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Linhas em jeito de diário. Inspiração. Homenagem a espíritos livres. Lugar de evocação. Registo do quotidiano, espaço de encontros. Refúgio de olhares. Espécie de tributo à escrita límpida, serena e franca de Marcello Duarte Mathias.
O Campeonato Europeu de Futebol 2024 começou na Alemanha. A festa do futebol está de volta. Para todos.
Isto é, para quase todos em todo o mundo e em toda a China menos para os residentes de Macau.
Ainda há dias, com toda a pompa e múltiplos encómios, aliás merecidos, se celebraram os 40 anos da Televisão de Macau, enaltecendo-se o investimento realizado, a qualidade do trabalho produzido pelos seus profissionais ao longo dos anos e a importância que este teve, e continua a ter, para aproximar Macau da China e do mundo global.
Mas logo agora que começou o Campeonato Europeu de futebol, que milhares de adeptos viajaram de toda a China para a Europa e Alemanha para acompanharem os jogos ao vivo, que o turismo chinês para a Europa é impulsionado por esse evento, como também refere o Global Times, que centenas de jovens chineses seguem os jogos ao vivo com o apoio de empresas chinesas e que milhões vêem os jogos em directo na China, os residentes do Macau, que no discurso oficial são fundamentais no esforço patriótico de segurança nacional e no apoio ao desenvolvimento de Hengqin e da Grande Baía Macau/Hong Kong/Guangdong, são inexplicavelmente deixados à margem deste grande acontecimento mundial, impossibilitados de acompanharem os jogos, em directo ou em diferido, e nem sequer a pequenos resumos dos jogos têm acesso. Vergonhosamente, os principais telejornais da TDM limitam-se a apresentar fotografias dos jogos que vão ocorrendo quando referem os resultados dos que vão ocorrendo na secção desportiva dos noticiários.
Em Macau, quem queira ver os jogos do Euro 2024 não pode contar em nada com a TDM. Que, em contrapartida, transmite jogos da Liga Japonesa. Jogos do Euro 2024 em Macau, para quem conseguir ter acesso, só através do canal CCTV 5 da televisão chinesa. Ou através de esquemas manhosos via Internet e telemóveis. Na TDM, em canal aberto, nicles.
Todos os chineses e os portugueses residentes de Macau e fãs da Selecção Nacional e das estrelas portuguesas que iluminam relvados por todos os estádios do mundo com a sua classe e genialidade, nesta era da globalização e da meditização de tudo, ficaram arredados. E nem com a estupidificante RTP Internacional do Nicolau Santos podem contar.
É inacreditável como é que a TDM, que desde 1984, como há dias alguém lembrava, quando havia muito menos riqueza, transmite todos os jogos dos campeonatos da Europa de futebol, este ano ficou de fora.
O problema não será certamente financeiro. Se há dinheiro para a Administração andar a lançar foguetes, organizar festas, jantaradas e afins, também deveria haver para prestar serviço público a todos. Dos mais jovens, estimulando-os à prática desportiva e ao interesse pelo futebol, mostrando-lhes o melhor, para que aquele se possa desenvolver capazmente em Macau e na China, onde continua atrasadíssimo apesar dos investimentos milionários que já se fizeram, quer entretendo os mais velhos com algo mais interessante do que o seu triste dia-a-dia entre quatro paredes minúsculas num vigésimo andar da Areia Preta ou seguindo programas de propaganda avulsa e os "enlatados" para patriotas e broncos, como agora acontece com programas de debate futebolístico produzidos em Portugal, que já chegaram às emissões em horário nobre, transmitindo em diferido as elevadíssimas e importantíssimas discussões do "chuto-na-bola" em futebolês lusíada.
E se fosse preciso algum patrocínio para a transmissão dos jogos, certamente que teria sido fácil à TDM obter o apoio dos casinos ou de empresas chinesas, como a Fundação Macau, que subsidia tudo e mais um par de sapatos, o Banco da China ou o BNU, ou até a Alibaba, que também paga a David Beckham para promover o Euro 2024, tal como a Sands China lhe paga para promover o Londoner e os seus casinos, ou até a BYD dos automóveis eléctricos que levou mais de uma centena de miúdos chineses à Alemanha.
Em qualquer sistema decente, os responsáveis da TDM já teriam sido chamados à pedra por tão grande manifestação de incompetência e falta de patriotismo para com os residentes de Macau, deixando-os à margem de um evento com a importância desportiva do Euro 2024. Num sistema de natureza cacical e paroquial, que premeia o carneirismo, o espirito acrítico e cultiva a ignorância e o chico-espertismo, em lugar da ética, da inteligência e da responsabilidade individual, ainda havemos de os ver condecorados. É só uma questão de tempo.
Esta falha da TDM, que deveria valer um pedido de desculpas à população por parte dos polícias que nela mandam, gravíssima pelo grau de incompetência que revela e que seria impensável no tempo de Manuel Pires e antecessores, até faz lembrar os tristes episódios da contratação de professores não-residentes pela Escola Portuguesa de Macau.
A esperteza, a pesporrência e o talento só os inclinam para a asneira. E da grossa.