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Linhas em jeito de diário. Inspiração. Homenagem a espíritos livres. Lugar de evocação. Registo do quotidiano, espaço de encontros. Refúgio de olhares. Espécie de tributo à escrita límpida, serena e franca de Marcello Duarte Mathias.
Dos resultados das eleições regionais da Madeira, que ontem tiveram lugar, a primeira e mais óbvia conclusão é que o regime da poncha, tal como sucedeu com os seus homólogos do Continente e dos Açores, estagnou.
A solução mais comum por estes dias dias é o impasse. Impasse nos parlamentos, nos entendimentos e nas soluções governativas. Em todos os casos com muita gente a colocar-se em bicos de pés.
Cingindo-me à Madeira, os resultados destas eleições sublinham a ausência de soluções e a continuação da erosão dos partidos tradicionais – PSD, PS e CDS.
Se nas eleições regionais de 24//9/2023 a coligação da AD obtivera 43,13%, equivalentes a 58399 votos, e que se converteram então em 23 mandatos, agora o PSD sozinho obteve apenas 19 mandatos e 36,1% dos votos expressos. O CDS-PP ficou-se pelos 3,96%, elegendo 2 deputados. Recorde-se que nas Legislativas de 10 de Março p.p., a AD conseguira 52922 e uma percentagem de 35,38%.
O PS obteve percentagem idêntica (21,3%) à alcançada nas eleições anteriores para o parlamento regional, onde somou 28844 votos, sendo que nas eleições nacionais de Março se ficara pelos 19,84% e 29723 votos.
Regionalmente, face aos 8,88% de Setembro do ano passado, o Chega pouco cresce, apresentando-se desde ontem com 9,23%, embora mantendo os mesmos deputados no parlamento regional, mas com um resultado muito aquém dos 17,56% das eleições legislativas de há dois meses, o que sublinha uma vez mais a diferente natureza destas eleições. Diferença reforçada pelo curto período que mediou entre os diversos actos eleitorais, acentuando a dificuldade quando se estabelecem comparações, por isso desaconselhadas, entre eleições subordinadas a pressupostos desiguais e destinadas a cumprir objectivos distintos.
A percentagem e o número de deputados resultantes da votação do JPP (Juntos pelo Povo), numa sistema constitucional que proíbe a existência de partidos regionais (cfr. art.º 51.º, n.º 4 da CRP), não escondem essa alma dissimulada, atentos os 9 deputados eleitos para os seus 16,9%. Em Março passado, o JPP viu serem depositados a seu favor 14344 sufrágios, que nessa altura representavam 9,58%.
A vassourada dada ao BE e ao PCP, que saem do parlamento regional, merece ser assinalada. E se quanto ao primeiro ainda será possível imaginar uma eventual recuperação em próximos actos eleitorais, já quanto ao PCP parece ser cada mais certo o seu destino em direcção à irrelevância, tanto a nível nacional como regional.
Em rigor, os resultados que começamos a ter são fruto da falta de renovação dos partidos, do seu afunilamento e apartamento cada vez maior da sociedade, inseridos nas suas próprias lógicas de poder e de conquista e manutenção de privilégios para os seus membros.
Com este cenário, em que a governabilidade e a estabilidade política se tornam metas dificilmente alcançáveis, é natural que os dirigentes da estagnação se assemelhem a uma bailarinas desajeitadas à procura de parceiro para um grand pas de deux, espreitando em bicos de pés por uma oportunidade de chegarem ao "pote" quando na verdade não têm soluções governativas e tudo lhes serve.
Na situação em que se encontra o desnorteado, diletante, e ultimamente também acossado, Albuquerque, bem ao contrário do seu antecessor, a quem nunca faltou a coragem, a verve e por vezes também o destempero para defender as escolhas políticas do jardinismo, as suas posições pessoais ou a qualidade da poncha do seu regime, não será fácil encontrar agora alguém que esteja destinado a governar com o actual PSD-M e as suspeitas que sobre si recaem.
O que não quer dizer que isso justifique a figura que Paulo Cafôfo, o número um do PS-M, começou logo ontem a fazer, predispondo-se a configurar mais uma "geringonça", não importa com quem. Triste número, mesmo para quem vê de longe.
Aguardemos, então, a continuação de mais esta novela.
Sobre a questão que é discutida desde o final do dia de ontem, relativa ao anúncio por parte da FIA (Federação Internacional de Automobilismo) da substituição da F3 pela nova Fórmula Regional no Grande Prémio de Macau, independentemente de se saber se é uma "despromoção" ou uma "desconsideração", há outras questões que ou as pessoas ignoram ou se estão a esquecer.
É óbvio que substituir uma corrida de Fórmula 1 por uma de Fórmula 2 pode ser aos olhos de quase todos uma despromoção, embora as de F2 sejam indiscutivelmente muito mais animadas e competitivas. Igual raciocínio e idêntica conclusão se podem tirar quando se troca a F3 pela Fórmula Regional.
O Renato Marques esclareceu algumas diferenças no Macau Daily Times. O André Couto, com a experiência e a autoridade que na matéria lhe é reconhecida, já disse o que sobre o assunto pensava. Alguns pilotos também. Mas, entretanto, também ouvi e li outros comentários que revelam algum desconhecimento sobre o que a FIA tem vindo a fazer de há uns anos para cá.
Quem tivesse acompanhado o que se tem passado já teria percebido que as decisões da FIA que introduzem mudanças estão a ser executadas quase de imediato e praticamente sem períodos de transição. Foi assim na F1 e no WEC. Neste campeonato, os LMP1 desapareceram, alguns dos GT3 que no ano passado correram no WEC e em Le Mans ficaram obsoletos de um dia para o outro, tendo sido criadas novas classes.
Depois, em todas as decisões verifica-se que há uma vontade muito grande de reduzir custos, diminuindo o investimento nas viaturas utilizadas, tanto em chassis como em motores, equilibrando as equipas e impondo limites aos gastos.
Essa política leva a um aumento da participação, à expansão do desporto automóvel e a um alargamento da competição a um maior número de países, que deste modo é tornada mais acessível a um universo muito maior de equipas e pilotos.
Por outro lado, contribui para o aparecimento de jovens valores que noutras condições teriam as portas fechadas.
A tónica da segurança continua a ser fundamental. Em momentos anteriores a FIA mostrou que o espectáculo não pode ceder à segurança e à protecção dos pilotos e dos espectadores. O desporto automóvel não é uma espécie de roleta russa. Temos carros cada vez mais potentes e os pilotos chegam aos mais altos escalões cada vez mais jovens. Há que acautelar.
E, finalmente, convém não esquecer que a FIA tem mostrado estar atenta e preocupada com os custos ambientais, querendo um desporto automóvel ecologicamente mais verde e mais amigo do ambiente.
Se tivermos tudo isto em atenção, para além do que tem sido dito, perceberemos muito melhor a decisão da FIA. Repare-se que na reunião de 28 Fevereiro pp. do World Sport Motor Council surgiram menções à Taça do Mundo de GT e à Corrida da Guia, mas nada se disse sobre a F3 e a corrida de Macau. Ninguém estranhou?
De fora deixo as questões locais e que se prendem com a transparência, ou falta dela, no processo de negociação entre as autoridades de Macau e a FIA sobre a "coutada" do Grande Prémio. Alguém sabe o que foi negociado? E por quem? O que foi proposto? Quem analisou as propostas e os contratos? Quais as condições impostas? Que pareceres foram dados? Quem os aprovou?
Enquanto não forem dadas as respostas a estas últimas perguntas não vale a pena atirar pedras à FIA e andar a conjecturar.
P.S. As declarações ulteriores de Charles Leong, que correu nos últimos dois anos em F3, ajudam a compreender parte do que aqui escrevi.
Os imponderáveis da pandemia impediram um intercâmbio normal e uma presença mais assídua na RAEM dos representantes da União Europeia (UE) em Hong Kong. No entanto, não foi por isso que durante estes anos estiveram desatentos ao que por aqui se passava. E os relatórios que foram sendo publicados atestam o interesse e a atenção conferidos.
Ninguém estranhou, por isso mesmo, que passado o período crítico e terminadas as quarentenas voltassem a percorrer os escassos quilómetros que separam a ex-colónia britânica de Macau, marcando presença em diversas ocasiões. A última foi ainda ontem quando de novo se assinalou o Dia da Europa.
Por ironia do destino, as duas principais figuras que representaram a RAEM e a UE não deverão voltar a estar presentes. O Eng. Raimundo do Rosário está a escassos de meses de terminar o seu segundo mandato à frente da pasta dos Transportes e Obras Públicas. E o Embaixador Thomas Gnocchi revelou a todos que irá partir para o país do sol nascente.
No movimento diplomático que se avizinha partirá igualmente o simpático Walter van Hattum, que assegurou a muitos as ligações comerciais e económicas com a UE.
Para os que partem, de quem certamente iremos sentir falta, deixo aqui um gesto de agradecimento pelo seu trabalho, e os meus votos de sucesso para as suas vidas e carreiras. Que tanto eles, onde quer que estejam, como os seus sucessores nos lugares que irão vagar continuem tão presentes e atentos, como até hoje, ao que por aqui vai acontecendo.
Por vezes às claras, de outras vezes mais dissimuladamente. Muito especialmente em matéria de direitos fundamentais.
Recordo-me de há umas dezenas de anos, quando trabalhei para eles, ter ficado impressionado com o seu nível de organização, embora por vezes me parecesse demasiado burocratizado nalguns aspectos atinentes à decisão. Depois disso mudei de ares, fui para outras paragens, mas não deixei de acompanhar a sua vida, e a de outras companhias aéreas, por vezes ainda viajando nos seus aviões.
Tempos houve em que alguns dos seus técnicos chegaram a estar destacados em Macau, colaborando com a companhia aérea local. Onde a TAP também excursionou nos anos finais do vierismo, transportando a tralha mais inimaginável. Depois tudo mudou. Não em Singapura.
Ontem fui surpreendido, uma vez mais, pelos resultados obtidos pela Singapore Airlines no exercício do ano transacto. Não é todos os dias que uma companhia aérea, mais a mais de um Estado minúsculo, consegue atribuir aos seus trabalhadores um bónus de 7,94 meses de salário. Sim, leram bem: sete vírgula noventa e quatro meses de salário.
A explicação é simples: boa gestão. O que, aparentemente, para a Singapore Airlines é uma coisa fácil.
Após o levantamento, em 2022, das restrições de viagem impostas pela Covid-19, em que a companhia já tinha atribuído aos seus trabalhadores um bónus de 6,65 meses de salário, o ano fiscal de 2023/2024 apresentou um crescimento de 24% dos lucros líquidos. Os lucros atingiram 2.675 milhões de dólares de Singapura, mais ou menos o equivalente a 2 mil milhões de US dólares. Depois de três anos de resultados negativos, é caso para dizer que voltou tudo à normalidade.
Quanto à folha salarial do seu pessoal, consegui um registo relativo aos salários do pessoal de cabine de 2017, entretanto divulgado em Janeiro de 2022. Quem quiser pode espreitar e fazer as contas para depois poder comparar com a "nossa" (deles) TAP.
Também a Emirates, que utilizo regularmente, onde trabalham muitos portugueses, aos comandos dos aviões e servindo os passageiros na cabine sempre com disponibilidade e simpatia, apresentou excelentes resultados e vai pagar cerca de cinco meses de salários, a título de bónus, aos seus trabalhadores.
Sei que em aviação, como em política, e muitas outras áreas, não há milagres. Por isso, uma vez que já sabem que daqui a umas dezenas de anos vamos, finalmente, todos poder aterrar em Alcochete, humildemente sugiro que as sumidades que têm gerido a TAP, a rapaziada das juventudes partidárias, o Estado português e os sindicatos organizem visitas de estudo a Singapura, muitas, e podem também levar o Prof. Marcelo, pois pode ser que o homem se modere, para ver se conseguem aprender alguma coisa e perceber qual é o segredo de gerir bem uma companhia aérea, num pequeno país, com paz laboral e resultados extraordinários.
Completam-se hoje quarenta anos sobre o início das emissões televisivas da Televisão de Macau. A data merece ser assinalada e deverá constituir matéria de reflexão sobre o seu passado, o seu presente e o futuro que dela se espera.
Muito embora tivesse sido, ao longo destas quatro décadas, muitas vezes utilizada como um instrumento de propaganda ao serviço do poder político, do almeidismo ao vierismo, dos senhores da terra aos novos régulos, passando por momentos difíceis, tanto a nível da gestão, com administradores detidos, como do seu financiamento, importa referir que não foi por isso que deixou de ir prestando, muitas vezes contra ventos e marés, um bom trabalho, tanto em matéria de informação, como de entretenimento, de formação de audiências e difusão da cultura e do conhecimento, aproximando povos e nações, dando a conhecer realidades próximas e longínquas, de muitos desconhecidas, contribuindo para um melhor entrosamento entre a cidade e os seus residentes.
Esse bom trabalho ficou a dever-se, em primeira linha, à qualidade das sua equipas, quer técnicas, quer de jornalistas, que com meios exíguos – actualmente ainda mais – souberam ao longo dos anos ultrapassar dificuldades, fazer das tripas coração, ignorar desconfianças várias e gerir as crises com sabedoria, para apresentarem um trabalho decente, prestando um serviço útil e fiável à população.
Com a TDM chegou gente de imensa qualidade até Macau; formou outros de igual valia, e depois também levou muitos para outras paragens, para grandes órgãos de comunicação social portuguesa e internacional, onde puderam mostrar toda a qualidade da formação de base adquirida em Macau.
Alguns há que, felizmente, ainda por cá continuam, com poucos e escassos meios, fazendo milagres e colocando o seu saber e experiência ao serviço de toda a comunidade, também ajudando a divulgar e a democratizar vários idiomas na comunidade, e não apenas os oficiais, contribuindo para a formação de um público cada vez mais exigente, e para a criação de pontes entre mundos que vivendo separados se foram conhecendo melhor e passaram a comunicar entre si num outro patamar e com outras referências.
Nos últimos anos, mercê das vicissitudes políticas por que a RAEM tem passado, assistiu-se, no canal português, que é aquele que sigo e acompanho diariamente, a um desinvestimento em diversos níveis, quer em meios técnicos, quer humanos, quer, ainda, na qualidade dos programas ou no simples mobiliário e decoração dos estúdios, não raro paredes-meias com um indescritível mau gosto.
Os programas de discussão da actualidade política e internacional tornaram-se residuais, avulsos, sem continuidade, o que se revela ainda mais patente na comparação com o que continua a fazer-se em Hong Kong. O unanimismo instalou-se. A crítica interiorizou-se, silenciou-se. Alguns houve que rapidamente se serventualizaram e vivem felizes com esse estatuto.
As vozes que garantiam a pluralidade do debate e entusiasmavam audiências desapareceram, substituídas que foram por rostos, vozes, discursos e programas cada vez mais anódinos e alinhados com o discurso oficial, alguns de características medíocres, requentados, servindo simplesmente objectivos de mera propaganda – política, empresarial, pessoal –, nada acrescentando ao conhecimento dos seus destinatários, e que apesar disso são depois repetidos ad nauseam, por vezes com curtos intervalos entre as emissões.
A informação tornou-se muitas vezes desequilibrada, oscilando entre o excepcional, o mediano e o sofrível, sem se perceber muito bem, para além do poder avulso de quem manda no momento, ao serviço de quem é que está. A gestão burocratizou-se e funcionalizou-se. O jornalismo e a informação perderam autonomia, por vezes assumindo posições subservientes e posicionando-se como meros instrumentos para realização dos objectivos políticos definidos superiormente.
Apesar de todos os altos e baixos continua a prestar um serviço essencial, particularmente ao nível da informação sobre o que se passa na cidade, na região e no país, o que se reveste de ainda maior importância quando os deuses que controlam os fenómenos climatéricos resolvem fazer das suas na região e arredores.
Por tudo isso, a TDM e todos aqueles que a construíram e trouxeram até hoje, formando pessoal, contribuindo para a formação de novas mentalidades, difundindo-as, promovendo o debate, mesmo em tempos de chumbo e de acelerada descaracterização da autonomia da região, quando era mais cómodo simplesmente papaguear, conferindo-lhe identidade e tornando-a num símbolo de Macau e das suas gentes, merecem ser saudados.
É o que aqui faço, desde já enviando, contra ventos cada vez mais fortes que sopram de diversos quadrantes, na pessoa desse resistente decano, símbolo do profissionalismo televisivo e farol do rigor informativo, o que não é colocado em causa pelo colorido e excentricidade de algumas gravatas que me poderiam levar a refrear o cumprimento, um forte abraço ao Jorge Silva, que espero não me leve a mal o abuso e torno extensivo aos que o acompanharam nesta caminhada desde os primeiros tempos, fazendo votos de que a TDM tenha vida e saúde durante muitos e bons anos, aproveitando para desejar à estação, se tal ainda for possível, que recupere algum do muito prestígio perdido de há meia-dúzia de anos a esta parte, corrigindo disfuncionalidades, melhorando o que está mal, dando-lhe mais meios – porque isto também é do interesse de quem manda se for capaz de ver mais à frente do apito e para lá da espuma dos dias –, difundindo a cultura, o pensamento e o espírito crítico, dentro e fora da estação, sem medo dos novos censores, entretendo, informando e divertindo; em suma, promovendo Macau no mundo e aproximando culturas, povos e nações.
De há uns anos a esta parte, em especial a partir do período da pandemia e do tempo da "tolerância zero" à Covid-19, houve muitas empresas e lojas que fecharam. E não reabriram. Talvez devido às horas de encarceramento e ao facto de muitos, embora pouco trabalhando e ganhando bem, não sentirem o peso da crise, entretanto, verificou-se um outro fenómeno: aumentaram as compras à distância com recurso à Internet.
Houve quem passasse horas percorrendo e fazendo encomendas nos sites de venda de produtos à distância. Páginas onde tudo se vende. De produtos de cosmética a pronto-a-vestir, de roupa de cama a mobiliário de todo o tipo e para todas as ocasiões. Também se vendem charutos, mas aqui o nosso Big Brother, ao contrário do que acontece no mundo livre, não nos permite, a nós que somos pessoas maiores e vacinadas, a sua aquisição sem que fiquemos com o cadastro manchado.
Passada essa época mais crítica da pandemia, chegado o momento de se escancararem portas e janelas, as compras on-line continuaram.
No edifício onde resido colocaram uma mesa para que os destinatários recolhessem as encomendas. Ultimamente há carrinhas paradas à espera que alguém vá buscar a tralha.
Também começámos a assistir ao encerramento de estabelecimentos que passaram a dar lugar, nos mesmos locais, incluindo em zonas nobres de Macau e da Taipa, mesmo dentro de centros comerciais, ao surgimento de depósitos de encomendas, sem quaisquer condições, onde pacotes das mais variadas dimensões se amontoam. Há uns quantos, mais expostos às condições atmosféricas com que nos brindaram, que começam a apresentar um aspecto de monos esquecidos, cujo cartão se deteriora com o correr das horas e dos dias de espera em razão da humidade, do calor, da chuva e dos trambolhões que vão dando.
Locais há onde ao final do dia se formam longas filas para recolha das encomendas, tendo-me sido esclarecido há tempos haver gente que a pedido dos compradores e a troco de quantias ridículas se predispõe a proceder ao levantamento da mercadoria que chega a esses depósitos.
Este último facto, tal como a proliferação de jovens que distribuem caixas de comida à porta das casas, retrata bem a crise escondida, a miséria que por aí vai grassando, à boleia das estradas pejadas de veículos de dupla matrícula, e que até já justifica pedidos dos responsáveis políticos, os mesmos que autorizaram a sua livre circulação, para que os residentes consumam mais em Macau do que nas regiões vizinhas, no que me pareceu um apelo muito pouco patriótico por parte de quem deixou que a cidade e a qualidade de vida dos seus residentes batesse violentamente no fundo, esquecendo em tais apelos que deste lado, do outro, seja em Hengqin ou em Zhuhai, ou da ponte que atravessa o delta do Rio das Pérolas, em Hong Kong, é tudo a mesma pátria.
Mas aquilo que hoje mais me aborrece é ver os tais pacotes e encomendas, vindos de um qualquer Taobao, a escorrerem porta fora dos armazéns improvisados para os passeios, entre restaurantes e lojas de produtos de marca, junto a casinos e hotéis de luxo, ocupando o espaço dos peões, obrigando a perfeitas gincanas, sem que ninguém se importe e tudo isso seja visto como normal, aceitável, e não mereça mais do que o condescendente desleixo e um encolher de ombros dos talentos que gerem este antigo paraíso de tons mediterrânicos, ultimamente mais acinzentado, feio e poluído, que se transformou num Centro Mundial de Turismo e Lazer de características aviárias.
Fiquei a saber, por notícia de ontem à noite, que ainda agora tomou posse e já se prepara para pegar na trouxa e fazer o sacrifício de rumar a Macau. Refiro-me ao incansável promotor do Licor Beirão, o inefável secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, a quem Luís Montenegro, o companheiro da JSD graduado em primeiro-ministro, confiou a Secretaria de Estado.
Pelo que vi na TDM, e ouvi dito pelo próprio, José Cesário, mais conhecido localmente como o "secretário" da conselheira Rita Santos, tem de fazer mais uma longa, penosa e dispendiosa viagem para os cofres públicos para "introduzir algumas alterações na forma de funcionamento do Consulado".
Ao que parece haverá algumas "dificuldades de acesso" quanto ao agendamento de actos consulares e ao próprio Consulado, não obstante estar numa rua central da cidade, num local visível e com bons transportes, o que não deixa de ser estranho.
E isto numa altura em que foram batidos recordes de emissão de cartões do cidadão e de passaportes, com um aumento de cerca de 90% em relação a 2022, e concretizadas diversas reformas; sabendo-se que "o indicador com maior crescimento foi o número de processos de aquisição de nacionalidade por casamento que excedeu, em 2023, o somatório de todos os dez anos anteriores", e em que "um dos eixos de a[c]ção é o aumento da capacidade de atendimento". Outro é o da redução das solicitações "por via de uma comunicação mais eficaz, online ou ao balcão", estando em prossecução o trabalho de análise, iniciado no segundo semestre, com a reformulação de procedimentos para reduzir o número de documentos e formalidades requeridas.
Naturalmente que o anúncio da visita e a sua concretização, mal assumidas as funções, não é uma desautorização ao bom trabalho do senhor Cônsul-Geral. Ninguém, muito menos eu, pensaria tal coisa, tanto mais que é evidente que os conselheiros das comunidades estão a cumprir o seu papel.
Papel onde não incluo a recolha desinteressada de apoios, a ajuda e o aconselhamento no preenchimento de boletins e o apelo ao voto no PSD e no candidato José Cesário, a quem não lê nem escreve português, sempre que chegam os períodos eleitorais.
Coisa que não é minimamente ofuscada com as preocupações com o recenseamento eleitoral (ninguém sabe se não haverá eleições antes do final do ano), nem pelo facto de haver para aí notícia da apresentação de uma queixa contra a excelsa conselheira junto da Comissão Nacional de Eleições, com seguimento no Ministério Público, ao que parece por uma conduta em matéria eleitoral pouco consentânea com o seu estatuto. Nada de preocupante para quem não se cansa de tirar fotografias com o Prof. Marcelo e o Dr. Cesário.
Enquanto não chegam novas condecorações, e não se abrem novas perspectivas de negócio aos empresários locais em Vila de Rei ou Viseu, faço votos de que com mais esta viagem não se agrave a herança nas finanças públicas portuguesas do anterior ministro das Finanças, e as dificuldades de acesso ao Consulado não resultem da eliminação de "empenhos" e de procedimentos informais de gestão de negócios alheios.
Essa sim seria uma desfeita contra a pessoa do actual titular, que não se tem cansado de dar atenção, bem mais do que aquela que eu lhe aconselharia, aos interlocutores locais do senhor secretário de Estado, um verdadeiro recordista de viagens a Macau.