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línguas

por Sérgio de Almeida Correia, em 02.02.23

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Cumprindo a tradição e todos os atavismos burocráticos, foi dado a conhecer o Relatório do Ano Judiciário 2021/2022 dos Tribunais da RAEM. Tirando a estatística, cada vez mais irrelevante, não porque não seja necessária, mas porque está cada vez mais distorcida, quer pelo mau desempenho de alguns protagonistas ao nível de base – o aumento ou diminuição do número de processos em todas as instâncias é cada vez mais marcado pela má e tardia justiça, que ora demove os interessados de a ela recorrerem, ora aumentam o número de recursos destinados a corrigir a "asneira" –, quer pelo seu custo e falta de utilidade em tempo útil, aquilo que há de interessante no documento é ver o que se escreve sobre o uso das línguas oficiais nos tribunais.

No Tribunal Judicial de Base (TJB) foi de 92,6% (8333) o número de decisões proferidas exclusivamente em chinês, e de apenas 0,48% (43) o de decisões nas duas línguas. Globalmente, desceu significativamente o número de decisões proferidas em chinês (menos 1564) e em português (menos 152). No Juízo de Instrução Criminal (JIC) a utilização da língua chinesa foi superior a mais de 90%. Relativamente ao Tribunal Administrativo (TA) ficámos na mesma. Alguém ter-se-á esquecido de fazer a revisão e mistura-se o que diz respeito ao TA com o JIC sem que se perceba de que estão a falar, pelo que não há números (cfr. páginas 38, 39 e 40). 

No Tribunal de Segunda Instância (TSI) verifica-se que 62,15% dos acórdãos foram redigidos em chinês. Em matéria criminal houve 468 acórdãos exclusivamente em língua chinesa (85,56%).

Já quanto ao Tribunal de Última Instância (TUI) fica-se sem perceber a estatística. Referir que 63 acórdãos, representando 50,4% do total foram redigidos nas duas línguas ou apenas em chinês não contribui para se saber quantos é que foram relatados apenas em chinês. Em português sabemos que foram 62, o que dá 49,6%. Apesar de tudo, nada mau no que ao TUI concerne.

Perante este cenário, e ciente do que se vai passando, diria que é nas instâncias inferiores que as coisas continuam muito mal em matéria de utilização da língua portuguesa e de respeito pelos direitos das partes.

Basta ver quantas decisões exclusivamente em chinês são notificadas a partes e mandatários que só dominam o português, algumas com centenas de páginas e com prazos de recurso muito curtos para a extensão e volume dos processos, mesmo em situações em que ambas ou a maioria das partes e os seus mandatários não dominam o chinês, para se perceber o desequilíbrio existente, o que torna mais difícil, morosa e dispendiosa a realização da justiça. 

Mal se compreende que assim seja quando se exige aos magistrados que dominem as duas línguas oficiais para acederem à profissão. Se estes e os tribunais não têm meios é preciso que lhes sejam facultados, até porque não é minimamente razoável que num Estado de direito, se é que como tal ainda nos devemos ver e queremos que nos vejam, se recusem simples extensões de prazo à defesa para efeitos de tradução de peças processuais notificadas a mandatários que não dominam a língua em que são notificados, qualquer que ela seja, num sistema em que são cada vez menos os que sabem onde acaba a morosidade e começa a pressa, e vice-versa. 

É incompreensível que numa região como Macau, com os meios disponíveis, os residentes continuem a ter uma justiça tão lenta, distante e desligada, muitas vezes tanto da realidade como do direito, exigindo-se mais responsabilidade social às concessionárias do jogo do que se exige de respeito pela justiça e pelas línguas oficiais ao Governo, aos tribunais e aos seus protagonistas.

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