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mudanças

por Sérgio de Almeida Correia, em 23.08.24

IMG_9532.jpg(créditos: Macau Daily Times

A demora foi previsível. Era preciso aguardar.

Quinze anos de más políticas e de decisões muito discutíveis, contínua protecção das castas familiares, muitos tiros em falso, um concurso para atribuição de novas concessões de jogo bastante atribulado, pouco transparente e cujos detalhes da decisão e das condições acordadas entre a RAEM e os concessionários são ainda desconhecidos da população, no que se afastou a prática anterior nessa matéria, somando-se aos inúmeros problemas em matéria de obras públicas, nalguns casos mesmo antes das obras serem inauguradas, crédito mal parado em dimensões jamais vistas, atrasos em projectos cruciais para o desenvolvimento da RAEM, obrigados a avançar ao fim de anos por pressão externa, muitas opções contraditórias e incompreensíveis, como foi a anterior renovação da concessão do Macau Jockey Club, e imensa dificuldade em ir até ao osso no combate à corrupção, eram sinais há muito presentes e que apontavam na direcção da mudança.

Mas havia ainda quem persistisse em acreditar que o actual Chefe do Executivo teria condições para se voltar a apresentar perante a Comissão Eleitoral que irá escolher a próxima pessoa que será colocada ao leme da RAEM.

Após um período de contenção de danos (imensos e aos mais diversos níveis) herdado do antecessor, ultrapassada a pandemia, a que se juntava a debilitada condição de saúde para quem ainda nem sequer franqueou a porta dos setenta anos, tudo apontava para um cenário de afastamento de Ho Iat Seng.

Os interesses de Macau, da sua população e da China falaram mais alto. 

Se há que cortar a direito, levar até ao fim as operações de limpeza do mundo e submundo do jogo, combater o tráfico de influências, controlar a fauna dos casinos e modernizar a administração pública afastando resistências, então isso terá de ser feito por quem não seja tributário do empresariado local, das famílias da terra e das impreparadas, cínicas e acomodadas elites locais. E que ao mesmo tempo possua preparação académica, experiência profissional e de vida, uma visão para Macau consentânea com os desígnios do PCC e a vontade do Governo Popular Central, quer em relação às questões da Segurança Nacional quer quanto à aplicação do princípio “um país, dois sistemas”, e seja patriota.

Neste cenário, seria mais do que evidente que o nome de Sam Hou Fai, presidente do Tribunal de Última Instância (TUI), surgiria inevitavelmente como potencial candidato a Chefe do Executivo.

O actual presidente do TUI, embora faça franzir alguns sobrolhos, tem todas as aptidões e condições para dar resposta às exigências de Pequim, fazendo o que está por fazer e os residentes esperam que seja concretizado pelo menos há quinze anos.

Este foi o tempo que se perdeu em matéria de reformas fundamentais para o desenvolvimento da RAEM, de combate a fundo à corrupção e para incremento da diversificação económica, da redução do peso dos casinos e melhoria da qualidade de vida dos residentes.

Posto isto, Sam Hou Fai tem a vantagem de ter formação jurídica, o que é fundamental quando se quer que tudo seja feito de acordo com a lei, qualquer que seja a interpretação que desta se faça. E o não ser polícia, nem ter por hábito comportar-se como tal, é importante quando se quer passar uma mensagem de esperança à população sem partir a louça, afastar o investimento estrangeiro e arruinar a imagem internacional da região. Veja-se o caso de Hong Kong.

Não há por isso muito a ponderar após a manifestação de interesse do protocandidato. O seu nome passará facilmente pelo crivo da Comissão de Defesa da Segurança do Estado.  Os discursos do senhor presidente do TUI nas sessões solenes de abertura do ano judiciário já contêm um embrião de programa de governo, não se mostrando difícil perspectivar o seu sentido patriótico, o que pensa e o que aí vem.

Não auguro, apesar do seu reconhecido bilinguismo e apurado sentido da língua portuguesa, ao contrário dos seus antecessores, um aprofundamento da presença do português nos tribunais e na administração pública, embora se me afigure que o diálogo será certamente mais fácil com os seus interlocutores portugueses.

Em matéria de obras públicas, os patos-bravos, fiscais de obras, angariadores e comissionistas terão de se acautelar e preparar para começarem a andar sempre na linha. Ponto final nos cambalachos. A coisa vai piar fino. Na Assembleia Legislativa também. Os deputados nomeados não deverão andar metidos em negócios e com empresas de índole questionável e passado comprometedor.

Quanto às concessionárias de jogo, até ver, e enquanto não for tomada uma decisão quanto ao seu fim – os contratos são para ser honrados –, poderão continuar a operar. Não haverá qualquer problema se mudarem algumas práticas herdadas do passado e se afastarem dos moribundos lobbies e mandarins locais.

Antevejo, ademais, a realização de algumas auditorias de rajada, sem pré-aviso. O processo judicial que opôs a Las Vegas Sands e a Asian American Entertainment Corporation, embora com desfecho previsível, mostrou muita coisa que se desconhecia e práticas reprováveis a diversos níveis. Aquilo que recentemente aconteceu com a auditora PwC do outro lado da Portas do Cerco e em Hong Kong, entidade cuja presença em Macau também tem sido bastante assídua, acendeu muitos holofotes. Pessoalmente não acredito que as práticas seguidas pela PwC em relação à China Evergrande, e que lhe custarão lá mais para o final do mês uma multa astronómica das autoridades chinesas, não tivessem sido aplicadas entre nós ainda com mais rigor. Vamos aguardar.

Estou certo que com uma concepção da separação de poderes mais adaptada às realidades locais, e cada vez mais distante do preconizado na Declaração Conjunta Luso-Chinesa, Macau tomará outro rumo. Entrará definitivamente na auto-estrada da integração com a grande nação chinesa. Dentro de dez anos, muito antes da data prevista, estará tudo mais do que concluído.

Por fim, registe-se que com a eventual saída de Sam Hou Fai do TUI cumprir-se-á a vontade de quem queria que se operasse uma renovação na cúpula do mais alto tribunal da RAEM.

Este constituirá motivo mais do que suficiente para que o anterior presidente dos advogados de Macau se sinta satisfeito e recompensado pela sua insistência ao longo dos anos. Será uma pena que já não possa ter oportunidade de exercer o seu direito de voto na Comissão Eleitoral. Outros fá-lo-ão por si. Com todo o gosto, convicção, fidelidade e coerência. Como sempre acontece, aliás, quando se trata de colocar a democracia local a funcionar.

Qualquer que seja o número de candidatos que se apresente, os dados estão lançados e há um calendário para cumprir.

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