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Linhas em jeito de diário. Inspiração. Homenagem a espíritos livres. Lugar de evocação. Registo do quotidiano, espaço de encontros. Refúgio de olhares. Espécie de tributo à escrita límpida, serena e franca de Marcello Duarte Mathias.
Tirando o facto de ser falado em inglês e Il Commendatore ser um cepo nessa língua, mostra bem o que foi o culto das Mille Miglia e porque tantos durante tantos anos se renderam aos seus encantos.
Belíssimas imagens, uma sonoridade invulgar de motores que deixaram muitas saudades, destacando-se os papéis de Adam Driver, da sempre espantosa Penélope Cruz e do jovem que se assume como Piero Lardi Ferrari. A caracterização de Carlo Chiti, com quem me cruzei algumas vezes, está excelente.
A sequência final, após o acidente de Guidizzolo, embora espectacular, ficou um pouco aquém do que antecedeu e surge como uma quebra na narrativa. Mas nem por isso deixa de ser um belo filme de Michael Mann, concluído, curiosamente, no ano em que a Ferrari venceu a Corrida do Século.
A ver, e talvez a rever se houver tempo para apreciar alguns detalhes.
Um novo espaço, novas salas de cinema, um filme que prometia, ali no Lisboeta.
Como ainda havia tempo disponível antes da sessão, vinham mesmo a calhar uma cerveja e umas pipocas salgadas. A opção foi por uma Kronenburg 1664 Blanc. Paguei e pedi um copo, pois recuso-me a emborcar pela garrafa, à trolha. A resposta foi que se quisesse um copo teria de pagar mais MOP$2,00 (duas) patacas. Como disse? Deve estar a brincar. Ou me trazem um copo ou me devolvem o dinheiro. Veio o superior. Pediu muita desculpa, perguntou se podia ser de plástico (continua a haver copos de plástico) e de uma marca de cerveja japonesa.
Há dias, no intervalo de um concerto, no bar do Centro Cultural de Macau, também verifiquei que não havia copos para quem quisesse beber um copo de vinho. Como as garafas são pequenas devem querer que se beba o vinho como fazem com a cerveja.
A qualidade do serviço prestado por alguns concessionários, tanto faz serem grandes como minúsculos, é cada vez pior. Parece que ninguém se importa e até haverá quem ache normal com o nível de exigência dos "turistas" que nos visitam. É o culto da mediocridade a todos os níveis. O que importa é facturar.
Depois de algumas tascas começarem a cobrar pelos lenços de papel que fazem a vez dos guardanapos, e de quererem que nos habituemos à esferovite, aos plásticos e aos cartões, entrámos agora na fase da cobrança pelo copo.
Um destes dias também nos vão cobrar nos restaurantes pelos pratos de louça, os pauzinhos (fai chi) e os talheres, ultrapassada que esteja a fase de nos tirarem os talheres dos pratos sujos para os alinharem em cima da toalha da mesa, quando há.
Teremos então estabelecimentos com estrelas Michelin para ricos, e espeluncas para todos os outros, sem meio-termo para gente normal.
Pode ser que desta forma, e com estas inovações todas para protecção do ambiente, consigamos ultrapassar os 30 milhões de "turistas". E se comece a comer com as mãos para se poupar na água e no detergente.
O cancelamento pela direcção do Instituto Cultural do espectáculo "Made by Beauty", inserido no Festival Fringe, ontem dado a conhecer pela rádio e televisão e hoje largamente divulgado pela imprensa, é mais um sinal da regressão social, política e cultural a que temos vindo a assistir na RAEM desde que deixou de ser governada pelas suas gentes e os pseudo-patriotas se assenhorearam dos seus destinos.
Estamos perante uma manifestação da mais acabada censura e um ataque de puritanismo hipócrita, bacoco e medíocre numa cidade em que se não fosse a convivência ao longo dos séculos entre múltiplos costumes, culturas e "vícios" que lhe moldaram o carácter e a fisionomia, internacionalizando-a sob múltiplas formas, da literatura à poesia, e da pintura à gastronomia, ao cinema e ao desporto, nunca teria atingido o estatuto que tem e que o Governo não se cansa de reafirmar que se quer cosmopolita, aberta ao mundo e um "centro mundial de cultura e lazer".
Quem o afirma, percebe-se por decisões tão estapafúrdias quanto esta, não tem a mínima noção do que diz, desconhece Macau e a sua história e o sentido do conceito que apregoa como se fosse uma mezinha para todos os males que nos afligem.
Em Macau sempre houve locais e espectáculos para todos os públicos, muitos com nudez integral e frequentados por altos responsáveis políticos e administrativos, antes e depois de 1999, e que se ultimamente desapareceram não foi porque se tivesse subitamente transformado numa espécie de Sodoma ou Gomorra, mas sim devido aos sucessivos ataques de ignorância, alimentados por um conjunto de parolos, subsídio-dependentes e bufos de língua acastanhada, que muito têm contribuído para a sua progressiva descaracterização e estupidificação. Do ensino aos costumes.
O espectáculo em causa foi publicitado, pelo menos desde 23 de Dezembro de 2023 na Internet, numa página oficial do Governo da RAEM, e também noutra do Instituto Cultural, aí se dizendo claramente, que "num mundo disparatado é preciso ser-se atraente", e que incluiria "lábios vermelhos, costas profundamente decotadas, minissaia, meias de vidro pretas, saltos altos", convidando-se a audiência "a explorar os conceitos universais da atracção física", colocando de lado "a moralidade e a racionalidade". Acrescentava-se ainda que era um espectáculo para maiores de 18 anos, adultos, portanto, e que continha "linguagem obscena e nudez que poderão ofender a sensibilidade de alguns espectadores". Não havia aqui nada que enganar, só iria quem quisesse e crianças não podiam entrar, pelo que se fica sem perceber se os responsáveis do Instituto Cultural estavam à espera de um espectáculo de catequese ou com a Heidi e o avôzinho.
O cancelamento do espectáculo "Made by Beauty", independentemente dos respectivos méritos ou deméritos, é de tal forma incompreensível porquanto essa mesma performance já teve lugar em cidades do Interior da China, tendo mesmo sido incluído em Outubro e Novembro passado no Festival de Teatro Shekou que ocorreu em Shenzhen.
Não houve, evidentemente, qualquer divergência ou incompreensão em relação ao conteúdo, pelo que bem andaram Sarah Sun e o grupo Utopia de Miss Bondy de recusarem mudar "a cor das collants dos bailarinos", de não aceitarem a proibição do uso de dragões, por não poderem ser utilizados “de forma sexy” (!), ou a substituição de “adereços de pénis por um copo de vinho”.
A progressiva infantilização e imbecilização da sociedade de Macau, tão patente nos anúncios, avisos e publicidade de organismos governamentais e do IAM, vai assim continuar, juntando à censura de opinião crítica nos jornais, rádio e televisão, a censura às manifestações artísticas e culturais, sinal da regressão idiota que nos levará inexoravelmente a um sub-sistema, nem capitalista nem socialista, gerido por puritanos e patriotas de alcova que se escandalizam quando vêem uma "drag queen" de collants num espectáculo para adultos, mas depois consideram normal, como já se ouviu na Assembleia Legislativa, dar uns tabefes na mulher se ela se portar mal, manter concubinas em várias cidades e vasta prole fora do casamento, por vezes escondendo os filhos, admiram o jogo e tudo o que lhe está associado, embora depois não faltem a uma missa, a papar hóstias ou a desfilarem compungidos na procissão do Senhor dos Passos, e sejam os primeiros a impor a moral e os bons costumes na escola e no espaço público de admissão reservada.
Enfim, nada que seja muito diferente daquilo que fez há séculos o Papa Paulo III, Alessandro de Farnese, que sendo cardeal ficou conhecido, entre outras coisas, por proteger e promover a sua própria família, fazendo-a enriquecer e levando uma vida dissoluta, na qual arranjou uns quantos filhos por detrás da porta, mas depois indicou Biagio de Cesena, um palerma pedante, para vigiar o trabalho de Miguel Ângelo, mandando-o cobrir partes dos corpos das figuras e criticando os desenhos "obscenos" da Capela Sistina, pintados por aquela que terá sido, talvez, a mais espantosa figura da Renascença, símbolo maior da arte, da verdade, da inteligência, da humildade e das verdadeiras virtudes da Humanidade.
Tempos de felicidade, e estes sim obscenos, são aqueles que hoje vivem os residentes de Macau, naquela que será mais uma prova do indiscutível cumprimento da Declaração Conjunta Luso-Chinesa e da luz que emana da forma como a Lei Básica está a ser cumprida e se tem aprofundado o princípio "um país, dois sistemas".
Tão aprofundado que nalguns momentos até parece ter caído ao fundo de um poço.
(créditos: daqui)
Duas notas rápidas para estes dias frios de Inverno em que Macau é assolada por mais uma monção vinda do coração do Império do Meio.
A primeira é uma nota de satisfação pela conclusão e abertura ao público do viaduto da Rotunda da Piscina Olímpica, que faz a ligação entre a Avenida Marginal Flor de Lótus, na Taipa, e a Avenida dos Jogos da Ásia Oriental. Trata-se de uma obra útil e que fazia muita falta, desanuviando o trânsito na rotunda e libertando os agentes policiais dos embróglios em que se metiam de cada vez que queriam orientar o trânsito. Para quem se dirige a Coloane ou para a Universidade é um ganho importante e que deve ser saudado na acção da tutela dos Transportes e Obras Públicas. Tem havido muita coisa má, algumas péssimas, outras sofríveis, mas desta vez também aqui fica uma nota de aplauso. Quando as coisas se fazem bem, resolvem problemas aos residentes, e isso significa um contributo para a melhoria da sua qualidade de vida, só há que dar os parabéns.
A segunda nota é de estranheza. Muita estranheza. Alguém devia questionar os Serviços de Saúde e o Centro Hospitalar Conde de São Januário sobre as razões que levam a que numa região como Macau, com um PIB per capita dos mais elevados do mundo e os casinos a facturarem milhões, a máquina destinada aos exames de perimetria, área de oftalmologia, esteja avariada há cerca de dois anos. Esta manhã estava de novo inoperacional. Por mais do que uma vez são marcados exames e os doentes não os podem fazer com a desculpa de que a máquina não está a funcionar. Não é normal que o equipamento numa área tão sensível e importante para a vida da população esteja avariado há tanto tempo, não se percebendo porque continuam a ser marcados exames que afinal não podem ser realizados. Máquinas de perimetria não faltam; e mesmo em Portugal e na União Europeia há algumas à venda fabricadas aqui ao lado, na China, a preços muito razoáveis. A não ser que haja razões, que a razão não alcança, que justifiquem mais essa vergonhosa situação. O problema não deverá ser de comissões. Investigue-se, pois.
(créditos: AGB)
Para além de na altura da prorrogação da concessão, atentas as condições em que ocorreu, com dívidas vencidas à RAEM e obrigações por cumprir, muitos se terem questionado sobre as razões que estavam por detrás da outorga de um período extenssíssimo, que só terminaria em 31 de Agosto de 2042, certificou-se ontem ter sido essa mais uma má, péssima, decisão pela qual, creio, ninguém será responsabilizado.
E as razões para a responsabilização seriam imensas, visto que a decisão correcta não teria sido a prorrogação da concessão, mas sim o seu resgate, o que há muito deveria ter acontecido tantas eram as obrigações por cumprir.
Paulo Chan, ao tempo responsável pela DICJ, justificou a decisão, estranhamente, com a necessidade de diversificação. Diversificação de quê se na altura já havia milhares de milhões de dívidas? Da má gestão?
Sim, porque como foi devidamente sublinhado, se a situação do Macau Jockey Club era aterradoramente má, e a empresa estava à beira do abismo, porque quis o Governo que fosse então dado um passo tão insensato, prorrogando a concessão, para se acabar agora com as corridas de cavalos, quando ainda faltam quase duas décadas para o fim do prazo acordado? Mas havia alguma coisa naquela situação em que uma pessoa normal pudesse acreditar que iria correr bem?
Não é preciso sequer ir tão longe, como fez Niall Murray, comparando Macau com Hong Kong, porque para fazer é preciso saber.
E o que era estranho antes, ainda mais obscuro se tornou depois da publicação da Ordem Executiva n.º 2/2024 e de mais duas surreais conferências de imprensa.
Na primeira, a do Secretário para a Administração e Justiça, ficámos a saber que afinal está tudo bem, que o Governo aceitou o pedido de rescisão porque a concessionária "não conseguiu obter benefícios económicos nem sociais", e que "ainda que a companhia não tenha cumprido o estipulado no contrato de concessão e agora tenha pedido a rescisão, o Governo não vai receber nenhum tipo de compensação", até porque o contrato negociado entre as partes, isto é, pelo anterior Governo, não continha outras penalidades para além da suspensão ou da rescisão.
O brilhantismo desta explicação só seria ultrapassado com o facto da própria concessionária, Companhia de Corridas de Cavalos de Macau, S.A, na segunda sessão, confessar que no momento da prorrogação da concessão não tinha condições, objectivas e realistas, para poder cumprir os seus sonhos megalómanos.
A pandemia foi a machadada final, visto que deixou de ser possível continuar a "empurrar com a barriga" ou a varrer para debaixo do tapete, tantos eram os buracos que este apresentava.
Esperemos que, entretanto, até 31/3/2025, a situação dos trabalhadores, dos cavalos e dos credores se resolva, e aquele espaço não veja lá crescer mais um mega empreendimento imobiliário ou um parque de diversões com mais bonecada horrorosa e deusas de milhões. Mas ao olhar-se para o que vinha e para o que temos ficam-me no espírito apenas duas ideias: ou o Governo foi enganado quando prorrogou, ou foi uma prorrogação de favor.
As duas hipóteses são más. Não acredito em nenhuma.
Apesar do que aconteceu com o Macau Jockey Club, pelo que publicamente se conhece, ter todos os contornos para ser mais um, diria mesmo vários, casos de polícia.
Ou seja, continua a haver, para quem está de fora, uma história mal contada. Os residentes de Macau não são burros e há quem até pelo cheiro perceba logo quando as coisas estão "fora da lei" ou se meteu uma patada.
Ninguém estranharia, pois, que se não ficasse por aqui e as autoridades competentes investigassem o que houvesse a investigar.
De acordo com a lei, naturalmente, expressão que ultimamente alguns dizem a toda a hora e para mim começa a trazer muita água no bico porque ninguém que actue de acordo com o princípio da legalidade tem necessidade de estar sempre a justificar o que faz invocando a lei e sem que antes se lhe aponte qualquer ilegalidade.
A não ser que alguém tivesse o objectivo, pura imaginação minha, de querer que todos ficassem com a mesma farda na fotografia. Os que negociaram antes e prorrogaram, deixando uma bomba ao retardador; os que negociaram depois e se comprometeram numa rescisão sem qualquer compensação. Por culpa dos que estavam antes, evidentemente.
É mais uma longa metragem de horror que se perspectiva para as próximas edições do Festival Internacional de Cinema de Macau. Agora na vida real e sem os subsídios habituais.
Em tempos já me tinha mostrado preocupado com o papel (não me refiro a dinheiro) que alguns "empresários" locais desempenham e com a imagem que transmitem de alguns "negócios" em que se envolvem. Foi em 2019 e estava em causa uma crónica de Diniz de Abreu sobre "O descalabro da Global Media".
Entretanto passaram-se mais de quatro anos. O descalabro, se tal é possível, agravou-se, e estamos a assistir à continuação de uma escabrosa novela, sempre com um conhecido empresário local e destacado patriota na ribalta.
Que o negócio da Global Media e alguns "investimentos" em Portugal começavam a cheirar mal não constitui novidade.
Que o nome do principal accionista do grupo Global Media volte à tona também não.
O que representa novidade é saber-se, de acordo com o que foi dito por José Paulo Fafe na audição que decorre na Assembleia da República, que tenham sido descobertas dívidas no valor de "2,1 milhões [de euros] em Macau e 700 mil euros em Malta em empresas de jogo 'online' que nunca funcionaram, ou melhor, de licenças de jogo 'online'".
Haverá sempre a possibilidade de se leiloar a Medalha de Mérito Industrial e Comercial para pagar alguma coisa, mas as afirmações são suficientemente gravosas para deverem ser devidamente esclarecidas. É que fiquei sem perceber se a dívida de 2,1 milhões em Macau diz igualmente respeito a empresas de jogo 'online' que nunca funcionaram ou a licenças de jogo 'online'.
Não é por nada, mas independentemente de continuarem actuais as perguntas que formulei em 2019 [No fim, a gente revê o filme e só pergunta, entre nós, aqui, que contribuição deu Kevin Ho, através da Global Media, para a credibilidade e prestígio dos empresários de Macau? E aos investimentos chineses na Europa? Que confiança se transmitiu?], a coisa fede, sendo ademais conveniente recordar que também por causa do jogo online e outros "cambalachos" similares há quem esteja na RAEM a cumprir pesadas penas de prisão.
E todos eles foram patriotas, durante anos a fio, enquanto havia cacau para fazer o chocolate que era depois distribuído por outros patriotas que ultimamente, sabe-se lá porquê, até clamam, para espanto meu que sempre os conheci avarentos, discretos e mudos, por portais de transparência e, imagine-se ao que isto chegou, querem saber os critérios, as razões e os valores das adjudicações nas obras públicas.
Ou me engano muito ou deve estar na altura de um conhecido advogadode Macau prestar mais um serviço caritativo, escrevendo novo artigo no Diário de Notícias. Antes que o jornal feche ou acabe a gestão patriótica da Global Media.
A internacionalização tem os seus custos. Aquele senhor que queria transformar Tróia numa espécie de Marbella e estava a fazer um hotel e um casino em Cabo Verde que o diga. Às vezes é preciso meter algum "kumbu". Não é o mesmo que dar entrevistas à imprensa local destinadas a talentos.