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excessiva

por Sérgio de Almeida Correia, em 04.08.22

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Vai por aí um escarcéu com a deslocação de Nancy Pelosi à Ásia, em especial com a sua solitária incursão a Taipé.

Compreende-se que a atitude de Pelosi cause algumas comichões em Pequim, e que os responsáveis pela política externa da RPC vejam a visita a Taiwan e as honras que lhe foram concedidas pela senhora Tsai Ing-wen como uma atitude provocatória. Mas é exactamente isto de que se trata, de uma provocação, e a vocalização exacerbada da oposição à atitude da speaker da Câmara dos Representantes só serviu para lhe dar mais visibilidade, desvalorizando a legítima posição da RPC e conferindo à deslocação e à senhora a importância que não têm.

Convirá ter presente que este ano haverá eleições intercalares nos Estados Unidos da América e que a maioria democrata nos Representantes poderá estar em risco. Quem acompanha a vida política interna desse país sabe perfeitamente que ali é esta que condiciona a política externa e que todos os movimentos conduzidos na frente diplomática têm repercussões dentro do país e forte influência na balança do poder e nos equilíbrios políticos internos nas duas câmaras do Congresso.

Esquece-se que já era assim no tempo de Obama, dos Bush, de Reagan, de Nixon, de Kennedy, de Roosevelt, de Truman e de todos os outros que antecederam Biden. Mas o melhor exemplo é o de Woodrow Wilson. Quando este propôs o plano dos 14 pontos empenhou-se, e à sua administração, na formação da Sociedade das Nações e depois viu rejeitada a aprovação do Tratado de Versalhes e a subsequente entrada dos EUA na organização, a qual estava condenada à nascença pela oposição do senador Lodge. Lodge achava-se o supra-sumo em matéria de política internacional e ficou zangado pelo facto de Wilson não ter incluído senadores na delegação que foi a França à Conferência de Paris. Um problema de sacristia. Também em 1918 havia "midterm elections" e o resultado da disputa interna entre Wilson e Lodge conduziu à rejeição do tratado pelo Senado em Novembro de 1919. 

A situação que hoje se vive não é muito diferente da que naquele tempo se vivia, com a diferença de que Joe Biden fez aquilo que a RPC deveria ter feito: desaconselhou a visita de Pelosi a Taiwan, desvalorizou-a, e seguiu em frente porque há questões mais importantes para resolver interna e externamente.

É claro que os arautos do megafone e campeões do patriotismo embarcaram na esparrela. Há um congresso do PCC no Outono e é preciso manter as massas arregimentadas. Basta ler o que na imprensa de Macau se escreveu para se perceber do que falo. Gente habituada a calar-se perante as maiores arbitrariedades e que não se importa de rastejar por quem lhes paga independentemente da cor do dinheiro, que não diz uma palavra sobre a violência das políticas de Covid-19, os ataques à liberdade de imprensa, os direitos de manifestação e reunião e a criação subreptícia de um estado policial, ou até sobre o que está a acontecer no Mianmar, veio logo a terreiro em bicos de pés repetir, para "inglês ver", a cantilena do megafone.

Pelosi não tem no sistema institucional dos EUA o peso político que lhe quiseram atribuir. Em fim de carreira, numa situação permanente de equilíbrio periclitante na Câmara e nos saltos altos com que desce as escadas do avião que a transporta, sem o apoio da Administração Biden na sua excursão, montou uma encenação destinada a dar-lhe o palco que em breve vai perder. 

Ao conferirem importância à visita de Nancy Pelosi, personalidade sem qualquer poder executivo e verdadeiro peso, esquecendo o sistema de repartição de poderes nos EUA, os falcões de Pequim acenderam os holofotes e cometeram um erro político, visto que deram-lhe o protagonismo que ela queria, que não tem e não merece. Com isso encheram canais de televisão, páginas de jornais e revistas com fotografias da madame, da sua entourage e da líder de Taiwan. As senhoras devem estar neste momento profundamente agradecidas à falta de visão política de quem embarcou nessa campanha e lhes deu tanto tempo de antena.

Nenhum país com peso no contexto mundial deu importância à viagem. Alguns houve que fizeram declarações de circunstância, habituais nos corredores da diplomacia, mas a maioria não ligou peva ao assunto. Não há, não houve, qualquer inflexão na política de uma só China, até porque a ONU e a opinião pública mundial não o permitiriam, e a viagem será rapidamente esquecida.

Tudo o mais não passa de folclore de ocasião, demonstrações de força inconsequentes para consumo interno das opiniões públicas em Washington e Pequim, e satisfação de egos tão limitados que merecem a nossa compaixão.

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