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Linhas em jeito de diário. Inspiração. Homenagem a espíritos livres. Lugar de evocação. Registo do quotidiano, espaço de encontros. Refúgio de olhares. Espécie de tributo à escrita límpida, serena e franca de Marcello Duarte Mathias.
Se quanto à competência, experiência, empenho e seriedade na resolução dos problemas de Macau e das suas gentes já todos sabíamos com o que podíamos contar, as dúvidas que poderiam restar sobre o seu desempenho colocar-se-iam num outro patamar. Em política não chega a boa vontade. Em especial quando estamos perante tarefas assaz complicadas e que, para além de capacidade de gestão e decisão, implicam a indispensável confiança de quem está acima e o espaço de manobra político para que se possa executar e levar a bom termo o que se impõe.
Daí que, na sequência de anteriores declarações, continue a ser digna de registo a forma expedita e desarmante – para quem se habituou a ver o exercício do poder como uma sucessão de cortes de fitas, distribuição de subsídios e o cumprimento de obrigações sociais – como o Secretário para as Obras Públicas e Transportes do Governo da RAEM tem cumprido o seu mandato.
Ontem, na Assembleia Legislativa, voltou a ser assim quando, sem pestanejar nem gaguejar, disse que desde há 15 anos caiu a qualidade das obras públicas e que os primeiros a assumirem responsabilidades deviam ser os construtores civis.
Faltou dizer que essa queda da qualidade construtiva foi inversamente proporcional à subida especulativa dos preços, às derrapagens descontroladas (porque também as há controladas) e à voragem que de então para cá se verificou por parte de uns quantos responsáveis e empresários, alguns já atrás das grades, outros aguardando que lhes apresentem a factura da sua desmedida gula.
Mas é evidente que Raimundo do Rosário não podia ir mais longe, ou ser mais claro, numa casa onde os interesses de construtores civis e empreiteiros têm sido, desde há várias décadas e não tão raramente quanto seria de esperar, disfarçados de interesse público. Logo ali, num hemiciclo onde a defesa dos cidadãos de Macau foi transformada por alguns dos que deviam ser os seus primeiros defensores numa palavra vã destinada a encobrir a satisfação de interesses próprios, alguns também menos próprios, bem como os de meia dúzia de acomodados, seus parentes e clientelas afins, que muito pouco têm feito pelo desenvolvimento de Macau e o engrandecimento das suas gentes.
O mea culpa que na Assembleia Legislativa se fez pela voz do mais alto responsável pelas Obras Públicas, e que ecoou dentro e fora de portas, constituiu um acto de indiscutível relevo político. Inédito pelo tom e pela clareza, é certo, mas também revelador de uma vontade de cumprir, e cumprir bem, isto é, no interesse da RAEM, o mandato que lhe foi dado. Em política, e num ambiente hostil e desconfiado, isto tem um nome: coragem.