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Linhas em jeito de diário. Inspiração. Homenagem a espíritos livres. Lugar de evocação. Registo do quotidiano, espaço de encontros. Refúgio de olhares. Espécie de tributo à escrita límpida, serena e franca de Marcello Duarte Mathias.
Ontem teve lugar mais uma conferência de imprensa promovida pelo Centro de Coordenação de Contingência do Novo Tipo de Coronavírus dos Serviços de Saúde de Macau.
A extensão da denominação dessa entidade não tem correspondido às expectativas. E à medida que o tempo passa e a onerosidade das medidas vai agrilhoando muitos residentes, aumentam as injustiças e as dificuldades para quem, finalmente, pensava poder descobrir uma nesga de céu azul no húmido e pesado emaranhado de nuvens e poeiras que por aqui circulam.
Quando em Pequim e Hong Kong se levantam restrições, reduzindo-se períodos de quarentena e permitindo-se a entrada de estrangeiros, em Macau continua tudo aferrolhado com sete trancas. Uma espécie de colónia penal de luxo.
Se em Pequim a quarentena foi reduzida para dez dias, e em Hong Kong para sete dias, em Macau continuamos a ter catorze dias de quarentena e mais sete de auto-observação em casa. Um incompreensível sufoco.
Bem sei que a natureza dos talentos de Hong Kong e de Macau é diferente, mas será que o vírus que assintomaticamente, de quando em vez, vai aparecendo por cá também se apresenta de outra estirpe? E a variante que levou alguns ao Centro Clínico de Saúde Pública do Alto de Coloane em quê que difere do vírus que circula no Interior e na região vizinha? Será que os tempos de incubação do vírus em Macau são excepcionais? Mas então tudo isso é extraordinário.
Científica e politicamente as decisões dos SSM e do Governo de Macau, que aqui não pode ficar à margem em matéria de responsabilização pelos seu efeitos nefastos, não têm qualquer justificação.
Não se pode copiar Pequim e Hong Kong só quando se trata de aumentar os ónus sobre os residentes e de cercear os seus direitos, impondo-lhes sempre maiores encargos à custa de uma visão doentia da segurança nacional. É também conveniente manter igual coerência quando em causa está o alívio de restrições e o bem-estar das populações que sempre se souberam comportar e respeitaram escrupulosamente as directivas oficiais.
E depois, a talhe de foice, repare-se que durante dois anos houve muitos residentes que entraram e saíram de Macau, beneficiaram de quarentenas gratuitas, alguns mais do que uma vez, de testes gratuitos, em muitos casos podendo escolher hotéis. Agora, quem esteve em Macau durante mais de dois anos, se quiser sair este Verão, vai ter de fazer quarentena no Hotel Tesouro, se houver quarto na data do regresso. Se escolher o Art Regency vai te de pagar por inteiro a sua estada, quando o que faria sentido, pelo menos para quem nunca beneficiou de quarentena gratuita em nenhum dos hotéis que estiveram anteriormente disponíveis, era que para a primeira vez o residente também pudesse escolher. E se esse período não fosse gratuito, então que fosse dada a possibilidade de pagar apenas a diferença de custo entre os dois hotéis.
O sistema de marcação das quarentenas, por outro lado, está a funcionar muito mal. Não se compreende que não haja um local único na Internet para esse efeito, na própria página dos SSM, com ligação directa aos hotéis, facilmente acessível e de leitura fácil, sem ruído visual extra. E menos se compreende que não estejam sempre garantidos quartos para as quarentenas dos passageiros dos voos que chegarão a Macau, que se sabe antecipadamente quais serão e quantos passageiros trazem. Tudo isto devia ser mais fácil, menos burocratizado e mais transparente.
Está na altura do Governo de Macau, a começar pelo seu Chefe do Executivo, assumir alguma coragem e deixar de se refugiar no medo e na acomodação.
A política, tal como a vida, é feita de riscos. Em cada momento é preciso ponderar e decidir. Não se pode ficar eternamente à espera, nem desgastar irremediavelmente o terço até que um milagre aconteça. Não se podem ignorar os malefícios de tudo o que é excessivo em matéria de controlo do vírus e de quarentenas. Basta olhar para as falências, para o aumento do desemprego e a caminhada para o abismo de pequenas, médias e até algumas grandes empresas, para se perceber que convém fazer alguma coisa que se veja. A crise não se resolve com cartões de consumo, com vales de 250 patacas para os velhinhos que se vacinarem e autorizando-se meia-dúzia de empregadas domésticas a virem das Filipinas.
O futuro não espera. Constrói-se todos os dias. E muitas vezes chega antes do momento em que o aguardamos.