Voltar ao topo | Alojamento: Blogs do SAPO
Saltar para: Post [1], Comentários [2], Pesquisa e Arquivos [3]
Linhas em jeito de diário. Inspiração. Homenagem a espíritos livres. Lugar de evocação. Registo do quotidiano, espaço de encontros. Refúgio de olhares. Espécie de tributo à escrita límpida, serena e franca de Marcello Duarte Mathias.
À medida que avança o julgamento do caso de corrupção que sentou no banco dos réus dois ex-directores dos Serviços dos Solos, Obras Públicas e Transportes, nota-se o incómodo das instituições e dos seus titulares. Dir-se-ia mesmo que nesta terra quando as coisas não encaixam no guião se torna mais difícil acomodar os factos à realidade que se quer ver vingar.
Se já em Dezembro passado o Chefe do Executivo não autorizou a prestação de depoimentos por parte do seu antecessor e do Secretário para as Obras Públicas, o que não deixa de ser lamentável quando em causa está apurar a verdade dos factos e perceber quem está a mentir e até onde vai o manto diáfano da alta corrupção, agora foi a Assembleia Legislativa a obstaculizar ao depoimento do deputado Vong Hin Fai, a que se seguirá previsivelmente igual decisão quanto aos deputados Chui Sai Cheong e Chui Sai Peng.
Não deixa de ser curioso que haja tanta gente da mesma família a ser referida por vários intervenientes num único processo, de arguidos a testemunhas, e não haja um esforço mínimo de se apurar a razão ou sem razão da invocação, tantas vezes, desses nomes – que não são pessoas quaisquer –, preferindo-se deixar tudo na opacidade.
Seria, aliás, necessário esclarecer, posto que isso foi também referido na sessão de ontem do julgamento, que história é essa das listas VIP para aquisição de fracções autónomas com 40% de desconto que eram aprovadas pelo arguido Ng lap Seng.
Recorde-se que este arguido, anteriormente ligado a diversos projectos imobiliários de grande envergadura, parceiro de negócios de alguns outros "tubarões" de Macau, financiador da Fundação Mário Soares, esteve preso durante largo tempo nos Estados Unidos da América exactamente por razões que se prendem com práticas corruptivas.
Saber até onde chegam as suas ramificações, até onde vão os tentáculos do polvo e dos seus parceiros de negócios, quais as razões para a existência dessa lista VIP, quem lá estava e porquê, é assunto de manifesto interesse público.
Qualquer residente de Macau gostaria de ter adquirido, de forma limpa, um apartamento, ou vários, no edifício Windsor Arch com um desconto de 40% e isenção do pagamento de condomínios.
O escandaloso património imobiliário que algumas pessoas "amassaram" em Macau nas últimas décadas devia merecer outra atenção de quem tem por obrigação combater a corrupção, defender a legalidade, o bom nome das instituições e fazer justiça. Já bastou o que se passou no tempo da administração portuguesa com alguns "servidores" públicos.
O que se está a passar agora ultrapassa todos os limites, e é muito mau para quem vê o seu nome referido nos julgamentos em curso e não tem oportunidade de se defender. Mas é também mau para os arguidos e para as testemunhas, perante os quais parece que alguns partem do pressuposto de que nunca falam verdade; como ainda é mau para a justiça que se quer fazer e que se pretende que seja acima de tudo independente, transparente, imparcial e justa, mas é particularmente mau para a dignidade das instituições e o bom nome da RAEM, dos seus dirigentes e da República Popular da China que é quem tem, em última análise, a maior responsabilidade sobre os escândalos de Macau que envolvem dirigentes políticos e altos funcionários da Administração.
Não se percebem quais os receios do Chefe do Executivo e da Assembleia Legislativa para se impedirem os depoimentos dos visados.
Isto está tudo a cheirar demasiado mal há muito tempo e não é só por causa da ausência de uma política ambiental séria e da falta de tratamento adequado dos resíduos líquidos e sólidos.
De um charco saem todos enlameados. Os limpos, os sujos e as instituições.