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Linhas em jeito de diário. Inspiração. Homenagem a espíritos livres. Lugar de evocação. Registo do quotidiano, espaço de encontros. Refúgio de olhares. Espécie de tributo à escrita límpida, serena e franca de Marcello Duarte Mathias.
(créditos: Miguel Lopes/LUSA)
No fantástico ambiente da catedral da Luz, jogou-se ontem em Lisboa mais uma partida memorável da edição 2024/2025 da Liga dos Campeões. Benfica e Barcelona apresentaram-se em grande forma para proporcionarem um espectáculo memorável aos mais de 63 mil espectadores que encheram as bancadas.
Logo aos dois minutos, quando Pavlidis fez o primeiro golo a favor do Benfica, se percebeu que os encarnados tinham quase tudo para brilhar e ficarem com os três pontos, mas uma noite que começou por ser de sonho acabaria por se tornar numa montanha-russa que virou pesadelo.
Houve emoção, bom futebol, erros infantis, jogadas incríveis, nove golos, três penáltis, um inexistente, outro que ficou por marcar ao cair do pano e que daria origem à jogada do último golo do Barcelona, o que lhe daria a vitória.
É verdade que as substituições aos 70 minutos correram muito mal, que Aursnes falhou o 5-3, que Di Maria fez o mais difícil quando desperdiçou o 5-4, que o penálti provocado por Tomás Araújo é um erro inaceitável, que Carreras, Florentino, Otamendi e Schjelderup fizeram um jogo irrepreensível, que o Barça tem uma grande equipa do meio-campo para a frente. Porém, a verdade maior é que não nos podemos queixar da sorte. Em matéria de futebol tivemos tudo para ganhar e falhámos por culpa própria em momentos cruciais.
Que o árbitro prejudicou o Benfica também não há dúvidas, bastando ler o que diz a imprensa, dentro e fora de portas, quer quanto ao penálti assinalado a favor dos catalães, que dá o 4-3, quer em relação ao penálti cometido sobre Leandro Barreiro e que ficou por marcar no último minuto.
Em todo o caso, para os anais fica o resultado. Depois do que aconteceu com o Bayern, com o Feyenoord e com o Bolonha nesta edição da Liga dos Campeões, repetiram-se alguns erros infantis e foram tomadas más decisões que não podiam ter acontecido e nos retiraram o apuramento directo.
Por agora, resta dar os parabéns ao Barcelona, que ontem teve a estrelinha, continua a ser uma grande equipa e um colosso europeu, e esperar que o Benfica faça, em 29 de Janeiro, uma grande exibição em Turim, no Stadio Delle Alpi, rebaptizado de Allianz Arena, contra a Juventus. Uma exibição que ofereça a todos os benfiquistas e aos amantes de futebol a possibilidade de esquecerem o pesadelo da noite de ontem.
Já aqui tinha chamado a atenção para a falta de racionalidade e ausência de transparência do negócio das flores que há anos é conduzido pelo IAM.
Esta tarde, pouco antes das 15:00, ao atravessar um dos jardins do NAPE, mais concretamente no Parque Dr. Carlos D' Assumpção, do lado oposto ao Centro Unesco, pude de novo observar a destruição de plantas recentemente colocadas, em perfeitas condições, que eram violentamente arrancadas pela raiz e enfiadas em sacos de lixo, o que pode ser documentado pelas fotografias que tirei quando ali passava.
Trata-se de um fenómeno que se repete com uma regularidade impressionante sem que se questione a sua razão, o seu custo e quem são os beneficiários deste negócio.
Em qualquer parte do mundo há jardineiros que cuidam das plantas. Na China também. Por que motivo em Macau os jardineiros não cuidam das plantas e o IAM prefere que as arranquem à terra, dos canteiros onde estão, para deitá-las fora? A quem serve este negócio?
Estas e outras questões podiam ter sido colocadas pelos jornalistas da TDM ao tal Tavares, que deixou o IAM, e a quem foram dadas horas de emissão nos últimos dias para se auto-engrandecer, como se tivesse deixado alguma obra que se visse, em vez de lhe perguntarem qual a razão para o problema dos ratos se ter agravado – motivando intervenções de preocupação por parte de residentes e de membros de entidades da sociedade civil –, sobre o estado nojento dos passeios, para que esclarecesse o motivo para ter estado tantos anos à frente do IAM e reformar-se sem que aqueles sejam regularmente lavados, e com produtos desengordurantes e desinfectantes, como sucede em muitas cidades, ou nos elucidar sobre as razões para os caixotes de lixo estarem sempre abertos, de Inverno ou de Verão, assim como os contentores, e para as esfregonas nojentas e caixotes de lixo continuarem espalhados pelas arcadas de prédios e nos passeios, e por aí fora.
Vejam, por exemplo, o que também acontece na Taipa, o estado deplorável em que está aquele inexplicável depósito de caixotes de lixo, imundos, mesmo em frente do parque de estacionamento junto ao edifício do antigo Jockey Club, numa zona residencial e de comércio, que ainda há dias (domingo, 12/01/2025, pelas 13:30) apresentava o aspecto que as imagens documentam, com os passeios sujos, gordurosos, e de onde saía um cheiro acre e nauseabundo. Para Centro Mundial de Turismo e Lazer não está nada mau, como podem ver pelas imagens que aqui deixo e que se repetem em muitos outros locais da cidade e das ilhas.
Aliás, foram tantas as peças, os anúncios da entrevista que fizeram ao tal Tavares, os excertos, as repetições na rádio e na televisão, que dir-se-ia que a TDM lhe estava a dever alguma coisa e se sentiu na necessidade de pagar na hora da reforma.
Sobre o que deviam ter perguntado zero. O que, obviamente, permitiu ao entrevistado mostrar a vacuidade do discurso e desfiar um rol de banalidades sobre a sua vida de funcionário, como se isso interessasse a alguém, para além da própria TDM.
Começa mesmo a ser penoso ver a forma como alguns actores são tratados.
Outro exemplo é o do presidente da Fundação Escola Portuguesa de Macau que se queixa do tempo de antena que dão aos outros quando ele próprio está diariamente na rádio e na televisão. A TDM entrevista-o com uma regularidade impressionante, normalmente durante longos períodos, onde o deixam perorar livremente, sem qualquer contraditório, e depois passam a entrevista, na íntegra e retalhada em múltiplas peças, todos os dias, no telejornais e nos noticiários, de manhã, à tarde e à noite, repetindo os excertos até à exaustão, para assim fazerem render o peixe.
E os entrevistadores agradecem compungidos as graças e as boutades das sumidades.
De quando em vez lá vem uma ou outra nota, ou um comunicado, como ontem sucedeu com a APIM, a esclarecer a opinião pública sobre o que o entrevistado disse a propósito da concessão do terreno da Escola Portuguesa. Mas no momento em que as declarações foram prestadas e antes de as enviarem para o ar não terá havido a preocupação de ouvir as opiniões de outros interessados. E é pena porque a TDM, apesar das recentes "deserções", ainda tem lá gente capaz, profissional e que sabe fazer reportagens com interesse sobre assuntos pertinentes e actuais. É só deixá-los fazer o que sabem.
Quanto ao mais, ao que verdadeiramente motivou estas linhas, isto é, quanto às plantas dos jardins e parques de Macau, o Chefe do Executivo devia mandar fazer uma auditoria à gestão do IAM sobre este pelouro. E ele próprio devia prestar atenção à forma como são destruídas plantas nas imediações do Palácio da Praia Grande, inquirindo sobre a sua real necessidade, as vantagens da sua destruição (eu podia abrir um negócio e criar mais uns quantos empregos na RAEM se me derem as plantas que destroem), os inconvenientes da sua manutenção, os custos para o erário público e as alternativas.
É lamentável que a TDM perca tempo com banalidades e lugares-comuns, a "encher chouriços", a escutar nulidades e gente que nada tem para dizer, e a agradar aos amigos de alguns, em vez de fazer jornalismo de investigação a sério para não incomodar os maus régulos e piores sobas, de duplas e triplas nacionalidades, que o colonialismo aqui deixou, e que o mau patriotismo, interesseiro e comprometido com muitas décadas de roubalheira, cambalachos e péssimas práticas acolheu e autorizou, não inocentemente, que continuasse a medrar. Para prejuízo de Macau e das suas gentes.
Os Serviços de Saúde Macau (SSM) têm vindo a alertar para o aumento de casos de gripe, na linha do que também aconteceu no interior do país, esclarecendo que a taxa de positividade dos testes já atingiu 15%. Por esse motivo aumentou o número de doentes com sintomas gripais, em especial na pediatria, com 15,6 casos por cada 100 utentes, reflectindo um aumento de 23%. Há, pelo menos, quatro casos de infecção colectiva envolvendo escolas e jardins de infância, e casos graves de doentes que evoluíram para complicações mais severas, incluindo pneumonia.
Os SSM recomendaram, e bem, que as pessoas se vacinassem, o que no meu caso aconteceu já há mais de dois meses. Mas, curiosamente, uma vez mais a falta de sentido da recomendação e a discriminação em relação aos não-residentes assume contornos bipolares.
São os não-residentes, vulgo blue cards, que desempenham as tarefas mais mal remuneradas da RAEM, os que têm acesso a menos benefícios, os que cuidam diariamente das crianças, dos idosos e dos animais domésticos dos residentes, os que mais horas passam em casa destes contribuindo para o seu bem-estar, os que garantem a segurança de casinos e hotéis. E são os trabalhadores não-residentes os que mais expostos estão aos vírus trazidos por quem vem de fora.
Os SSM esclarecem, inclusivamente, que “a urgência de vacinar não pode ser subestimada, uma vez que a gripe, a associada a complicações respiratórias, pode resultar em internamentos prolongados e, em caso extremos, em óbito.”
Pois são exactamente os não-residentes quem tem de pagar MOP$95,00 pela vacina, visto que só os residentes gozam acesso gratuito a esta. No ano passado, situação semelhante verificou-se com a vacinação da monkeypox (varíola dos macacos), embora esta esteja em causa em relação a grupos muito específicos.
É mais uma decisão que radica na falta de vistas, visto que se estas pessoas não se forem vacinar, por insuficiência de meios ou por considerarem a vacina cara para as suas posses, o que será perfeitamente normal atendendo ao que normalmente auferem, os prejuízos que causarão aos seus empregadores, aos familiares dos residentes que não estejam vacinados e à própria RAEM, durante o período em que não poderão dar o seu contributo laboral por estarem doentes, será muito mais elevado do que o custo da vacina que lhes está a ser pedido.
Com a agravante de que estando mais expostos ao vírus também serão fonte de transmissão mais rápida para todos os residentes não vacinados e mais atreitos ao vírus, potenciando o aumento do número de infecções entre os locais e a pressão sobre os hospitais e centros de saúde.
E como se mais essa aberrante discriminação contra os não-residentes não bastasse, repare-se que o serviço de vacinação de não-residentes só pode ter lugar, pagando as tais MOP$95,00, no Hospital de Kiang Wu e na Clínica dos Operários, instituições privadas, quando o correcto seria que a vacinação estivesse disponível em qualquer hospital ou centro de saúde público.
É mais uma inexplicável benesse, ou negociata, não sei qual a razão, a favor de instituições privadas que recebem vastos subsídios públicos. Se os desgraçados têm de pagar para ser vacinados, então que possam escolher entre o privado e o público.
É mais uma decisão pouco patriótica, um caso de verdadeira exploração capitalista sem escrúpulos dos desvalidos da vida e de quem trabalha numa região que se quer aproximar cada vez mais das políticas do Governo Central.
De nada lhes serve estudar os discursos do Presidente Xi porque essa aproximação continua a ser só no que lhes dá jeito. Seja nesta matéria, no que diz respeito à emissão de atestados médicos em caso de doença, em relação aos direitos laborais, em que muitos continuam em pleno século XXI, vinte cinco anos depois do fim da "exploração colonial", a ter apenas 6 ou 7 dias úteis de férias – uma vergonha em qualquer sociedade decente, mesmo de raiz capitalista, e para qualquer empregador que se dê ao respeito – ou em matéria de feriados e dias de descanso compensatórios, continua a discriminação entre residentes e não-residentes, entre trabalhadores do sector público e do sector privado.
Não gostam do que lêem em relatórios de organizações internacionais, mas pouco ou nada fazem para mudar. Em alturas como estas é que se vê bem como pensam e como não estão disponíveis para alterar as coisas. Não se poderão queixar.
(créditos: daqui)
Reza a sua biografia que nasceu na Póvoa de Varzim em 25 de Novembro de 1845, vindo a falecer em 16 de Agosto de 1900 em Neuilly-sur-Seine, nos arredores de Paris. Da sua obra literária e carreira profissional muito se estudou, disse e escreveu. Os livros, as biografias, os artigos académicos estão aí para quem os quiser ler e ilustrar-se. A sua escrita, pela sua clareza, rigor, simplicidade, elevação estilística, estética e elegância, entre muitos outros atributos, constitui indiscutível património da língua portuguesa, dos portugueses, dos falantes daquela, constituindo os seus livros, crónicas, artigos, cartas, testemunho intemporal da sua magistralidade.
Após o seu decesso, em França, era natural que o seu corpo fosse transportado para Portugal e aqui viesse a ser sepultado, o que efectivamente aconteceu depois do seu cadáver ser levado para o Havre, de onde o embarcaram no África, a 13 de Setembro de 1900, para aportar a Lisboa em 17 de Setembro.
Chegado à capital portuguesa, aquilo que fora o Eça físico, mereceu umas segundas exéquias fúnebres. O seu corpo foi passeado por Lisboa entre o Terreiro do Paço e o Alto de S. João, num cortejo acompanhado por dezenas de carruagens, para que todos lhe pudessem prestar as devidas homenagens. Dar-lhe-iam, então, nesse local uma morada que se suporia definitiva. Não foi isso que aconteceu.
Em 1989, dado o estado de degradação do jazigo onde fora largado, acabaria por ser despejado do cemitério do Alto de S. João e remetido para um jazigo familiar em Santa Cruz do Douro, decisão que fazia todo o sentido, para ser colocado junto dos filhos e outros familiares, e que só não mereceria acolhimento, ainda assim, se com uns e outros estivesse desavindo.
Contudo, o sossego não lhe chegaria. E como bem recorda o queirosiano Gonçalves Guimarães, depois transcrito no Tempo Contado de Rentes de Carvalho, que neste pequeno resumo sigo, “Eça tem passado a morte a ter, de vez em quando, um funeral”.
E eis que em 2021 se apresentou uma proposta na Assembleia da República – em que outro lado poderia ser acolhida ideia tão genial dos proponentes se “a deputação é uma espécie de funcionalismo”, “é uma colocação, é um emprego”, lugar onde se ressona? – que viria a ser aprovada por unanimidade, pese embora a ausência do deputado do Chega, determinando “que os seus restos mortais de novo regressassem a Lisboa e fossem depositados no Panteão Nacional”.
Como houve quem, com toda a legitimidade, não concordasse, o assunto acabaria por ser discutido em tribunal, enquanto lá onde estiver a alma do escritor comentará, certamente com indisfarçável perplexidade e fina ironia, as discussões entre os descendentes, as voltas em que os seus restos se meteram, as burocracias, despesas e pregações que originou, para além do aproveitamento político dos faxineiros de serviço, mais de cem anos volvidos sobre a sua morte.
O facto de Eça já ter tido mais funerais que a rainha D. Maria II, tanto mais que não sou monárquico, em nada me aflige, concordando plenamente com a dúvida que se levanta, como republicano, sobre se tanto funeral acrescentará alguma coisa à obra do escritor.
Esta última pergunta encontra resposta no artigo que a revista Visão publicou esta semana, a propósito de mais este “funeral”, anunciando um trabalho sobre “[o] escritor que viveu acima das suas possibilidades”, com o título sugestivo de “A vida privada de um génio”.
O autor, certamente bem intencionado, cometeu inclusivamente a proeza de nos trazer um Eça especialista em bricolage que fazia “pequenos concertos [sic] e pinturas em casa”, façanhas que a revisão deixou escapar, coisa de somenos, num trabalho sobre o escritor e que passariam seguramente despercebidas aos leitores não fosse ter-se dado o caso daquele trazer informação sobre as suas “roupas extravagantes e impecáveis, as viagens exóticas, os hotéis mais luxuosos, os grandes jantares com os amigos, as mulheres proibidas e as mais fáceis”, para além de nos dizer que o defunto, embora ganhasse bem, vivia acima das suas possibilidades, porque "gastava ainda mais, acumulava dívidas, pedia dinheiro e favores”, acabando por colocá-lo num patamar, pelo prisma em que o considera nos hábitos, gostos e vícios, equiparado ao de alguns ex-governantes que ainda há pouco viviam a expensas de amigos, fundações e empresas públicas, e que se o não deixassem à porta de uma qualquer taberna em Baião, seguramente que não lhe franqueariam a entrada como português ilustre no edifício do Campo de Santa Clara.
Destarte, o Supremo Tribunal Administrativo, não conseguindo apurar a vontade do falecido, acabaria por resumir o conflito a uma disputa entre bisnetos, uns a favor, outros contra.
Desconheço o que poderia Eça pensar da iniciativa dos senhores deputados, do artigo da Sábado, do acórdão do STA, nem desta disputa familiar, em que todos, justiça lhes seja feita, pretendiam defender, e aí todos concordaremos, a obra, a memória e a dignidade do escritor.
Como cidadão, atendendo aos que já foram repousar para o Panteão Nacional, e aos que hoje fazem o seu caminho, preferiria que tivesse sido seguida solução idêntica à de Camões, de D. Nuno Álvares Pereira, de Afonso de Albuquerque, de Pedro Álvares Cabral e do Infante D. Henrique, com uma "solução memorial apenas evocativa (...), sem a presença física dos restos mortais". Se ainda for verdade que um dia todos seremos cinza e pó, para quê o flagelo da perpetuação sucessivamente encenada?
Concluída mais esta aventura, no meio de tanto forró à custa do Eça, temo que esta não tenha sido a última trasladação. Esse é o meu principal receio num país em que as mediocridades disputam ombro a ombro a liderança de minorias conjunturais.
E, pior que isso, que o drama deste exercício se repita tão logo o Panteão Nacional, que entretanto albergou eventos gastronómicos e de moda, se comece a tornar pequeno para acolher tantos portugueses, uns mais génios do que outros, com ou sem descendência conhecida, mas aos quais nem depois de mortos lhes é garantido pela República, já nem digo pelo bom senso que tão arredio anda, o direito fundamental ao sossego do seu cadáver, das suas ossadas, ou do que restar de ambos. Para gáudio e conforto dos vivos transitórios. Cento e vinte cinco anos depois é obra.
(créditos: Ponto Final)
De repente, parece que tudo começou a mudar. Milagre, dir-se-á.
Nos últimos anos, em múltiplas ocasiões, chamei aqui e noutros locais a vossa atenção, inclusivamente com publicação de fotografias, para a proliferação de roedores e a falta de limpeza da cidade, notando a desatenção do IAM e dos seus responsáveis para com a situação.
Aparentemente estava tudo em boa e devida ordem, de tal forma que o ex-presidente daquela instituição até tinha tempo para se dedicar aos assuntos eleitorais, e outros prestaram tão bons serviços que foram recompensados com promoções.
Digo aparentemente porque desde há dias surgiu na comunicação social um conjunto de situações que não são novas, não correspondem a novos problemas e que saltaram para as primeiras páginas das notícias. Porquê só nesta altura?
O problema dos ratos tem vindo a agravar-se. O IAM nunca lhe deu a devida atenção, pois que de outra forma não se teria chegado à presente situação. O encerramento de três estabelecimentos de uma cadeia de supermercados em Macau, na Taipa e em Coloane, para além de um restaurante na Rua de Entre-Campos, mostram que não se trata de um problema pontual e localizado.
Os ratos estão espalhados por toda a cidade e ilhas. Do Porto Interior a Coloane, passando por edifícios residenciais e nas imediações de hotéis e restaurantes. Já perdi a conta às vezes que referi esses casos e a quantidade de ratos que vi circularem livremente às mais variadas horas do dia, até em dia de Grande Prémio, passeando-se ao sol nas imediações do Sands e por todo o NAPE.
Em Maio de 2022, neste mesmo blogue, escrevi o seguinte:
"Muitas vezes me tenho insurgido contra a falta de higiene urbana da cidade onde vivo, chamando inclusivamente a atenção para a quantidade de roedores à solta pela RAEM, da cidade velha ao NAPE, da zona dos lagos Nam Van ao Lilau e a Coloane.
Para o IAM, que se limita a distribuir ratoeiras pela cidade, de onde os ratos entram e saem alegremente, e que deixa os contentores de recolha de lixo abertos, de onde muitas vezes sai um cheiro nauseabundo e escorrem líquidos pestilentos para os passeios, como aqui ao meu lado no NAPE, parece que tudo isto é normal.
Com tantos alertas, e com o tifo entre nós, alguém deverá começar a tomar medidas a sério e avisar o impante líder (pode ser que ele se chegue à janela) de que está na hora dos seus serviços fazerem alguma coisa em matéria de higiene urbana."
É claro que nada aconteceu, continuou tudo bem e os ratos foram-se multiplicando. No final, o Secretário para a Administração e Justiça até louvou o ex-Presidente do IAM. Sobre a imundície urbana que permanece, espelhada na proliferação da rataria, não houve uma palavra.
E como se não bastasse andar a rataria a banquetear-se nos supermercados, mudou o Chefe do Executivo e logo se descobriu que o crédito mal parado atingiu o valor mais alto dos últimos 20 anos, que a "ligação errada de esgotos e tubagens de escoamento de águas residuais está a gerar mau cheiro na Areia Preta", que "há lacunas no cuidado prestado a doentes com cancro e a sobreviventes da doença em Macau", que os casos de gastroenterite não param de surgir e de aumentar, tal como os de salmonella, sendo que muitos destes aconteceram a partir de Agosto pp., afectando creches e outros estabelecimentos de ensino.
Estes são problemas que incomodam todos os residentes, que dão péssima imagem da RAEM, e que não podem continuar a ser sistematicamente desvalorizados e ignorados por quem manda. Porque se não o fossem não seriam tão recorrentes apesar de ser cada vez maior o número de louvores.
Não há desculpa para a má gestão, para a falta de higiene urbana, para o funcionamento deficiente das redes de esgotos e de tratamentos de águas residuais, para tantos casos de gastroenterites, em especial afectando crianças, quando recursos não faltam e muitos foram generosamente pagos para resolverem esses problemas, embora pouco ou nada tivessem feito.
E é bom que não se perca tempo e que se responsabilize rapidamente quem tem de ser responsabilizado.
(créditos daqui)
Está a começar um novo ano. Macau tem um Chefe do Executivo e um novo Governo que foi empossado há dias pelo Presidente Xi. Muitos dos que residem na RAEM lutam diariamente por contribuir para a melhoria das suas condições de vida e darem o seu contributo à região.
Todos sabemos qual o peso dos lobbies e dos grupos de interesses nesta cidade, mas é preciso que cada um de nós contribua, de algum modo, para que as coisas melhorem.
Entendi, por isso mesmo, iniciar aqui, regularmente, uma coluna de ideias exequíveis para que o Governo da RAEM possa constituir um exemplo de verdadeira e efectiva boa governação.
A primeiro sugestão que aqui trago vem do Luxemburgo. País pequeno, menos populoso que Macau, constituindo uma democracia parlamentar numa monarquia constitucional, no coração da Europa, onde vivem dezenas de milhares de portugueses.
Pois bem, o Luxemburgo tem apenas um único casino autorizado a funcionar, o Casino 2000, em Mondorf-les-Bains. Em 2023, as receitas do jogo no Luxemburgo ascenderam a pouco mais de 24,2 milhões de Euros, que equivalem, grosso modo, ao câmbio do dia, a pouco mais de MOP$200 milhões de patacas. Um número rídiculo para Macau.
O que há aqui de especial é que nesse pequeno país, de pouco mais de 500 mil habitantes, todos os transportes públicos, sim, leram bem, todos os transportes públicos (autocarros, metro ligeiro e comboios) são inteiramente gratuitos tanto para residentes como para turistas.
Em 6 de Dezembro de 2018, o jornal New York Times anunciou a intenção do Governo luxemburguês, pela voz do primeiro-ministro Xavier Bettel, de ser o primeiro país a oferecer transportes públicos gratuitos face ao número crescente de automóveis privados em circulação (662 por cada 1000 habitantes).
Dois anos depois, em 29 de Fevereiro de 2020, quando a pandemia do Covid-19 se instalou em todo o mundo, o Luxemburgo concretizou esse objectivo e desde então todos os transportes públicos são gratuitos.
Em Belgrado, na Sérvia, solução idêntica entrou ontem, 1 de Janeiro de 2025, em vigor. Em Canberra, na Austrália, está-se a pensar no assunto.
Ora, se o Luxemburgo, sozinho, conseguiu fazê-lo, por que razão a RAEM, que ainda por cima conta com o apoio do Governo Central, não pode seguir o mesmo caminho?
Há quem em Macau se preocupe com a construção e gestão de cidades inteligentes e amigas do ambiente e pode-se sempre aprender alguma coisa com a experiência luxemburguesa.
Há cada vez mais carros a circular em Macau. Muitos chegam de fora, com condutores que não sabem conduzir e que se limitam a deslocar os veículos de um ponto para outro sem cuidarem das regras estradais vigentes na RAEM. O número de acidentes continua a crescer; o de vítimas também, que pode ser qualquer um de nós, como ainda há dias se viu com uma alta funcionária do Governo, pessoa estimada e, ao que me dizem, servidora pública exemplar.
O que pergunto é se não será possível, com as verbas astronómicas que os casinos pagam à RAEM, encontrar para Macau uma solução semelhante à do Luxemburgo e de Belgrado?
Não seria possível ao Governo de Macau arranjar vontade política e mandar alguém ao Luxemburgo para lhes perguntar como é que por lá fizeram, quanto custou e como conseguem manter esse sistema que não discrimina residentes de não-residentes e turistas?
Talvez – já que nem um serviço de táxis decente para toda a população e os turistas os dois últimos Chefes do Executivo conseguiram concretizar em 15 anos! – o novo Chefe do Executivo, Sam Hou Fai, e a sua equipa possam pensar neste assunto.
Estou certo de que se solução idêntica à do Luxemburgo fosse transportada para Macau ficaríamos todos a ganhar, aliviando a cidade de muitos veículos, dando menos trabalho aos senhores polícias, e, em especial, contribuindo para reduzir os elevadíssimos níveis de poluição atmosférica da RAEM, cuja qualidade do ar nos últimos dias, desconheço se em razão da saída de Raymond Tam da Direcção dos Serviços de Protecção Ambiental, passou a ser sistematicamente insalubre, de acordo com a classificação adoptada pelas próprias autoridades locais, não sendo recomendadas actividades ao ar livre.
Não há que ter medo de fazer de Macau uma cidade melhor para viver. Fundamental, como diz um amigo, é acabar com a "bandidagem".