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Linhas em jeito de diário. Inspiração. Homenagem a espíritos livres. Lugar de evocação. Registo do quotidiano, espaço de encontros. Refúgio de olhares. Espécie de tributo à escrita límpida, serena e franca de Marcello Duarte Mathias.
(foto MDT)
Imagine que um destes dias quer ir ver um filme ao complexo de cinemas situado no Hotel Galaxy, em Macau. Se tiver necessidade de levar o carro, pode acontecer que esteja a chover e não é fácil acomodar toda a miudagem no autocarro, pois fique a saber que não vai poder estacionar o carro no parque onde sempre o fez porque agora esse parque é só para o "people from the Government" (sic). Mesmo que haja imensos lugares vazios nesse local, já sabe que vai ter de levar o veículo até ao parque da zona nova, próximo do Hotel J.W. Mariott. O leitor não é "people from the Government".
É claro que se depois pretender estacionar na zona D, que é a mais próxima dos cinemas, também não vai ser fácil, porque em dias festivos e fins-de-semana está sempre cheia, e o mais provável será ter de deixar a viatura nas zona A, B ou C. Depois, já sabe que terá que palmilhar até ao destino, coisa que o coração lhe irá agradecer.
Naturalmente que nessa altura já terá os bilhetes consigo, porque não está para correr o risco de chegar ao cinema, depois de todo o trabalho que teve em deslocar-se até lá, e não haver bilhetes disponíveis para a sessão que deseja. E aí, das duas uma: ou foi previamente ao local e já sabe que nessa operação vai perder pelo menos uma hora ou, como é mais normal, vai querer adquirir os bilhetes pela Internet, recorrendo à bilheteira online.
Pois é, só que ao querer comprar o bilhete pela Internet se depara com um pequeno problema. O leitor é residente em Macau, trabalha para a administração pública ou uma empresa local, recebe o salário em patacas e vai comprar um bilhete para uma sessão de cinema num estabelecimento comercial da RAEM. A entidade que lhe vai vender o bilhete é local e o leitor até está convencido de que ao comprar o bilhete pela Internet está a facilitar a vida ao vendedor, já que este não necessita de ter uma pessoa a atendê-lo, nem há problema com os trocos.
Pura ilusão. Fique então a saber que a Galaxy, desde logo, lhe vai cobrar uma comissão pela venda online. E aquilo que lhe pede a título de comissão, isto é, trocos para depois o patrão*, com o que saca aos cidadãos de Macau, fazer figura de generoso num cheque para a marcha da caridade, por cada bilhete adquirido online, tem de ser pago, evidentemente, em dólares de Hong Kong. Por cada bilhete adquirido online o leitor vai desembolsar HKD $ 8,00 de comissão. Se está a pensar comprar uma dúzia de bilhetes para a família e o casal amigo e os filhos que também vão, talvez lhe compense apanhar um autocarro ou um táxi, se conseguir, e pagar a viagem, em patacas. É capaz de lhe ficar mais barato do que render-se a esta rapinagem.
Bom, mas não é tudo. O problema agrava-se quando se apercebe que a Galaxy, uma empresa que tem enriquecido à custa de Macau, do Governo de Macau e daqueles que aqui vêm, para além da comissão em dólares de Hong Kong também só aceita pagamentos online na mesma moeda. Como o leitor é um "desgraçado" de um residente local, que recebe em patacas e tem um cartão de crédito em patacas, para além da comissão de aquisição online e de pagar em dólares de Hong Kong os bilhetes de cinema que adquire para uma sessão em Macau e a uma empresa da terra, ainda vai ter de pagar o câmbio dos bilhetes de cinema de dólares de Hong Kong para patacas. E no fim vai dar por si a questionar-se sobre se, sendo tratado desta forma, ainda há alguma vantagem nas actuais condições de vida em ser residente de Macau.
Chegado a este ponto, confesso que não sei se no Governo de Macau, em especial na área da Cultura, Turismo e Assuntos Sociais e afins ainda há alguém que pense. Quero dizer, que pense nestas coisas, nos problemas de Macau e das suas gentes. Eu sei que não deve ser fácil estar sempre ocupado com as encomendas de fogo-de-artifício, com os desfiles de cabeçudos, com os grilos, com as passadeiras vermelhas, com as adjudicações urgentes e as distribuições de subsídios, com a acomodação dos "VIP" (há de vários tipos, alguns inqualificáveis) nos eventos que promovem, e com tantas outras coisas, e ainda ter de reparar nestas porcarias que aborrecem a populaça e a fazem sentir estrangeira na sua própria terra.
Estou convencido de que talvez pudesse haver alguém, quem sabe se um desses advogados de confiança do Chefe do Executivo, que seja capaz de fazer a ponte entre a Administração da RAEM e aquele financiador que se preocupa tanto com a civilização do mundo e o respeito pelos outros, no sentido de ver se a Galaxy consegue fazer as coisas em termos menos descarados. Isto é, se possível cobrando estas pequenas coisas, como uns simples bilhetes de cinema vendidos online, em patacas, que é a moeda local.
Deve haver gente em Macau, penso eu, com capacidade informática para introduzir no site as correcções necessárias. A AMCM, que nunca repara nestas coisas, e o Turismo, que só está atento aos anúncios virtuais da Airbnb, eram capazes de não se importarem. E não seria por causa das comissões e do câmbio que os bancos de Macau iriam ficar mais pobres. Quem sabe se os bancos emissores não poderiam dar uma ajudinha na correcção do site da Galaxy, permitindo ao Sr. Lui vender, já agora, os seus produtos em patacas?
(texto editado e rectificado)