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aflitivo

por Sérgio de Almeida Correia, em 26.10.16

Eu supunha que episódios do tipo Relvas e do tipo Sócrates não se iriam repetir e que teriam servido de lição. Uma vez vez mais estava enganado. A leviandade com que este tipo de situações, e outras idênticas, ocorre na nossa vida pública e o modo como os partidos contemporizam com isto é aflitivo. Bem sei que os outros eram membros do Governo, um era ministro e o outro primeiro-ministro, e ambos com fortes responsabilidades políticas nos respectivos partidos, e este é apenas um capataz, mas isso não afasta a gravidade da situação nem a posição em que deixam os seus partidos.

Um tipo que admite ser nomeado por um primeiro-ministro nas circunstâncias em que este foi nunca se devia ter demitido. Ele nunca deveria é ter sido nomeado. Mas tendo-o sido, o que partido devia fazer era instaurar-lhe um processo disciplinar com vista à sua exclusão, com base no art.º 14.º n.º 2 dos Estatutos do PS que prevê a exclusão daqueles que, sendo militantes, com a sua conduta acarretarem sério prejuízo ao prestígio e ao bom nome do partido.

Enquanto os partidos não cortarem a direito e não correrem com esta gente das suas fileiras, gente que revela uma tremenda falta de carácter e de idoneidade moral para estar na política e exercer cargos políticos e/ou de confiança política, os partidos vão continuar a fenecer lentamente e a desprestigiar a democracia, afastando o comum dos cidadãos da participação e obrigando-o a procurar refúgio em movimentos sociais e outras organizações da sociedade civil. Já era mais do que tempo para perceberem isto.

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trocados

por Sérgio de Almeida Correia, em 21.10.16

20161019-189r.jpg

 (foto Ponto Final)

É difícil ter um sistema de justiça a funcionar quando as preocupações manifestadas pelos discursos dos responsáveis não se conjugam. Tirando o apreço pela estatística e pelos problemas dos móveis e imóveis, em tudo o mais divergem. Este ano a cerimónia de abertura do ano judicial também não constituiu novidade.

Novidade foi o discurso do Presidente da AAM. Não pela forma, que é a usual, mas por deixar perceber que anda cada vez mais desfasado dos tempos, angustiado e correndo atrás do prejuízo. Com os passos trocados.

Eu compreendo-o. Há um ano deixou uma brevíssima nota com seis linhas sobre o problema da língua portuguesa nos tribunais. Uma nota menor, tímida, que passou despercebida, talvez por não achar que o assunto fosse então suficientemente importante para que a AAM assumisse um papel de charneira na defesa da língua portuguesa e dos direitos dos cidadãos de Macau. Este ano tentou acertar o passo e as seis linhas passaram para mais de duas páginas. O ano passado não disse nem uma palavra sobre a Lei de Terras e os problemas que aí vinham, confiando que sem fazer ondas tudo se resolveria. Este ano erigiu este assunto em sua bandeira, vá-se lá saber porquê.

Eu não quero dizer que o Presidente da AAM só fala nos problemas quando a casa começa a arder e o fogo já é visível da Muralha da China. Ou que se sente mais protegido para falar nos problemas depois de quem tem o poder, o político e o dos cifrões, enviar os seus recados assim que pisa o sagrado solo de Macau. Seja porque Li Keqiang, António Costa e Tiago Brandão Rodrigues estiveram em Macau e mostraram o quanto estão interessados na promoção do bilinguismo e na defesa da língua portuguesa como reserva estratégica da China, de Portugal e da RAEM, seja porque no último ano a Administração da RAEM começou a declarar a caducidade de muitas concessões cujo estatuto há muito devia ter sido revisto de tão ostensivo o abuso e escandalosa que era a sua gestão, o certo é que só este ano se amofinou e deu dimensão a estes problemas que há muito pairam por aí.

Em relação às preocupações com a língua portuguesa, nas quais aliás me revejo, voltou a chegar muito tarde, não tendo falado grosso em devido tempo. Quanto às terras confirma-se que enviar pareceres a desoras, discretamente, de pouco serve quando há pirómanos a legislar.

Estas coisas também me preocupam, embora as nossas preocupações não sejam iguais. E eu não saiba quem são os tais "investidores" e "empresários" que preocupam o Presidente da AAM, que andam a fugir para outras jurisdições e foram surpreendidos pelo "radicalismo das opções legais". Em todo o caso, deixem-me dizer que há alguns que não fogem: ficam apenas de férias e impedidos de continuar a "investir" como sempre fizeram, nem que seja num cafezinho na Times Square. Quanto aos outros, os que ficaram surpreendidos, é pena que não tivessem sido caçados pelo "radicalismo" das soluções legais ainda no tempo da Administração portuguesa. E tenha sido necessário aguardar tanto tempo, e tantas concessões e condecorações depois, para perceberem que ainda não eram os donos disto tudo. Do mal o menos. 

Em todo o caso, com a estima que me merece, a única coisa que daqui posso humildemente sugerir ao Presidente da AAM, já que não conheci o discurso antes nem me foi perguntado se estava de acordo para assim falar em meu nome, é que para futuro se antecipe ao tempo. O tempo não resolve problemas; e normalmente só os agrava, a não ser para os burocratas, que não é o seu caso. É melhor que não espere pelas sessões de abertura do ano judicial para dizer que preceitos legais não se revogam pelo "desuso", e que deixe de confiar, sentado, "em soluções de transição". Que não fique à espera que os fundilhos de terceiros, sejam advogados, empresários ou simples cidadãos tesos e anónimos comecem a arder para manifestar publicamente as suas preocupações. Os fundilhos de terceiros de boa fé, evidentemente, que presumo que sejam os que foram enganados por alguns dos tipos que conseguiram as concessões (e de algumas ainda estamos para saber como, mas há quem esteja a tratar disso a todo o vapor).  

A Administração tem culpa? Também tem. E não é pequena. Mas o problema é que, às vezes, a gestão do tempo não é boa conselheira. Não serve para nada e depois não há arbitragem, por muito bem paga, discurso ou pedido de desculpas a quem em nós confia, e confiou, que safe o que já ardeu. Ardido, ardido está. 

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túbaros

por Sérgio de Almeida Correia, em 08.10.16

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O meu amigo R.M. (espero que ele não se zangue por eu citá-lo aqui) lembrou-se de que em tempos tivemos o New Deal, de Roosevelt. Depois chegou o "Yes, we can", de Obama. E a seguir veio "Grab them by the pussy, Making America Great Again", de Trump.

Por este andar, digo eu, lá para Novembro (se não for já para semana), somos capazes de vir a ter o "We got him by the balls", de Hillary Clinton.

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mérito

por Sérgio de Almeida Correia, em 06.10.16

antonio-guterres.jpg

 

Por momentos pensei que o desfecho pudesse ter sido outro, apesar da consistência de que dera mostras nas provas anteriores e na forma aparentemente tranquila como as foi superando. A entrada em cena de um "fantoche" encomendado pela Alemanha e a chanceler Merkel, com a conivência da rapaziada às suas ordens junto da União Europeia, a começar pelo seu ilustríssimo presidente da Comissão, e com o eurodeputado Mário David (PSD/PPE) fazendo de mestre de cerimónias, levou a que durante algumas horas pairasse a solução de mais um desfecho medíocre na escolha do nome que o Conselho de Segurança da ONU iria propor à Assembleia Geral. Confesso, pois, que ao aperceber-me, ontem à noite, através de canais televisivos internacionais (CNN, France 24, BBC World e Al Jazeera) da escolha do nome de António Guterres para próximo secretário-geral da mais global e universal das organizações, fiquei imensamente satisfeito. Creio que a maioria dos portugueses, com excepção dos ressabiados e ignorantes da praxe, também terá ficado.

António Guterres poderá não ter sido um bom primeiro-ministro (eu acho que podia ter sido muito melhor), ou pelo menos o primeiro-ministro que os portugueses gostariam que tivesse sido, em especial no seu segundo mandato, quando os lobbies do PS e o país real lhe retiraram o tapete, mas isso não retira qualquer mérito ao resultado que agora alcançou e ao extraordinário trabalho que fez ao longo de dez anos em prol dos refugiados de todo o mundo. E, pelo ineditismo do processo que foi seguido, aliado à circunstância de ser a primeira vez que um ex-primeiro-ministro, que foi alto dirigente político, ter sido o indicado para ser proposto à Assembleia Geral para assumir o lugar, podem ser bons presságios para a ONU e para o Mundo.

Guterres deu provas de ser o melhor preparado para o lugar. A experiência política e executiva à frente do PS, de Portugal e do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), a fluência em vários idiomas, o espírito tolerante, apaixonado e humanista, talhado ao longo de décadas e de intenso trabalho cívico, a capacidade de intervenção em momentos críticos e de diálogo são hoje qualidades imprescindíveis no exercício de um mandato como o de Secretário-Geral da ONU. Viajante incansável, homem culto, civilizado e de carácter, incapaz de se envolver, directa ou por interposta pessoa nas moscambilhas e esquemas que proliferam na ONU e, lamentavelmente, ainda hoje em Portugal, na sequência dos maus exemplos herdados dos governos Barroso, Passos Coelho e Sócrates, Guterres reúne hoje um consenso à sua volta que é capaz de lhe dar as condições ideais para o desempenho de um mandato histórico, não obstante a agudeza e premência da resolução de problemas como a crise Síria, os refugiados, os desafios do clima e a protecção dos direitos humanos, com especial incidência nos Estados Unidos, nalguns países árabes, em África e na Ásia.

O histórico resultado alcançado, pela repercussão que está a gerar (basta ler a imprensa internacional e ver o que aí se escreve), faz do nosso compatriota uma esperança nas imensas capacidades da alma humana e no seu poder de superação das dificuldades. Mas é, ao mesmo tempo, sinal da responsabilidade e da maturidade adquirida por Portugal e os portugueses no mundo complexo das relações internacionais e da diplomacia.

O mérito de Guterres, indiscutível na forma como se preparou para o lugar e no alto nível da suas prestações, e que deve ser reconhecido, não pode ser dissociado do esforço colectivo, e não só dos portugueses, gerado em torno da sua candidatura. Porque em causa não está só o interesse nacional mas um mundo bem mais vasto, carente e perigoso do que o rectângulo, não podendo o futuro Secretário-Geral sofrer do mal geral do umbiguismo, nem reduzir-se a uma dimensão nacional que não é, nem nunca foi, a da gesta dos portugueses enquanto construtores de um mundo global, pacífico e equilibrado.

É justo por isso mesmo recordar que depois de Freitas do Amaral ter chegado a presidente da Assembleia Geral das Nações Unidas, de Jorge Sampaio ter sido Alto Representante da Aliança das Civilizações, de Portugal ter desempenhado um papel fundamental na mediação de alguns conflitos, de se assumir como um Estado de referência no diálogo Norte-Sul, na ligação da Europa com África, não só lusófona, e a América do Sul, do papel desempenhado na resolução do problema timorense, com uma intervenção extremamente meritória na Bósnia-Herzegovina, no Afeganistão, nos problemas da pirataria no corno de África, para só citar alguns exemplos, a eleição de Guterres constitui um marco histórico da diplomacia portuguesa, da sua capacidade de intervenção e um reconhecimento da sua valia.

De Guterres esperamos todos que seja mais do que o simples funcionário administrativo previsto no artigo 97.º da Carta da ONU, que seja capaz de promover as reformas de que a organização carece, e que até estas estarem concluídas consiga gerar os consensos necessários para poder fazer uma interpretação extensiva dos seus poderes, mostrando-se capaz de conferir à função a visibilidade, o papel e a dignidade que perdeu, servindo os interesses da paz e da justiça universais.   

Faço votos de que dentro de cinco anos, António Guterres, se tiver que deixar o lugar, conclua o seu mandato ainda com maior aclamação e apoio do que aqueles que geraram a sua escolha pelo Conselho de Segurança, cuja ironia maior residirá no facto do anúncio do seu nome ter sido feito pelo representante da Rússia, exactamente um daqueles países de quem se temia um veto à sua candidatura. Que honre o mandato que lhe vai ser conferido é o que desejo. Honrando-o estará a honrar o seu próprio nome e o nosso, de portugueses, cidadãos do mundo e para o mundo, dando voz a quem dele depende para compreender que a vida tem sentido, faz sentido e dá-nos sentido. A todos, e não só a alguns.

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capitão

por Sérgio de Almeida Correia, em 04.10.16

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 (1929-2016)

 

"Só nós sentimos assim"

Obrigado, meu capitão.

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