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Linhas em jeito de diário. Inspiração. Homenagem a espíritos livres. Lugar de evocação. Registo do quotidiano, espaço de encontros. Refúgio de olhares. Espécie de tributo à escrita límpida, serena e franca de Marcello Duarte Mathias.
Num mundo em que a maior parte de nós vive em urbes descomunais, com o ar altamente poluído, rodeados por gente ruidosa, com pouca paciência e afligida por imensos problemas, uma das poucas escapatórias para alguns momentos de paz e sossego é o contacto com a natureza. A realização de passeios em grandes espaços, respirando um ar tão puro quanto possível, observando a vida de outros seres que connosco partilham este espaço ínfimo do Universo sem interferir no seu quotidiano e respeitando o seu espaço acaba por ser uma actividade profundamente recompensadora e até certo ponto económica pelo relativo baixo custo face aos benefícios proporcionados.
Creio que a maioria das pessoas que viaja pelo Laos, para além de dedicar atenção à cultura local, à visita de monumentos, alguns (poucos e pobres) museus, e aos múltiplos templos, vai em busca da paz e do silêncio que as montanhas e os seus rios proporcionam. Há, também, quem se dedique a passeios em veículos todo-o-terreno, de jipe, de mota e de bicicleta, também de elefante, que é uma outra espécie de 4x4 e com os quais há quem organize as coisas de maneira a que se tome banho com os paquidermes, ou de caiaque. Mas mas para mim os melhores momentos, em qualquer local, acabam por ser os vividos por cima ou debaixo de água e em longas caminhadas a pé, embrenhado no meio do verde e desfrutando de vistas magníficas, com tempo para parar, sentir que mergulho os meus olhos e todo o meu corpo nessa, por vezes, pacífica e silenciosa imensidão de espaços feitos de dias que de longos se fazem curtos e de onde saímos sempre com saudade e com a esperança de que se repetirão em breve.
Não podendo ir a Vang Vieng e Savannakhet ou à procura dos tigres no Parque Nacional de Nam Et-Phou, um espaço de 420.000 hectares onde é possível ver os últimos exemplares da espécie, cingi-me a algumas voltas nas proximidades de Luang Prabang e de Vienciana. Os passeios e cruzeiros no Mekong e no Nham Khan, de que já aqui dei conta, são ideais para se ver a vida no rio e nas suas margens, havendo hoje uma oferta relativamente ampla quanto a esta matéria e a preços muito razoáveis. Cerca de 20 USD por um passeio no rio para duas pessoas durante cerca de 3 horas pareceu-me francamente acessível, embora esse valor seja uma fortuna para os padrões locais e eu também veja no que me foi cobrado uma pequena contribuição, que dou com gosto, para o desenvolvimento do país.
Um conselho recorrente e que convém ter sempre presente: o Laos continua a ser um dos países mais minados do mundo e onde o trabalho de limpeza continua muito atrasado devido à escassez de meios. Fora dos centros mais turísticos as pessoas não deverão afastar-se dos caminhos delimitados para evitarem acidentes.
Nas cercanias de Luang Prabang as deslocações são fáceis, mas para quem chega e tem pouca informação é preferível contactar um dos muitos operadores locais. Os preços variam e nem sempre, ao contrário do que acontece noutros locais, as ofertas dos estabelecimentos hoteleiros são as mais caras. Em duas ocasiões, nos hotéis onde pernoitei, vi preços mais baratos para o aluguer de veículos com motorista do que em agências de rua, embora haja prospectos dos operadores mais importantes que se repetem e surgem em todo o lado. Convém ter em atenção que há períodos do ano em que os preços sobem, como entre Dezembro e Março, melhor altura para se visitar o país, ou agora entre a segunda e a terceira semana de Abril por ocasião das celebrações do Ano Novo. O serviço prestado é em regra sério e profissional, o que é completado pela afabilidade e gentileza do povo.
Há grutas, muitas com imagens de budas, quintas, algumas dedicadas à recuperação de animais, e num dos locais mais visitados do país, nas famosas cascatas de Kuang Si* – cujas águas ganham diferentes tonalidades, predominantemente turquesa e verde-esmeralda, em razão dos minerais que transportam e onde muitos aproveitam para se banharem –, dei com um centro de recuperação e protecção de ursos. De manhã tive dificuldade em localizá-los, mas à tarde, fazendo eles a sua sesta, deitados em pequenas plataformas, esteiras de baloiço ou brincando entre si, foi possível observá-los.
Em redor das cascatas existem percursos bem assinalados, havendo a possibilidade de se subir pelo caminho talhado na montanha até um pequeno lago que dá acesso à sua nascente. Convém levar calçado e roupa adequados. Por isso mesmo também existem, logo nas proximidades dos primeiros lagos, uns balneários rudimentares em madeira apenas para que seja possível mudar de indumentária.
O caminho até Kuang Si é feito por estreitas e pouco sinuosas estradas, alcatroadas, o que é uma bênção pois que noutros locais o pó era tanto e tão fino que se entranhava em todo o lado, nas narinas, na garganta, nos olhos e nos equipamentos electrónicos, o que ao fim de algumas horas se pode tornar num verdadeiro pesadelo.
Fui aconselhado a fazer essa jornada depois das 11 horas, visto que o tempo estava fresco e de maneira a apanhar o calor do sol quando chegasse lá acima por volta das 12:30. Essa é única maneira de ver a luz penetrar nalguns troços da floresta onde as árvores crescem desmesuradamente e é possível olhar para os bambus que se erguem para o céu como se fossem sequóias.
* Também é possível ir às cascatas de Tad Sae, cujo acesso é feito de barco, mas pelo que me disseram estas são menos espectaculares e na época seca têm pouca água.