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eleições

por Sérgio de Almeida Correia, em 20.02.24

Bolteim Voto 2024 legisaltivas.jpg

Enquanto não for operada uma reforma da legislação eleitoral, que mantendo a segurança diminua a burocracia, reduza custos e assegure maior rapidez do processo de votação e escrutínio, lá começaram a chegar as cartas da Secretaria-Geral do Ministério da Administração Interna contendo a documentação necessária ao exercício do direito de voto por correspondência, por parte dos cidadãos residentes no estrangeiro, para as eleições legislativas de 10 de Março.

Pode ser que desta vez, não havendo mais feriados e greves pelo meio, sejam contabilizados os milhares de votos que nas últimas eleições ficaram por contar.

Entretanto, gostaria de perceber qual a razão para que nos boletins de voto os nomes dos partidos e coligações que se apresentam a sufrágio surjam nalguns casos só em maiúsculas.

Quem olha para o boletim não pode ficar indiferente, visto que aquelas saltam de imediato à vista e, nessa medida, as forças concorrentes que têm o seu nome impresso exclusivamente em maiúsculas acabam por ser favorecidas.

Desconheço qual seja a magna razão que leva a que nos boletins de voto os nomes de "Nós, Cidadãos!", "Reagir Incluir Reciclar", "Bloco de Esquerda", "Iniciativa Liberal", "Juntos pelo Povo", "Ergue-te", "Partido Socialista" e "Volt Portugal" não surjam grafados nos mesmo termos em que aparecem "ALTERNATIVA 21", "ALTERNATIVA DEMOCRÁTICA NACIONAL", "ALIANÇA DEMOCRÁTICA", "CHEGA", "NOVA DIREITA", "LIVRE" e "PESSOAS-ANIMAIS-NATUREZA"? E a "CDU - Coligação Democrática Unitária" também é diferente porquê? Não faria sentido que os nomes surgissem todos uniformizados, com o mesmo tipo de letra e recorrendo a igual critério no uso de maiúsculas, tal como acontece com as siglas?

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animais

por Sérgio de Almeida Correia, em 01.02.24

(créditos: daqui)

Confesso que ainda estou chocado.

Nos últimos dias tenho pensado muitas vezes no que aconteceu. E só de pensar imagino-me a contorcer-me e a sentir o sofrimento atroz que foi infligido a um homem, preso, que condenado à pena capital em 1988 assistiu 34 anos depois ao falhanço, com sequelas, da primeira tentativa para a sua execução, cuja macabra concretização só ocorreu há alguns dias.

Da primeira vez, em Novembro de 2022, o desgraçado estivera durante quatro horas amarrado a uma maca para ser depois devolvido à sua cela devido à manifesta incompetência dos seus carrascos, incapazes de encontrarem uma veia adequada para lhe injectarem o líquido letal antes de expirar o prazo para execução da sentença de morte.

A opção, desta vez, passou por fazer do preso uma cobaia e matá-lo por asfixia usando uma máscara para onde foi bombeado nitrogénio. Fazendo-o respirar o gás e sofrer até que a asfixia fosse completa, de modo que pudesse viver cada segundo de agonia a plenos pulmões. Com outros a assistir ao espectáculo do sofrimento, como se este fosse uma espécie de justiça divina carregando em si a reconciliação e a esperança. 

É óbvio que quando um dos carniceiros que faz de Solicitor General do Alabama diz que o processo escolhido foi “o menos doloroso e mais humano que se conhece”, LaCour só mostra porque não passa de um primitivo saído do largo esgoto do trumpismo, com vasto cadastro em matéria de direitos humanos, que justifica a barbárie em pleno século XXI e os procedimentos macabros de execução do prisioneiro usando uma linguagem só compreensível para si e para cafres de igual linhagem.

Estranho, em particular, nesta miséria global em que vivemos e não conhece fronteiras, que tantas organizações devotadas à protecção e ao bem-estar animal não se tenham insurgido e manifestado em todo o lado e a toda a hora, com a mesma veemência com que o fazem contra as touradas, perante aquilo a que assistimos no Alabama, continuando todos sentados no conforto dos seus gabinetes, enquanto tomam um cafezinho e discutem a emergência climática com o vizinho que está de comando na mão a regular a temperatura do ar-condicionado ou a fazer zapping para ver as diatribes dos ignaros que por aí  se dedicam a invadir museus e a destruir património que pertence à memória de todos os povos, pensando que com isso arregimentam adeptos para a sua causa.

Tirando uma ou outra peça nos noticiários, um artigo nos jornais e as tomadas de posição de algumas organizações de defesa dos direitos humanos, esta selvajaria, que remete os EUA e a Humanidade para um estado pré-animalesco, onde desprovidos de tudo, de intelecto, da mais leve racionalidade ou de qualquer sentimento conhecido, nos dedicamos à grotesca exterminação da nossa própria espécie, infligindo o maior sofrimento possível ao condenado, sem qualquer ponta de compaixão ou remorso, aconteceu sem que as nações que se consideram civilizadas se levantassem em uníssono a condenar o sucedido.

Ignorou-se a imposição de sanções, como tantas outras vezes se faz por questões menores, a começar pela União Europeia, e esqueceram-se de colocar os carniceiros numa qualquer lista de pessoas a evitar, impedindo-as de viajar e entrar em países terceiros, sujeitando-as internacionalmente a perseguição criminal.

Como se LaCour ou os executores do homicídio de Kenneth Smith fossem melhor que os projectistas da "Solução Final", os funcionários de Treblinka ou de Auschwitz-Birkenau, os suicidas do Hamas, os seus sósias da IDF, os carniceiros putinescos, a escória fardada do Mianmar, os talibãs afegãos, ou tantos outros vermes que andam por aí à solta sem que nada lhes aconteça.   

Sim, porque se mais não se ouviu da parte dos defensores e das organizações protectoras dos direitos dos animais, não terá sido por falta de vontade, de meios ou de megafone, mas antes porque a preocupação com os maus-tratos às galinhas ou aos bovinos, inteiramente devida, certamente terá uma qualquer outra dimensão, inatingível para mim, que a torna incompatível com a protecção da nossa própria espécie e os remete ao silêncio.

Uma democracia que se preze, um Estado de direito, um país que queira ser visto pelos outros como civilizado e desenvolvido, não pode continuar a conviver com a pena de morte como se fosse uma qualquer teocracia fundamentalista ou uma dessas autocracias "democráticas" da Ásia. Muito menos permitindo execuções com o grau de sadismo imposto ao condenado do Alabama.

É em momentos como o que correu nos EUA que sinto verdadeiro asco por alguns dos meus semelhantes; como se não fossemos todos da mesma espécie, não tivéssemos direito a respirar o mesmo ar, numa espécie de sentimento misto de desprezo e revolta que com todas as forças procuro combater, para não ser como eles, e que jamais conseguirei compreender. 

Antes o regresso à guilhotina, ao tiro na nuca ou ao pelotão de fuzilamento.

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ferrari

por Sérgio de Almeida Correia, em 30.01.24

Tirando o facto de ser falado em inglês e Il Commendatore ser um cepo nessa língua, mostra bem o que foi o culto das Mille Miglia e porque tantos durante tantos anos se renderam aos seus encantos.

Belíssimas imagens, uma sonoridade invulgar de motores que deixaram muitas saudades, destacando-se os papéis de Adam Driver, da sempre espantosa Penélope Cruz e do jovem que se assume como Piero Lardi Ferrari. A caracterização de Carlo Chiti, com quem me cruzei algumas vezes, está excelente.

A sequência final, após o acidente de Guidizzolo, embora espectacular, ficou um pouco aquém do que antecedeu e surge como uma quebra na narrativa. Mas nem por isso deixa de ser um belo filme de Michael Mann, concluído, curiosamente, no ano em que a Ferrari venceu a Corrida do Século.

A ver, e talvez a rever se houver tempo para apreciar alguns detalhes.

Ferrari 2023.jpg

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lerdos

por Sérgio de Almeida Correia, em 29.01.24

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Um novo espaço, novas salas de cinema, um filme que prometia, ali no Lisboeta.

Como ainda havia tempo disponível antes da sessão, vinham mesmo a calhar uma cerveja e umas pipocas salgadas. A opção foi por uma Kronenburg 1664 Blanc. Paguei e pedi um copo, pois recuso-me a emborcar pela garrafa, à trolha. A resposta foi que se quisesse um copo teria de pagar mais MOP$2,00 (duas) patacas. Como disse? Deve estar a brincar. Ou me trazem um copo ou me devolvem o dinheiro. Veio o superior. Pediu muita desculpa, perguntou se podia ser de plástico (continua a haver copos de plástico) e de uma marca de cerveja japonesa. 

Há dias, no intervalo de um concerto, no bar do Centro Cultural de Macau, também verifiquei que não havia copos para quem quisesse beber um copo de vinho. Como as garafas são pequenas devem querer que se beba o vinho como fazem com a cerveja. 

A qualidade do serviço prestado por alguns concessionários, tanto faz serem grandes como minúsculos, é cada vez pior. Parece que ninguém se importa e até haverá quem ache normal com o nível de exigência dos "turistas" que nos visitam. É o culto da mediocridade a todos os níveis. O que importa é facturar.

Depois de algumas tascas começarem a cobrar pelos lenços de papel que fazem a vez dos guardanapos, e de quererem que nos habituemos à esferovite, aos plásticos e aos cartões, entrámos agora na fase da cobrança pelo copo.

Um destes dias também nos vão cobrar nos restaurantes pelos pratos de louça, os pauzinhos (fai chi) e os talheres, ultrapassada que esteja a fase de nos tirarem os talheres dos pratos sujos para os alinharem em cima da toalha da mesa, quando há.

Teremos então estabelecimentos com estrelas Michelin para ricos, e espeluncas para todos os outros, sem meio-termo para gente normal.

Pode ser que desta forma, e com estas inovações todas para protecção do ambiente, consigamos ultrapassar os 30 milhões de "turistas". E se comece a comer com as mãos para se poupar na água e no detergente. 

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censura

por Sérgio de Almeida Correia, em 26.01.24

57 Ilustrações de Capela sistina | Depositphotos

O cancelamento pela direcção do Instituto Cultural do espectáculo "Made by Beauty", inserido no Festival Fringe, ontem dado a conhecer pela rádio e televisão e hoje largamente divulgado pela imprensa, é mais um sinal da regressão social, política e cultural a que temos vindo a assistir na RAEM desde que deixou de ser governada pelas suas gentes e os pseudo-patriotas se assenhorearam dos seus destinos.

Estamos perante uma manifestação da mais acabada censura e um ataque de puritanismo hipócrita, bacoco e medíocre numa cidade em que se não fosse a convivência ao longo dos séculos entre múltiplos costumes, culturas e "vícios" que lhe moldaram o carácter e a fisionomia, internacionalizando-a sob múltiplas formas, da literatura à poesia, e da pintura à gastronomia, ao cinema e ao desporto, nunca teria atingido o estatuto que tem e que o Governo não se cansa de reafirmar que se quer cosmopolita, aberta ao mundo e um "centro mundial de cultura e lazer".

Quem o afirma, percebe-se por decisões tão estapafúrdias quanto esta, não tem a mínima noção do que diz, desconhece Macau e a sua história e o sentido do conceito que apregoa como se fosse uma mezinha para todos os males que nos afligem.

Em Macau sempre houve locais e espectáculos para todos os públicos, muitos com nudez integral e frequentados por altos responsáveis políticos e administrativos, antes e depois de 1999, e que se ultimamente desapareceram não foi porque se tivesse subitamente transformado numa espécie de Sodoma ou Gomorra, mas sim devido aos sucessivos ataques de ignorância, alimentados por um conjunto de parolos, subsídio-dependentes e bufos de língua acastanhada, que muito têm contribuído para a sua progressiva descaracterização e estupidificação. Do ensino aos costumes.

O espectáculo em causa foi publicitado, pelo menos desde 23 de Dezembro de 2023 na Internet, numa página oficial do Governo da RAEM, e também noutra do Instituto Cultural, aí se dizendo claramente, que "num mundo disparatado é preciso ser-se atraente", e que incluiria "lábios vermelhos, costas profundamente decotadas, minissaia, meias de vidro pretas, saltos altos", convidando-se a audiência "a explorar os conceitos universais da atracção física", colocando de lado "a moralidade e a racionalidade". Acrescentava-se ainda que era um espectáculo para maiores de 18 anos, adultos, portanto, e que continha "linguagem obscena e nudez que poderão ofender a sensibilidade de alguns espectadores". Não havia aqui nada que enganar, só iria quem quisesse e crianças não podiam entrar, pelo que se fica sem perceber se os responsáveis do Instituto Cultural estavam à espera de um espectáculo de catequese ou com a Heidi e o avôzinho. 

O cancelamento do espectáculo "Made by Beauty", independentemente dos respectivos méritos ou deméritos, é de tal forma incompreensível porquanto essa mesma performance já teve lugar em cidades do Interior da China, tendo mesmo sido incluído em Outubro e Novembro passado no Festival de Teatro Shekou que ocorreu em Shenzhen.

Não houve, evidentemente, qualquer divergência ou incompreensão em relação ao conteúdo, pelo que bem andaram Sarah Sun e o grupo Utopia de Miss Bondy de recusarem mudar "a cor das collants dos bailarinos", de não aceitarem a proibição do uso de dragões, por não poderem ser utilizados “de forma sexy” (!), ou a substituição de “adereços de pénis por um copo de vinho”.

A progressiva infantilização e imbecilização da sociedade de Macau, tão patente nos anúncios, avisos e publicidade de organismos governamentais e do IAM, vai assim continuar, juntando à censura de opinião crítica nos jornais, rádio e televisão, a censura às manifestações artísticas e culturais, sinal da regressão idiota que nos levará inexoravelmente a um sub-sistema, nem capitalista nem socialista, gerido por puritanos e patriotas de alcova que se escandalizam quando vêem uma "drag queen" de collants num espectáculo para adultos, mas depois consideram normal, como já se ouviu na Assembleia Legislativa, dar uns tabefes na mulher se ela se portar mal, manter concubinas em várias cidades e vasta prole fora do casamento, por vezes escondendo os filhos, admiram o jogo e tudo o que lhe está associado, embora depois não faltem a uma missa, a papar hóstias ou a desfilarem compungidos na procissão do Senhor dos Passos, e sejam os primeiros a impor a moral e os bons costumes na escola e no espaço público de admissão reservada.

Enfim, nada que seja muito diferente daquilo que fez há séculos o Papa Paulo III, Alessandro de Farnese, que sendo cardeal ficou conhecido, entre outras coisas, por proteger e promover a sua própria família, fazendo-a enriquecer e levando uma vida dissoluta, na qual arranjou uns quantos filhos por detrás da porta, mas depois indicou Biagio de Cesena, um palerma pedante, para vigiar o trabalho de Miguel Ângelo, mandando-o cobrir partes dos corpos das figuras e criticando os desenhos "obscenos" da Capela Sistina, pintados por aquela que terá sido, talvez, a mais espantosa figura da Renascença, símbolo maior da arte, da verdade, da inteligência, da humildade e das verdadeiras virtudes da Humanidade.

Tempos de felicidade, e estes sim obscenos, são aqueles que hoje vivem os residentes de Macau, naquela que será mais uma prova do indiscutível cumprimento da Declaração Conjunta Luso-Chinesa e da luz que emana da forma como a Lei Básica está a ser cumprida e se tem aprofundado o princípio "um país, dois sistemas".

Tão aprofundado que nalguns momentos até parece ter caído ao fundo de um poço.

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notas

por Sérgio de Almeida Correia, em 24.01.24

(créditos: daqui)

Duas notas rápidas para estes dias frios de Inverno em que Macau é assolada por mais uma monção vinda do coração do Império do Meio.

A primeira é uma nota de satisfação pela conclusão e abertura ao público do viaduto da Rotunda da Piscina Olímpica, que faz a ligação entre a Avenida Marginal Flor de Lótus, na Taipa, e a Avenida dos Jogos da Ásia Oriental. Trata-se de uma obra útil e que fazia muita falta, desanuviando o trânsito na rotunda e libertando os agentes policiais dos embróglios em que se metiam de cada vez que queriam orientar o trânsito. Para quem se dirige a Coloane ou para a Universidade é um ganho importante e que deve ser saudado na acção da tutela dos Transportes e Obras Públicas. Tem havido muita coisa má, algumas péssimas, outras sofríveis, mas desta vez também aqui fica uma nota de aplauso. Quando as coisas se fazem bem, resolvem problemas aos residentes, e isso significa um contributo para a melhoria da sua qualidade de vida, só há que dar os parabéns.

A segunda nota é de estranheza. Muita estranheza. Alguém devia questionar os Serviços de Saúde e o Centro Hospitalar Conde de São Januário sobre as razões que levam a que numa região como Macau, com um PIB per capita dos mais elevados do mundo e os casinos a facturarem milhões, a máquina destinada aos exames de perimetria, área de oftalmologia, esteja avariada há cerca de dois anos. Esta manhã estava de novo inoperacional. Por mais do que uma vez são marcados exames e os doentes não os podem fazer com a desculpa de que a máquina não está a funcionar. Não é normal que o equipamento numa área tão sensível e importante para a vida da população esteja avariado há tanto tempo, não se percebendo porque continuam a ser marcados exames que afinal não podem ser realizados. Máquinas de perimetria não faltam; e mesmo em Portugal e na União Europeia há algumas à venda fabricadas aqui ao lado, na China, a preços muito razoáveis. A não ser que haja razões, que a razão não alcança, que justifiquem mais essa vergonhosa situação. O problema não deverá ser de comissões. Investigue-se, pois.

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retardador

por Sérgio de Almeida Correia, em 16.01.24

Macau Jockey Club, horse racing(créditos: AGB)

Ao que parece, ninguém, nem mesmo o Governo da RAEM, que já andava em conversas com a concessionária, terá ficado surpreendido com o anúncio do fim da concessão do Macau Jockey Club

Para além de na altura da prorrogação da concessão, atentas as condições em que ocorreu, com dívidas vencidas à RAEM e obrigações por cumprir, muitos se terem questionado sobre as razões que estavam por detrás da outorga de um período extenssíssimo, que só terminaria em 31 de Agosto de 2042, certificou-se ontem ter sido essa mais uma má, péssima, decisão pela qual, creio, ninguém será responsabilizado.

E as razões para a responsabilização seriam imensas, visto que a decisão correcta não teria sido a prorrogação da concessão, mas sim o seu resgate, o que há muito deveria ter acontecido tantas eram as obrigações por cumprir. 

Paulo Chan, ao tempo responsável pela DICJ, justificou a decisão, estranhamente, com a necessidade de diversificação. Diversificação de quê se na altura já havia milhares de milhões de dívidas? Da má gestão?

Sim, porque como foi devidamente sublinhado, se a situação do Macau Jockey Club era aterradoramente má, e a empresa estava à beira do abismo, porque quis o Governo que fosse então dado um passo tão insensato, prorrogando a concessão, para se acabar agora com as corridas de cavalos, quando ainda faltam quase duas décadas para o fim do prazo acordado? Mas havia alguma coisa naquela situação em que uma pessoa normal pudesse acreditar que iria correr bem?

Não é preciso sequer ir tão longe, como fez Niall Murray, comparando Macau com Hong Kong, porque para fazer é preciso saber.

E o que era estranho antes, ainda mais obscuro se tornou depois da publicação da Ordem Executiva n.º 2/2024 e de mais duas surreais conferências de imprensa.

Na primeira, a do Secretário para a Administração e Justiça, ficámos a saber que afinal está tudo bem, que o Governo aceitou o pedido de rescisão porque a concessionária "não conseguiu obter benefícios económicos nem sociais", e que "ainda que a companhia não tenha cumprido o estipulado no contrato de concessão e agora tenha pedido a rescisão, o Governo não vai receber nenhum tipo de compensação", até porque o contrato negociado entre as partes, isto é, pelo anterior Governo, não continha outras penalidades para além da suspensão ou da rescisão.

O brilhantismo desta explicação só seria ultrapassado com o facto da própria concessionária, Companhia de Corridas de Cavalos de Macau, S.A, na segunda sessão, confessar que no momento da prorrogação da concessão não tinha condições, objectivas e realistas, para poder cumprir os seus sonhos megalómanos.

A pandemia foi a machadada final, visto que deixou de ser possível continuar a "empurrar com a barriga" ou a varrer para debaixo do tapete, tantos eram os buracos que este apresentava.

Esperemos que, entretanto, até 31/3/2025, a situação dos trabalhadores, dos cavalos e dos credores se resolva, e aquele espaço não veja lá crescer mais um mega empreendimento imobiliário ou um parque de diversões com mais bonecada horrorosa e deusas de milhões. Mas ao olhar-se para o que vinha e para o que temos ficam-me no espírito apenas duas ideias: ou o Governo foi enganado quando prorrogou, ou foi uma prorrogação de favor.

As duas hipóteses são más. Não acredito em nenhuma.

Apesar do que aconteceu com o Macau Jockey Club, pelo que publicamente se conhece, ter todos os contornos para ser mais um, diria mesmo vários, casos de polícia.

Ou seja, continua a haver, para quem está de fora, uma história mal contada. Os residentes de Macau não são burros e há quem até pelo cheiro perceba logo quando as coisas estão "fora da lei" ou se meteu uma patada.

Ninguém estranharia, pois, que se não ficasse por aqui e as autoridades competentes investigassem o que houvesse a investigar.  

De acordo com a lei, naturalmente, expressão que ultimamente alguns dizem a toda a hora e para mim começa a trazer muita água no bico porque ninguém que actue de acordo com o princípio da legalidade tem necessidade de estar sempre a justificar o que faz invocando a lei e sem que antes se lhe aponte qualquer ilegalidade.

A não ser que alguém tivesse o objectivo, pura imaginação minha, de querer que todos ficassem com a mesma farda na fotografia. Os que negociaram antes e prorrogaram, deixando uma bomba ao retardador; os que negociaram depois e se comprometeram numa rescisão sem qualquer compensação. Por culpa dos que estavam antes, evidentemente. 

É mais uma longa metragem de horror que se perspectiva para as próximas edições do Festival Internacional de Cinema de Macau. Agora na vida real e sem os subsídios habituais.

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escabroso

por Sérgio de Almeida Correia, em 11.01.24

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Em tempos já me tinha mostrado preocupado com o papel (não me refiro a dinheiro) que alguns "empresários" locais desempenham e com a imagem que transmitem de alguns "negócios" em que se envolvem. Foi em 2019 e estava em causa uma crónica de Diniz de Abreu sobre "O descalabro da Global Media". 

Entretanto passaram-se mais de quatro anos. O descalabro, se tal é possível, agravou-se, e estamos a assistir à continuação de uma escabrosa novela, sempre com um conhecido empresário local e destacado patriota na ribalta. 

Que o negócio da Global Media e alguns "investimentos" em Portugal começavam a cheirar mal não constitui novidade.

Que o nome do principal accionista do grupo Global Media volte à tona também não.

O que representa novidade é saber-se, de acordo com o que foi dito por José Paulo Fafe na audição que decorre na Assembleia da República, que tenham sido descobertas dívidas no valor de "2,1 milhões [de euros] em Macau e 700 mil euros em Malta em empresas de jogo 'online' que nunca funcionaram, ou melhor, de licenças de jogo 'online'".

Haverá sempre a possibilidade de se leiloar a Medalha de Mérito Industrial e Comercial para pagar alguma coisa, mas as afirmações são suficientemente gravosas para deverem ser devidamente esclarecidas. É que fiquei sem perceber se a dívida de 2,1 milhões em Macau diz igualmente respeito a empresas de jogo 'online' que nunca funcionaram ou a licenças de jogo 'online'. 

Não é por nada, mas independentemente de continuarem actuais as perguntas que formulei em 2019 [No fim, a gente revê o filme e só pergunta, entre nós, aqui, que contribuição deu Kevin Ho, através da Global Media, para a credibilidade e prestígio dos empresários de Macau? E aos investimentos chineses na Europa? Que confiança se transmitiu?], a coisa fede, sendo ademais conveniente recordar que também por causa do jogo online e outros "cambalachos" similares há quem esteja na RAEM a cumprir pesadas penas de prisão.

E todos eles foram patriotas, durante anos a fio, enquanto havia cacau para fazer o chocolate que era depois distribuído por outros patriotas que ultimamente, sabe-se lá porquê, até clamam, para espanto meu que sempre os conheci avarentos, discretos e mudos, por portais de transparência e, imagine-se ao que isto chegou, querem saber os critérios, as razões e os valores das adjudicações nas obras públicas.

Ou me engano muito ou deve estar na altura de um conhecido advogadode Macau prestar mais um serviço caritativo, escrevendo novo artigo no Diário de Notícias. Antes que o jornal feche ou acabe a gestão patriótica da Global Media.

A internacionalização tem os seus custos. Aquele senhor que queria transformar Tróia numa espécie de Marbella e estava a fazer um hotel e um casino em Cabo Verde que o diga. Às vezes é preciso meter algum "kumbu". Não é o mesmo que dar entrevistas à imprensa local destinadas a talentos.

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aniversário

por Sérgio de Almeida Correia, em 28.12.23

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Em circunstâncias normais, apesar de não saber muito bem o que isso seja, completaria hoje noventa e quatro anos. Alguns dirão que é “uma idade bonita”, o que na verdade se aplica a todas as idades. As idades são sempre bonitas, os aniversários são sempre felizes; se o seu cumprimento, é claro, for mais do que um ritual e menos do que uma obrigação. Celebrar aniversários por obrigação é um horror. Celebram-nos nessas circunstâncias os que são empurrados para viver, e a viver, de acordo com os “desígnios” do Senhor e as leges artis de quem deles cuida até à exaustão. Pode-se sempre desistir quando se toma uma decisão. A liberdade é o princípio e o fim da razão quando, há muito, tudo deixou de fazer sentido. O mundo lá fora deixou de me interessar. Repete-se para os que lá estão, para os que andam por lá. Não mais para mim. Livros, revistas, televisão, mundanidades; qual o interesse? Se o confinamento cansa, se a minha autonomia parou num tempo cada vez mais longínquo, se insistem no que não me apraz, não quero e se me afigura impertinente ou despropositado, a quem me poderei queixar? E vê-los, a eles e a elas, a entrar e a sair, virando-me para aqui e para lá, porque é preciso evitar as escaras, e me querem sempre de boa cara, não torna a ilusão menos pungente. Antes faz o sofrimento, o cansaço, a solidão, o desconforto cada vez mais duradouros, mais desumanos, eternizando cá em baixo o que eu não sei se existe noutro lado, ou se será apenas mais uma ilusão, aqui e lá. E se não existe de todo, como negar-me, e a outros, o direito de condignamente me retirar, aproveitando o silêncio e a escuridão da noite, antes que dêem pela minha ausência quando a aurora raiar. Ah, como seria bom que tudo tivesse sido diferente, mais alegre e efusivo, sem a soturnidade crepuscular de uma velhice triste e distante que se prolonga pela manhã, a tarde e a noite de semanas, por meses a fio, que se repete todos os Natais e aniversários, faça chuva ou faça sol. E depois cantam canções alusivas, sempre desafinados, e ainda vêm uns velhos e umas velhas que me fazem festas na cara e na cabeça sem que eu queira, ou lhes peça, como se agora fizesse parte da sua família quando a minha está ausente e já se me confundem as horas e os rituais. E se eu não quero beber água, coisa de que aliás nunca gostei, querem-me obrigar para quê? Neste estado, quero lá saber que sobrevenha uma insuficiência renal. Que é isso comparado com as quarenta e oito horas dos meus dias que há tantos anos se acrescentam? Sim, eu sei que alguns terão saudades, me sentirão de menos, continuarão a recordar estes e outros anos, mais iluminados, menos pesados, não tão frios; sim, porque passou a estar sempre frio e depois vêm dizer-me que está calor e que “hoje está bom para ir à praia”. E que esteja. Se daqui não posso sair isso também não me importa. Também não quero ir. De há uns bons maus anos para cá passou a estar sempre frio. Tudo passou a ser desagradável, monótono, triste, a modos que sem jeito. Agora é que vai ser. Não vou ficar para o Natal. Não tenho mais paciência para isto. É o termómetro, são os comprimidos, é o zingarelho enfiado no dedo. Pois é, quero lá saber dos níveis de saturação, dos exercícios, das vacinas. Vão-me dar mais uma? Porquê? Se são felizes assim, a mim não me perturba. Na verdade, tornou-se-me indiferente. Um destes dias isto acaba. Tanta coisa para continuar aqui à espera da chegada do Verão, sem que eu saiba se o Inverno acabou quando me esqueço já das cores da Primavera e do Outono sei apenas que existe quando mo dizem. O senhor doutor já é avô. A triplicar. O outro também, embora continue a ser "o tio". Um avô sui generis. Este sempre foi diferente. Era terrível. Dava dores de cabeça à mãe. Os miúdos estão todos crescidos. E são pais e tios. Estou farto dessas zurrapas. Sopa, mais sopa, uma açorda às vezes, empadão. Sabe tudo ao mesmo. Gelatina, fruta em calda. Se está bom? Está sempre bom. Uma porcaria, e depois engasgo-me. Sempre a mesma sina. Há que ser aspirado. Nada funciona. Nem sei para que como. Querem que eu coma, que tome os comprimidos, que beba água. Os outros foram-se todos embora. Fiquei eu. E os velhos. São mais novos? São velhos na mesma. Tudo velho, tudo velha. E eu aqui continuo. Agora acabou-se. Hoje vem rancho reforçado? Não quero. Fazer-lhes a desfeita não é bonito. Vou fazer de conta. Está bem, sim, está bem. Até amanhã. Amanhã acaba hoje. Hão-de cansar-se, fartar-se. Não entra mais nada. Não abro mais a boca. Estou cansado. Não percebem isso, não percebem nada. Gosto muito de todos, mas deixem-me em paz. Agora é que é. Estou farto disto. Este ano não há circo. Quero lá saber do Pai Natal. Vão enfiar o barrete na cabeça de outro. Não há mais fotos. Não fico para o bacalhau. Nem para os meus anos. Guardem os parabéns. Passem sem mim. Vou-me embora. Deixem-me em paz. Acabou-se. Bebam vocês a água. Adeus. Não me chateiem.

 

[Ainda tão perto e já longínquo. Dezoito dias depois de tudo ter acabado. Hoje bebo à sua. Esta estava guardada para um dia. Calhou ser hoje. De um amigo para um amigo. É dia de aniversário. Nada de água. Celebremos a vida. Todos os anos neste dia. Como sempre gostou que se fizesse entre risadas e traquinices. Com todos. Filhos, noras, afilhados, sobrinhos, netos, amigos, amigas, vizinhos, com quem aparecesse. Por vezes sob o olhar espantado e censurante das meninas lá de casa. Que depois também se riam. À sua, Pai. Até um destes dias.]

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pagodeira

por Sérgio de Almeida Correia, em 06.12.23

Os dias continuam a ser férteis em notícias, umas menos interessantes do que outras.

Por um lado, tivemos a notícia de que as "aplicações financeiras da RAEM registaram no ano passado perdas de 6,5 mil milhões de patacas", o que me leva a questionar se a "volatilidade dos mercados" a que se referiu o Secretário para a Economia, quando quis justificar esse número aos deputados, não será de outra natureza.

Era interessante saber que investimentos foram feitos pelo Governo de Macau, qual o seu tipo, que riscos se correu, que entidades foram as beneficiárias desses mesmos investimentos, e quem foi o responsável pela decisões que implicaram uma perda da dimensão assinalada.

Não é por nada, mas se esse dinheiro tivesse sido distribuído à população, ou investido na rede viária, teria sido certamente muito mais benéfico para todos e sempre se teriam poupado as comissões pagas a bancos, intermediários e a todos os outros comilões que gerem esse tipo de investimentos.

Numa empresa privada, o responsável pelas perdas teria sido responsabilizado. E no Governo da RAEM? Fica tudo na mesma? Quem foram os magníficos gestores e decisores? Era importante saber, até para que no futuro não continuem a perder o dinheiro dos contribuintes.

Ontem foi também anunciada a emissão da nova geração de bilhetes de identidade (BIR) para os residentes.

A Direcção dos Serviços de Identificação (SIM) tem sido uma das pouca entidades da Administração Pública da RAEM, muito por mérito da discreta Secretária para os Assuntos Sociais e Cultura, que prestou ao longo dos anos um bom serviço a Macau e aos seus residentes. Justiça lhe seja feita. Mas ultimamente, desconheço se por consequência da saída daquela para exercer funções de governação, têm surgido nos SIM alguns atrasos, confusões, não sei bem como lhes chamar, em relação a algumas situações relacionadas com a emissão dos BIR.

Os objectivos que estão por detrás da emissão dos novos documentos de identificação parecem-me mais do que compreensíveis, mas como um amigo já me havia chamado a atenção, percebe-se mal que se anuncie a apresentação de pedidos online quando as fotografias para esse documento continuam a necessitar de ser obtidas em empresas que colaborem com o Governo, há limitações em matéria de idade e é obrigatório o levamento pessoal do documento depois de emitido.

Ou seja, não só continua a ser preciso as pessoas deslocarem-se, seja às lojas de fotografia ou aos serviços, sem que se perceba qual a vantagem do pedido online, como continuamos muito longe do serviço prestado noutros locais.

Querem um exemplo? O Reino Unido renova os passaportes dos seus nacionais online, mesmo para quem esteja a residir em Macau, e remete-os depois pelo correio. Limpinho, sem filas, sem agendamentos, sem deslocações a lojas específicas.

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amigos

por Sérgio de Almeida Correia, em 02.12.23

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Esta tarde estive a ler um livro de amigos oferecido por um amigo. Dei comigo a pensar neles. Nos amigos. E nelas. Na distância a que estou de muitos, nos aniversários que tenho perdido, nas horas infindas de conversa e cavaqueira, nos disparates, nos dias, almoços, jantares e noites que acabam para podermos descansar e começar outro dia, nas discussões, nos risos, nos abraços, nos beijos que trocámos ao longo de uma vida, nos olhares cúmplices, no riso sincero, desprendido, nos segredos que guardamos, na confiança que temos, na teimosia, tantas vezes, com que nos brindamos mutuamente. Nas críticas, nos amuos, na forma como nos olhamos, respeitamos, amamos. E tantas vezes nos perdemos para sempre nos reencontrarmos. Há tempos vi um num supermercado, a milhares de quilómetros de casa. Fazia perguntas à operadora da caixa enquanto guardava as compras. A T. reconheceu-o, mais velho, ao fim de uma data de anos, pelas perguntas que fazia à sujeita. E atirou-lhe com ar sério um "o senhor nunca mais se despacha?". A senhora do supermercado, que ia respondendo às perguntas a ver se o fulano se ia embora, sorriu e riu-se para dentro. Deve ter rido com gosto. Pudera. É preciso ter lata. O tipo, mais velho, levantou os olhos, sem perceber o atrevimento. Começou a rir-se, deu-me um abraço quando me viu, ao fim de mais de 20 anos. E perguntou-me se continuava a escrever. Sim, continuo. E tenho os mesmos amigos. E mais uns, mais recentes, tão bons como os antigos. Penso muito neles. E nelas. Algumas também meias-irmãs, outras ex-semi-namoradas. Amigas. Amigos. Têm tomado conta de mim ao longo da vida. E feito de mim o que sou. Gosto muito dos meus amigos. É uma confissão. Uns são mais velhos, outros mais novos, uns mais sisudos, outros mais impertinentes, também há alguns que são do Porto, outros do Sporting. Atrevidos e atrevidas. Uns com mais lata que outros. E adeptos de clubes indescritíveis. Uns palermas nessa matéria. Mas também são meus amigos. E há alguns que não percebem nada de carros e não gostam de velocidades. Outros ainda abanam a cabeça, mas não me dizem nada, quando compro um Alfa Romeo. Lá no fundo não percebem o que eu vejo naqueles carros. E porque vou a Le Mans todos os anos. Essa é a parte misteriosa de quem vive muito depressa. Também escrevo muito depressa. Felizmente que ainda tenho tempo para fumar um charuto. De vez em quando. Com os amigos. E alguns não fumam, embora fumem comigo. Com os olhos. E depois rimo-nos muito. De outras vezes fumo sozinho. Também penso neles. Sozinho. Às vezes choramos. Eles não. Eu choro. Porque também sinto a distância dos que estão longe. E dos que partiram. Hoje também me lembrei do M. que está no Porto. Ainda lhe devo uma resposta ao último email. Vai por aqui. Há pouco lembrei-me de todos eles quando comprei um quadro da minha sombra. Como a do Livro de Curso. Igual ao do Almada que estava na Gulbenkian. Com o Pessoa. Obra do Vítor Marreiros. Depois o Vítor telefonou-me, porque aquele quadro não era para vender. O fulano da galeria não sabia. O que levei tinha defeito. O Vítor disse que aquele não era para mim. Havia umas letras que estavam trocadas. O meu é outro. Está no atelier dele. Com as letras todas. Quando tiver o certificado para mim fazemos a troca. Ele fica com o das letras trocadas, eu fico com o dele que não estava na galeria. Não conheci nenhum amigo do Fernando Pessoa. Nem dos seus heterónimos. Eles é que me conheceram. Também são meus amigos. Quando os leio, às vezes mesmo quando vou pela rua, acho que eles me vêem. Aqui não é superstição. É crença. Os amigos vêem-me. Às vezes há uns que me dão uma sova quando lêem o que eu escrevo. Têm mais medo do que eu. Eu sei. Sou um irresponsável. Eu nunca tive medo. Mesmo quando estou sozinho tenho amigos que zelam por mim. E há umas que até rezam. A Mélita era uma delas. Deixou muita saudades. Eu também tenho muitas saudades. Dela e dos meus amigos. Quando não estou com eles. Vale-me uma amiga que está sempre por perto e que tem dias em que me azucrina a mioleira. Não presto atenção às coisas. E diz-me. Não a levo a mal. No fundo gosta de mim. É minha amiga. Depois queixa-se das suspensões dos carros. É a mais atrevida. Os outros não dizem nada. Os carros também não. No dia em que me for embora vou ter saudades dos meus amigos. Deles e da minha liberdade. Espero que eles não se chateiem. Ainda eram capazes de me ir buscar ao Guincho e acabava-se o meu sossego.    

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sondagens

por Sérgio de Almeida Correia, em 01.12.23

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Algumas pessoas ficaram admiradas com o resultado da sondagem da Universidade Católica/Público/RTP, dada a conhecer no passado dia 28 de Novembro. Ainda todos estão lembrados dos resultados de outras sondagens aquando das últimas legislativas e do que veio a acontecer. O país não quis saber de empates técnicos nem de vitórias tangenciais e resolveu entregar uma maioria absoluta a António Costa. Por essa razão convém moderar as análises e o ímpeto das conclusões.

Ainda assim, atrevo-me a dizer publicamente o que penso, arriscando a crucificação num pelourinho por delito de opinião.

E neste momento em que se discute a liderança do PS e todos os outros partidos se afadigam a prepararem-se para as eleições – alguns na mira de conseguirem adiar por mais algum tempo o seu próprio funeral – parece-me evidente que a golpada marcelista, amplamente favorecida pelo descalabro da governação (seria difícil encontrar outro termo para o desastre que foi, salvo raríssimas excepções, a performance do XXIII Governo Constitucional), poderá vir a revelar-se como uma bênção para a reforma do sistema político e eleitoral. De uma assentada, os portugueses podem abrir caminho para se livrarem de quase todos os pantomineiros que fazem hoje a maioria da classe política que nos trouxe até ao imbróglio em que estamos.

Dos diversos cenários apresentados pela sondagem acima referida, há algumas conclusões que são inequívocas: i) Os portugueses não gostam de radicais; ii) Qualquer que seja o cenário dispensam Luís Montenegro; iii) Pedro Nuno Santos (PNS) não lhes merece o aval da confiança.

Quanto à primeira não constitui novidade. O país reconhece-se ao centro na extensa faixa que vai da democracia-cristã/liberalismo/social-democracia até ao socialismo democrático mais ou menos esquerdista.

Depois, em relação ao líder do maior partido da oposição, o PSD, verifica-se que apesar de tudo o que aconteceu com o Governo e com o PS, Luís Montenegro não consegue melhor do que um resultado sofrível qualquer que seja o cenário.

Não é de estranhar. Chegou a líder por ser tão anódino quanto foi deputado ao longo dos anos, sem um lampejo que o resgatasse à mediocridade carreirista da JSD ou da seita aventaleira que o ajudou a crescer. E agora que se vai apresentar a eleições traz consigo, como se viu no congresso do passado fim-de-semana, um camião com um atrelado de sarcófagos de onde vão saindo umas múmias que não deixaram saudades. Que seja castigado e as sondagens não lhe sejam particularmente favoráveis depois de tantos anos de PS no Governo não é uma fatalidade.

Mas se o teste havia de chegar com as eleições europeias ou com as autárquicas, o Presidente Marcelo fez o favor às hostes laranja de anteciparem o futuro e se livrarem de Montenegro e da sua tralha bem mais cedo, pois que quanto mais depressa o PSD iniciar a sua renovação e posicionar uma nova geração de líderes, que seja recrutada noutro lado que não seja entre as levas de imperiais do Ribadouro, menos difícil será construir uma alternativa na área política do seu eleitorado, colocando um ponto final na balbúrdia venturista à sua direita.

Em terceiro lugar, há o problema PNS para resolver. Este é um problema interno do PS e que só terá solução, acreditemos que sim, se nos próximos dias 15 e 16 de Dezembro os militantes socialistas o resolverem.

Os resultados da sondagem explicam por que razão é que PNS não quer debates com os outros candidatos à liderança do partido. Não se trata, evidentemente, de evitar dar trunfos à direita, mas sim de evitar o debate político e fugir do confronto com as suas próprias contradições, com o cataventismo socratista e a vacuidade petulante e oportunista do discurso.

Em 2017 (não vale a pena recuar mais), PNS, que já era crescidinho, afirmou que "O PS nunca mais irá precisar da direita para governar". Em 2018 sublinhou que "o PS não está refém da direita para governar". Depois, quando anunciou a sua candidatura, começou por atacar o candidato José Luís Carneiro, acusando-o de não ser suficientemente combativo contra a direita e vincando que com ele "o PS não vai ser muleta de ninguém", esclarecendo que o seu foco e o da sua candidatura "é derrotar a direita e não mais do que isso", antes de entrar na contabilidade cacical de saber quem apoia quem.  Como se esta tivesse interesse para alguém com excepção dos bípedes que ficam com insónias ante a perspectiva de não saberem quem apoiar para manterem os tachos dentro do partido e fora dele.

Bastou passarem dois dias, depois de acusar JLC de desvio direitista, e logo começou, de mansinho, a chegar-se para o centro, não fosse o diabo tecê-las. Daí que tivesse saído a terreiro para dizer que "o diálogo à direita e ao centro é fundamental" e que "há matérias onde o entendimento com o PSD é desejável e importante" (quais?), ao mesmo tempo que dizia que "a memória da geringonça é boa". Ora bem. E ainda disse que até a uma coligação pré-eleitoral não fecha portas. Colocou a primeira cereja no topo do bolo da coerência, qual franciscano, com que pretende desfilar nos próximos dias. 

Em rigor, para PNS o que é preciso é estar em todas, com todos "e com todas" desde que isso lhe garanta o poder. E se possível também com "todes", que foi para isso que o talharam, no "berço de oiro", na humilde loja do sapateiro, e em especial no albergue onde lhe construíram as ambições conforme as ocasiões.

Percebe-se, ademais, qual o motivo para que directas abertas, como mostram as sondagens, também sejam dispensadas por PNS, pois que é muito melhor deixar a escolha do líder do PS nas mãos dos caciques que controlam as concelhias e o aparelho do que confiar na decisão dos simpatizantes que não têm tempo para a militância e dos quais dependem os resultados eleitorais do partido.

Como lá mais acima dizia, se os militantes socialistas quiserem dar um contributo ao país poderão começar por se livrarem de PNS, mandando-o tomar conta das empresas familiares, de maneira a que não mais tenha necessidade de esconder os carros quando for para a campanha eleitoral. Esta é uma oportunidade única e irrepetível. 

Seria uma pena se os portugueses, que de uma assentada se podem livrar do neo-socratismo e do basismo cavaquista e passista, encetando um caminho de renovação das suas elites políticas, não aproveitassem os ventos fortes que sopram de todos os quadrantes, e a chuvada que se prepara nos próximos dias, para lavarem o terreiro e removerem de lá toda a barracada de feira que se foi instalando, dispensando os vendedores de tapetes, ligaduras e sarcófagos, os milhares de arrumadores e de traficantes de influências, os penduras de ocasião, a malta das sementes dos vários tipos de relva, enfim, livrando-se de toda a tralha de gigantones, coristas e emplastros acumulada nos últimos carnavais. 

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kissinger

por Sérgio de Almeida Correia, em 30.11.23

statesman_2.png.bmp(créditos: daqui)

Nos bons e nos maus momentos esteve com todos e contra todos, com inteligência, ignorância e muito cinismo.

Uma vez convidaram-me para estar presente num dos seus doutoramentos honoris causa. Até hoje não estou certo se acreditava numa palavra do que pensava, do que dizia e do que escreveu.

Mas o seu legado é incontornável. Outros o julgarão. Não faltarão entendidos a dissertarem nos próximos dias, em todos os canais de rádio e de televisão, em tons laudatórios, sobre as suas múltiplas qualidades. Eu limito-me a certificar o óbito do século XX. E olhando à minha volta, para o que se passa no mundo, também não sei se isso será bom.

Ninguém tem o dom de adivinhar o futuro. Ele também não o teve, e por várias vezes tentou interromper o curso da história, treslendo e ignorando os sinais.

Apesar disso foi capaz de escrever muitos sumários. Alguns péssimos. Em Timor não deixará saudades. Outros, felizmente, como no caso português, não se concretizaram. Não ficámos entre Santiago e Havana. Voltámos a ser europeus. De corpo inteiro. E não lhe devemos isso.

Que descanse em paz.

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injustiças

por Sérgio de Almeida Correia, em 28.11.23

7d17a3ca32132ece9d22b9b5553eb1ac-temple-of-heaven-(créditos: Getty Images/Lonely Planet)

Certamente que não passaram despercebidos, até porque mereceram a devida atenção da comunicação social, e ainda merecem, tanto a decisão do Tribunal de Segunda Instância, quanto ao chamado caso das Obras Públicas, como o julgamento, ainda em curso, de um procurador-adjunto do Ministério Público.

Não me vou aqui pronunciar sobre nenhum dos casos, até porque o primeiro ainda não transitou em julgado e o segundo vai fazendo o seu caminho. Deixemos, pois, que prossigam sem sobressaltos enquanto não chega o trânsito em julgado de um e se espera que seja proferida decisão no outro.

Quero, porém, desde já sublinhar a disparidade de julgamentos e da forma de condução das audiências na primeira e na segunda instância. Em qualquer um dos casos há lições a tirar por quem selecciona, forma, fiscaliza e gere os senhores juízes. E também pela opinião pública que de fora assiste.

Se é verdade, e eu não duvido, que os tribunais superiores existem para rever, confirmar e corrigir as decisões dos tribunais inferiores, parece-me pouco razoável que haja uma divergência tão grande na apreciação dos factos e na aplicação do direito entre a primeira e a segunda instância. Em especial se os crimes mais graves pelos quais os arguidos foram acusados e condenados acabam por cair na segunda instância como caem as folhas das árvores no Outono, não havendo quem evite a sua acumulação no chão antes de serem varridas e restituídas ao lugar de onde saíram.

E se a queda desses crimes for acompanhada, em relação aos factos que o tribunal de recurso deu como provados, de uma redução substancial das penas aplicadas na primeira instância, já que é disso que se trata quando se reduzem penas a metade, um terço ou um quarto, quando não na totalidade, porque se entendeu que nem sequer houve crime, isso significa que há qualquer coisa que está mal. 

Depois, em relação ao julgamento em curso no TSI, também é curioso verificar a diferença de comportamentos e atitudes por parte de quem ali julga face ao que tem acontecido nos julgamentos realizados no TJB em matéria criminal.

Em relação ao julgamento que está a decorrer em primeira instância no TSI não se ouviram, até agora, de que eu tenha conhecimento ou que chegassem aos jornais, queixas de teor idêntico ou similar ao que se disse em relação ao julgamento das Obras Públicas e noutros anteriormente realizados também no TJB em primeira instância.

Fosse em relação ao número de advogados presentes e susceptibilidade de intervenção, fosse quanto à latitude de que gozam algumas testemunhas nos depoimentos que prestam.

E se num lado os advogados se queixavam, tendo havido mesmo quem lamentasse ter sido ameaçado de ficar sem a palavra ou de ser corrido, no outro lado parecem desempenhar o seu papel sem constrangimentos e dentro das regras que decorrem da lei. Ninguém deixa de fazer o que tem a fazer, ninguém se sente enxofrado, diminuído ou ofendido.

Fico satisfeito por saber que a realidade não pode ser vista a preto e branco, embora não veja qualquer vantagem quando em causa está a realização e a aplicação da Justiça. E, bem ao invés, vejo muito dano quando há diferenças tão gritantes entre as duas instâncias, não obstante a sua proximidade e ser a mesma a cor das becas.

Admito que há situações onde alguém veja azul escuro, e outros vislumbrem, e garantam ser, verde escuro. Há sempre gente teimosa, daltónica ou simplesmente obtusa. Mas é para mim de todo impensável que haja quem, de boa-fé, na apreciação dos factos e na aplicação da lei tome o vermelho vivo por branco imaculado ou bege.

É que quando isso acontece num sistema de justiça é difícil perceber que sistema é esse, e onde começa e acaba o princípio "um país, dois sistemas".

Sem um sistema de justiça fiável e confiável não há atracção para recrutar candidatos ao Prémio Nobel para irem morar para Hengqin,  investimento produtivo em dólares ou euros, ou qualquer estímulo à diversificação económica.

E com um sistema de justiça que é, por natureza e atavismo, moroso, burocratizado e caro, e que além do mais seja injusto e incapaz de incutir segurança e respeito, dentro e fora de casa, por muito patriótico que seja, só os jogadores estão dispostos a correr riscos.

E destes, estou certo, não será o Templo do Céu.

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fartura

por Sérgio de Almeida Correia, em 24.11.23

macau-traffic-black-cabs-taxi--696x487.png(créditos: Macau Business)

A muito custo, depois de múltiplas e permanentes críticas da população, com os taxistas a dizerem que era um exagero a atribuição de mais 500 licenças, apesar do número total de táxis ter sido reduzido nos últimos anos em cerca de 300 viaturas, e da Direcção dos Serviços para os Assuntos de Tráfego (DSAT) inicialmente anunciar apenas concurso para atribuição de 300 licenças, lá se abriu, finalmente, concurso para colocar na estrada mais 500 táxis.

Os primeiros dados revelados pela apresentação das propostas indicam que se apresentaram cerca de 40 (quarenta) candidatos desejosos de largarem, cada um deles, MOP$2.500.000 (dois milhões e quinhentas mil patacas) e entrarem num mercado que em breve será "caótico", de acordo com as previsões de um dirigente associativo.

Com o tempo que levou a abertura deste concurso, mais a miserável argumentação qe venderam aos residentes para o protelarem ao longo dos anos e a dificuldade que foi elevar o número de 300 para 500, a primeira conclusão que podemos tirar é que na DSAT, como em muitos outros serviços públicos da RAEM, não se tem um conhecimento mínimo da realidade. Ou tem-se e faz-se de conta que a realidade é outra para não se estragar o negócio aos que estão no mercado.

O número de concorrentes indicia, pelo menos, que o concurso deveria ter sido aberto para ser outorgado o dobro das licenças e que a DSAT não tem dados credíveis sobre o que se passa na sua área de actuação. Nada que fuja ao habitual.

Este elevado número de candidatos constitui mais uma prova de que o mercado dos táxis não estava saturado, ao invés do que apregoaram durante anos, e que há gente disposta a investir no negócio dos táxis, se os deixarem e não inventarem obstáculos, apesar do cenário calamitoso oferecido pelas associações e dos receios dos responsáveis.

Claro que na RAEM, tal como com o Ministério Público em Portugal, ninguém se sente responsável por coisa alguma, seja pela má gestão dos processos, seja pelos danos causados à comunidade em razão do irrealismo, da negligência grosseira, da protecção dada aos lobbies e clientelas ou do simples desinteresse pela salvaguarda do interesse público.

É a estas coisas, mas também aos preços nos mercados e supermercados, à qualidade dos transportes públicos, do ar e das águas – cada vez mais sofríveis –, e atentos ao que se faz em matéria de obras públicas, e não ao espiolhanço do se publica ou não se publica nos jornais, à crítica do que surge desalinhado ou aos disparates que saem nas redes sociais, que os representantes de Pequim deviam prestar atenção e dar o seu recado atempado às autoridades locais, censurando-os publicamente quando têm de ser censurados para que a população perceba que não estão cá só para cortar fitas ou frequentar vernissages.

Porque só assim poderão ajudar a corrigir os desequilíbrios da terra e a melhorar a qualidade de vida dos residentes, aproximando o serviço de táxis de Macau, e todos os outros que precisam de reforma, daqueles que são oferecidos em muitas metrópoles do interior do país.

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