavam orçamentadas?
Ficou tudo resolvido? O que se vai fazer para se evitar que se repita?
Do que se viu e ouviu na reportagem da TDM, até pelas declarações daquele cidadão que diariamente vai fazer exercício físico na marginal, os cheiros e odores continuam, não havendo melhorias.

O actual Secretário para as Obras Públicas não tem que responder pelo que os antecessores fizeram, ou deixaram de fazer, penso eu, mas neste momento seria interessante saber para que serve a monitorização da DSPA, se depois não se tiver conhecimento dos resultados das análises que são feitas e não nos for dado um termo de comparação.

Quando eu faço análises ao sangue sei quais o valores que apresento e posso comparar com os valores normais que me são apresentados ao lado, na folha dos resultados, para saber se estou bem ou mal. É isso que também pergunto ao meu médico. Poder conhecer os resultados das análises, saber quais os valores-padrão adequados e depois poder comparar as análises de Macau com esses valores-padrão e com as que são feitas em ETARs idênticas na República Popular da China, era o mínimo exigível, sendo depois esses dados comparativos trazidos ao conhecimento público e levados ao conhecimento do governo central, para que este soubesse, com dados concretos, da qualidade de vida e do que é imposto à população da RAEM, em especial a que vive naquela zona da Areia Preta, com a gestão que tem sido feita da coisa pública pelos seus capatazes locais, um dos quais já a cumprir pena.

Dizem-me que quem construiu e andou ao longo de todos estes anos a fiscalizar o que se fez, antes e depois de 1999, continua por aí. Não me admira. Penso, no entanto, que a RAEM devia ter uma atitude mais exigente. A esses não deve nada.

E os cidadãos, os jornalistas, os deputados, todos deviam fazer mais perguntas para poderem cumprir com decência o seu papel. Porque com a saúde e os bens públicos não se brinca.

 

P.S. Espero que, a este propósito, o tratamento que tem sido dado à legionella – bactéria que aparece onde há falta de limpeza e de adequada manutenção – seja efectivo, e que o problema surgido há tempos num hotel/casino esteja totalmente debelado e a ser seguido. A pressão das autoridades sobre o proprietário do hotel/casino onde aquela foi encontrada deverá ser implacável, de maneira a que os cidadãos voltem a frequentar esse local com confiança e toda a segurança. Seria muito desagradável que o problema ainda não estivesse resolvido. Um surto de legionella não colocaria em causa apenas as instalações onde surgisse, mas toda a indústria do jogo pelas repercussões negativas que traria à RAEM, ao turismo e ao espírito de todos aqueles que estariam predispostos a visitar-nos. E, já agora, que tal as autoridades exigirem que as piscinas dos hotéis tenham chuveiros, em quantidade suficiente e localização estratégica, de maneira a que os seus utentes passem por lá antes de se atirarem para dentro de água com os corpos transpirados?

 

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submarinos

por Sérgio de Almeida Correia, em 19.12.14

optronics.jpgE ao fim de oito anos, aproveitando a quadra natalícia, o processo dos submarinos chegou ao fundo. Ao fundo não, ao fim, pelo que resulta do despacho de arquivamento do Ministério Público que a imprensa de hoje noticia. Ana Gomes já disse que não vai deixar morrer o caso. Eu acho muito bem. A pornografia, a obscenidade, a infâmia, nem sempre são evidentes. Neste caso foram tudo isso, o que se confirma pela confissão de impotência, e também de incompetência para investigar, de que o despacho é prova.

Eu, pelas minhas contas, verifico que também se ficou a saber que do dinheiro retirado aos bolsos dos portugueses para pagar os brinquedos, mais de 30 milhões seguiram para o estrangeiro, acabando pelo menos 27 milhões nos bolsos dos arguidos e membros do Grupo Espírito Santo. A estes espera-os uma consoada tranquila, aliviada, farta, onde em família poderão aquecer-se junto à lareira, empanturrar-se com iguarias e champagne, contarem anedotas sobre José Sócrates e Duarte Lima, enfim, gozarem com o regime e com a figura que o sistema judicial e os seus actores fizeram ao longo destes anos, antes de irem comungar à Missa do Galo.

E, imitando o seráfico sorriso de um conhecido ministro, poderão todos brindar junto a uma janela que espreite o Tejo, vislumbrando lá em baixo, a emergir do estuário prateado do rio, a silhueta de um periscópio. Alguém ajeitará então os botões de punho, comporá o nó da gravata, e sem tirar os olhos do horizonte dirá para consigo, repetindo baixinho, que os submarinos tiveram uma blindagem perfeita.

O segredo de uma corrupção intocável, de um tráfico de influências perfeito, de uma reforma tranquila, está no rigor da sua blindagem. Não há nada como o Natal em Portugal.

 

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